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O desenvolvimento da pesquisa no Estado se deve em boa parte à Fapesp
Perez: mudança de paradigmas
Carvalho: é preciso manter repasses

   





U
m programa para explorar o potencial da flora e da fauna de São Paulo – em boa parte já catalogadas pelos cientistas paulistas – na indústria farmacêutica e de cosméticos. É com essa iniciativa que a Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo) pretende marcar o seu 40º aniversário, completados no dia 23 de maio e comemorados oficialmente no sábado passado, dia 8 de junho, com um concerto na Sala São Paulo, que apresentou as Bachianas de Heitor Villa-Lobos. Ainda em fase de elaboração, o “projeto de bioprospecção” está ligado ao Biota-Fapesp – programa hoje em andamento que tem o objetivo de inventariar e caracterizar a biodiversidade paulista – e poderá estar definido até o final do ano, segundo o diretor científico da Fapesp, professor José Fernando Perez. “As espécies da fauna e da flora com potencial econômico identificado pelo Biota serão o alvo desse nosso programa, se tudo correr bem”, explica Perez, que evita dar mais detalhes sobre o assunto. “Estamos ainda numa fase inicial.”
Mas o programa que vai explorar a biodiversidade paulista não é a única novidade com que a Fapesp comemora 40 anos de existência. Atualmente, uma comissão coordenadora analisa 123 pré-propostas enviadas para o Tidia (Tecnologia da Informação no Desenvolvimento da Internet Avançada), um programa lançado no final do ano passado que deverá trazer benefícios sem precedentes nas áreas de tecnologia da informação, telecomunicações e redes de computadores associadas com a Internet avançada. “Esse programa deverá mobilizar o ambiente acadêmico, empresas e governo em projetos cooperativos visando à formação de recursos humanos em grande escala e o avanço da pesquisa científica e tecnológica nesse setor estratégico para a economia, para a ciência e para a sociedade como um todo”, afirma o texto de apresentação do programa publicado na página da Fapesp na Internet (www.fapesp.br). “O programa deverá incentivar o uso e o desenvolvimento de novas tecnologias tanto nas áreas de hardware como nas de software e de redes. Se bem sucedido, deverá estar na origem de alguns processos de crescimento exponencial, tão típicos da Internet porém ainda bastante raros entre nós” (leia no texto abaixo mais informações sobre os projetos especiais da Fapesp).

Estrutura Enxuta

O sucesso alcançado pela Fapesp, aos 40 anos, é atribuído por Perez em boa medida à estrutura da fundação, que permite uma infra-estrutura administrativa enxuta e a agilidade na concessão dos benefícios. Essa estrutura inclui as chamadas comissões de coordenação, formadas por cientistas e incumbidas de coordenar a avaliação e a aprovação de projetos a ser financiados. Tais comissões recebem as solicitações e as enviam aos mais de 6 mil assessores da fundação, a maior parte deles formada por pesquisadores em atividade no Estado de São Paulo. Não-remunerados, esses assessores enviam de volta seus pareceres, que vão fundamentar a decisão da Fapesp sobre a liberação de recursos. “Esse sistema de avaliação pelos cientistas confere muita credibilidade e qualidade ao processo de análise dos projetos”, destaca Perez, que responde pela diretoria científica da fundação desde 1993. “Sem dúvida, é um dos fatores do prestígio que a Fapesp possui perante a comunidade científica.” Atualmente, apenas 5% do orçamento da Fapesp é destinado a despesas com administração. Os outros 95% servem para manter as atividades-fim da instituição – financiar a ciência e tecnologia no Estado.
Para Perez, a Fapesp – “resultado de uma idéia ousada do Estado”, segundo o diretor científico – instituiu “novos paradigmas” na pesquisa científica brasileira ao criar, ao longo dos últimos dez anos, projetos que promovem a cooperação entre os pesquisadores, a formação de recursos humanos altamente qualificados e a transferência de tecnologias para a sociedade. Como exemplo, Perez cita o Programa Genoma-Fapesp, que inclui uma série de iniciativas ligadas à bioengenharia, como o mapeamento da Xylella fastidiosa, bactéria causadora da praga do amarelinho – o grande feito da ciência brasileira moderna. O programa também foi responsável pelo seqüenciamento de outras duas bactérias ligadas a pragas na agricultura – a Xanthomonas citri, que causa o cancro cítrico, e a Xanthomonas campestri, que destrói as culturas de repolho, brócolis e outros vegetais.
Outros projetos especiais da Fapesp são o Parceria para Inovação Tecnológica (Pite) e o Programa Inovação Tecnológica em Pequenas Empresas (Pipe), que transferiram tecnologia e conhecimentos para o parque industrial paulista de uma forma sem precedentes. Os programas Pesquisas em Políticas Públicas e Melhoria do Ensino Público representam ações efetivas da comunidade científica paulista em favor da sociedade, acrescenta Perez. Já o Programa de Apoio a Jovens Pesquisadores tem o duplo mérito de evitar a evasão de cérebros do País e contribuir para o desenvolvimento de novos núcleos de pesquisa em centros emergentes. “Programas como esses mudaram a maneira de fazer pesquisa e deram ótimos
resultados”, comemora Perez, ressaltando que essas iniciativas não prejudicam a concessão das tradicionais bolsas e auxílios e nem o financiamento da pesquisa básica. Para o diretor científico, o sucesso da Fapesp contribui para eliminar no Brasil o que chama de “síndrome da baixa estima”. “Essa idéia de que aqui não é possível realizar as coisas, de que não dá certo, está sendo destruída pela Fapesp”, diz. “Nós acreditamos no potencial da ciência paulista e por isso estamos obtendo grandes resultados.”

