por Daniel Fassa
Fotos por Francisco Emolo


arte sobre foto de Cecília Bastos


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Manoel Balbino: “Quando se fala a palavra amor, o pessoal entende de uma forma muito pejorativa. Entendimento, compreensão, ajuda, tolerância, isso para nós é amor. É esse tipo de amor que a gente tenta passar para as crianças que chegam aqui”


Quando os abrigos se tornam o lar de muitas crianças

O afastamento da família é sempre uma situação muito difícil para qualquer criança. Por isso, antes de tomar uma medida tão drástica, a Vara da Infância e da Juventude faz todo um estudo para verificar se os direitos básicos do menor estão mesmo sendo negligenciados. Em caso afirmativo, os psicólogos e assistentes sociais da Justiça desenvolvem um trabalho de reabilitação familiar, permitindo que os pais mudem de vida e se coloquem em condições de educar seus filhos. Se necessário, durante esse processo, as crianças são afastadas temporariamente. A prioridade é que elas voltem às famílias de origem. Mas nem sempre isso acontece.

A fim de dar um verdadeiro lar a crianças nessa situação, Manoel e Jandira Balbino, funcionários aposentados do Instituto de Geociências e da Faculdade de Saúde Pública, respectivamente, criaram, há 12 anos, o Lar Fraternidade Casa de Emmanuel, em Caucaia do Alto, Cotia-SP. Desde 1995, 540 crianças já passaram pelo abrigo. Em todo o período, apenas seis foram adotadas. Algumas retornaram às suas famílias. Outras atingiram a maioridade dentro do Lar.

Segundo Manoel Balbino, o trabalho faz parte de sua missão, que começou muitos anos antes, na década de 60, quando ainda namorava sua esposa Jandira. Enquanto participavam de um culto espírita, os dois descobriram que teriam uma grande tarefa pela frente. De lá para cá, o casal já atuou no Departamento de Assistência Social da Federação Espírita do Estado de São Paulo, trabalhou junto à Prefeitura da cidade na retirada de crianças de rua, teve cinco filhos biológicos e adotou mais dois. Mas isso era apenas o começo.


 

 


“O ser humano merece tudo, toda atenção. É muito gratificante. Vale a pena investir no ser humano”, Jandira Simphronio Balbino

 

 


Atualmente, o Lar Fraternidade Casa de Emmanuel acolhe 38 crianças e adolescentes


Em 1990, iniciaram a construção do Lar Fraternidade Casa de Emmanuel em uma área de 36 mil metros na zona rural de Cotia, doada por um empresário. "O espaço era bom, a redondeza, a área verde, tudo, melhor impossível. Fiz uma pesquisa de escolas, posto de saúde, vi que dava para suprir as necessidades. Viemos para cá sem dinheiro, sem nada, pá e picareta, e começamos", relembra Balbino.

Com a ajuda de pessoas, empresas e do Centro Espírita fundado por Balbino, o espaço está em permanente reconstrução e já conta com refeitório, sala de TV, biblioteca, sala de estudos, quadra poliesportiva, salão de jogos, parquinho, sala de musicoterapia, entre outras coisas. As 38 crianças que lá vivem atualmente têm entre 6 e 18 anos e são acompanhadas por professora, assistente social e psicóloga, além de receberam formação moral e espiritual. "Quando se fala a palavra amor, o pessoal entende de uma forma muito pejorativa. Entendimento, compreensão, ajuda, tolerância, isso para nós é amor. É esse tipo de amor que a gente tenta passar para as crianças que chegam aqui", revela Balbino.

Mas não foi sem dificuldades e sacrifícios que o casal desenvolveu tamanha tarefa. "A gente trabalhou muito, de querer voltar para casa e não poder, porque a criança você não pendura no cabide. Muitas vezes, servi comidinha ali no balcão com a lágrima caindo dentro do prato. Chegou uma hora, que eu já não sabia o que era melhor para mim, se era quando estava indo ver minha casa, ou se era quando estava saindo da minha casa para vir para cá", conta Dona Jandira. "O ser humano merece tudo, toda atenção. É muito gratificante. Vale a pena investir no ser humano", completa.

Janaína de Oliveira tem 16 anos, mora no abrigo há 4 anos e não tem perspectiva de voltar para a família. Ela conta que gosta de viver no Lar Emmanuel: “O que eu mais gosto é entrar na cozinha para ajudar as tias. Sei fazer de tudo um pouco, pão, bolo. Final de semana, fico lendo e estudando”. Seu irmão, Érico, vive com ela. “Aqui eu já tenho mais liberdade, já aprendi mais coisas. Aprendi a fazer massa, estou ajudando a construir o muro. O que eu mais gosto é de jogar bola”, revela o garoto de 14 anos.

 
 
 
 
 
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