Emenda Lessa

Uma das vozes mais experientes do sistema de financiamento da ciência no Brasil, o professor Alberto Carvalho da Silva – ex-conselheiro e ex-diretor científico da Fapesp – considera que a fundação tem hoje o “grande desafio” de assegurar que o governo estadual repasse regularmente os recursos orçamentários previstos pela legislação – equivalentes a 1% da arrecadação do Estado, com base no mês anterior. Carvalho lembra que, antes da Emenda Constitucional número 39 – conhecida como Emenda Lessa, que em 1984 mudou as regras orçamentárias da fundação –, os recursos destinados à Fapesp correspondiam a 0,25% da arrecadação sobre o ano vencido. Com isso, as verbas eram repassadas corroídas pela inflação. Com a nova lei, o índice de transferência duplicou o orçamento da Fapesp, além de ser calculado com base no ano em curso. “Isso permitiu o aumento de bolsas e de auxílios concedidos e a criação de alguns projetos importantes, como a rede Ansp”, lembra o professor, referindo-se à Academic Network at São Paulo, uma rede que interliga e facilita a comunicação via Internet entre os pesquisadores.
O professor se diz otimista quanto ao desafio de assegurar os atuais repasses de verbas, tendo em vista o prestígio que a Fapesp adquiriu não só no Brasil, mas também no exterior. Para ele, o desenvolvimento da ciência e da tecnologia e a formação de recursos humanos no Estado de São Paulo, nos últimos 40 anos, devem “muito” à fundação. Uma demonstração desse prestígio o professor teve em 1990, quando fez uma visita à National Science Foundation (NSF), a poderosa agência de financiamento à pesquisa dos Estados Unidos. Humilde, Carvalho disse aos diretores da NSF que gostaria de conhecer o trabalho daquela instituição para adquirir novos conhecimentos e, se possível, aplicá-los em benefício da ciência paulista. Para sua surpresa, ouviu dos cientistas norte-americanos: “O senhor não tem nada a aprender aqui. Nós é que precisamos aprender com a Fapesp”.


Do genoma ao ensino público

A seguir, alguns dos projetos especiais atualmente desenvolvidos pela Fapesp. Mais detalhes podem ser obtidos na página da fundação na Internet (www.fapesp.br).

Programa Genoma-Fapesp – Reúne os vários projetos de apoio a pesquisas na área da bioengenharia, como o Genoma-Xylella, que mapeou o genoma da bactéria causadora da praga do amarelinho, o Genoma-Cana, que investiga o DNA da cana-de-açúcar, e o Genoma Humano do Câncer, que busca mapear os genes ligados à ocorrência de cânceres freqüentes no Brasil.

Tecnologia da Informação no Desenvolvimento da Internet Avançada (Tidia) – Recém-criado, vai buscar o aperfeiçoamento dos sistemas de informação.
Consórcios setoriais para a inovação tecnológica (Consitec) – Estimula a colaboração de grupos de pesquisa com aglomerados de empresas, a fim de estudar assuntos relevantes e resolver problemas tecnológicos de interesse comum.

Biota – Instituto Virtual da Biodiversidade – Busca inventariar e caracterizar a biodiversidade do Estado de São Paulo, definindo os mecanismos para sua conservação, seu potencial econômico e sua utilização sustentável.

Pesquisas em Políticas Públicas
– Estimula pesquisas que possam ser aplicadas para a melhoria dos serviços públicos.
Apoio a Jovens Pesquisadores – Iniciado em 1995, apóia recém-doutores para incentivar sua permanência no Estado (evitando assim a evasão de cérebros para o exterior) e, ao mesmo tempo, contribuir para a formação de novos núcleos de pesquisa em centros emergentes.

Capacitação Técnica
– Iniciado em 1996, tem por objetivo o treinamento e o aperfeiçoamento de técnicos de níveis médio e superior para atividades de apoio a pesquisas financiadas pela Fapesp.

Centros de Pesquisa, Inovação e Difusão (Cepids)
– Dez centros de excelência espalhados pelo Estado, que têm a missão de fazer pesquisa de ponta e divulgar novos conhecimentos para a sociedade.

Melhoria do Ensino Público
– Iniciado em 1996, financia pesquisas para a melhoria do ensino de primeiro e segundo graus na rede pública do Estado.

Infra-Estrutura de Pesquisa
– Criado em 1994, visa à recuperação e modernização da infra-estrutura das instituições de pesquisa do Estado de São Paulo.

Programa Biblioteca Eletrônica (Probe)
– Uma biblioteca virtual de textos completos de artigos de periódicos científicos internacionais, com vistas a contribuir para o desenvolvimento da pesquisa.

Academic Network at São Paulo
– Iniciada em 1988, a Rede Ansp é hoje um importante suporte para o funcionamento da Internet no Brasil.

 




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