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Mal havia começado a segunda metade do século 20. Na antiga sede do Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM), um bar servia de ponto de encontro para os artistas de então discutirem os rumos da pintura. Inconformados com os inférteis debates entre figurativismo e abstracionismo, sete deles resolveram preparar uma exposição para quebrar esses conceitos — consideravam-nos hedonistas, produtos do gosto gratuito. Era a Ruptura, marco inicial da arte concreta no Brasil. Nas palavras de Waldemar Cordeiro, um dos participantes, era um movimento que reivindicava a “linguagem real das artes plásticas, que se exprime com linhas e cores, que são linhas e cores e não desejam ser pêras, nem homens”.
Era 1952. Apenas três anos mais velho, o Centro Universitário Maria Antonia (Ceuma) dá início nesta quinta-feira a uma das maiores exposições de sua história, em homenagem ao cinqüentenário do evento. O projeto, batizado Arte Concreta Paulista, abrangerá quatro vertentes do movimento: o grupo Ruptura, a obra de Antônio Maluf, a revista Noigandres e a relação de Waldemar Cordeiro com a fotografia. As duas primeiras ficam expostas até 21 de julho, sendo substituídas pelas duas últimas de 1º de agosto a 8 de setembro. Durante todo o período, ficarão expostos quatro poemas de Augusto de Campos (dois inéditos) dedicados aos pioneiros do Ruptura.
A idéia do projeto surgiu no fim do ano passado, em uma reunião entre o atual diretor do Ceuma, Lorenzo Mammì, e os professores da USP Tadeu Chiarelli e Helouise Costa, entre outros. “Decidimos fazer um grande projeto sobre a arte dos anos 50, já que ela costuma ser uma ‘virada’ menos lembrada que as de 22 e da década de 60", diz Mammì. “Mesmo assim, foi algo que influenciou todas as áreas, desde a pintura até a poesia, a escultura e o design.” Criou-se então um projeto cultural que foi aprovado pela Petrobras, recebendo patrocínio integral.
Cada exposição teve o seu próprio curador. “Ruptura: Revisando a Exposição Inaugural”, por exemplo, ficou a cargo de Rejane Lassandro Cintrão. Atualmente no MAM, a curadora afirma que o espaço do Ceuma tem muitas semelhanças com o original. Porém, não há como recriar exatamente a primeira Ruptura, já que não existem nem registros do que cada artista estava expondo. “Pela aproximação formal das obras e algumas fotos, acredito termos chegado numa relação bastante próxima”, acredita Rejane, que se refere a sete obras de Waldemar Cordeiro, cinco de Geraldo de Barros, seis de Luís Sacilotto, três de Anatol Wladislaw, três de Lothar Charoux, quatro esculturas de Kazmer Féjer e duas reproduções fotográficas das maquetes de Leopoldo Haar. “No caso de Féjer e Haar, os originais se perderam, e tivemos que optar por outras obras ou reproduções, respectivamente. Acho que nem os próprios artistas tinham noção da importância de suas obras”, diz a curadora.
Já “Antônio Maluf: Obras Gráficas”, com curadoria de Regina Teixeira de Barros, está mais para evento histórico do que restauração histórica, pois é a primeira retrospectiva do artista desde sua última e única exposição individual, em 1968. Ao todo, são quase 40 peças entre pinturas, cartazes, estampas, murais e encadernações. “Apesar de ser ainda hoje mais conhecido como artista gráfico do que como um pintor propriamente dito, Maluf não se considera como tal”, diz Regina, que conversou diversas vezes com o artista para se embrenhar em sua obra. “Ele acha que seus trabalhos em ‘arte aplicada’ são apenas uma conseqüência da pesquisa artística em suas obras ‘sérias’.” A curadora, porém, não diminui a importância da produção paralela. “O Antônio Maluf nunca pertenceu grupos como o Ruptura, pois tinha um conceito muito rígido do que era concretismo, e os achava muito permissivos nesse sentido. Com as estampas industrializadas que criou, porém, conseguiu que sua arte tivesse uma penetração altíssima, a preços populares, em panos, pratos etc. De certa forma, é o princípio da arte aplicada à vida, da escola de Bauhaus, que tanto influiu nos concretistas brasileiros.”
Sobre o impacto que a exposição pode causar no público de hoje, a curadora de “Ruptura...”, Rejane Lassandro, é categórica: “Claro que o efeito vai ser diferente. A geração atual em grande parte já assimilou as inovações abstratas, mesmo sem saber ao certo de onde vieram”. O diretor do Ceuma, Lorenzo Mammì, acredita por sua vez que “este é um bom momento para repensarmos sobre o concretismo, já que o conceito de arte como intervenção urbana, como se pôde ver na última Bienal e em projetos como o Artecidadezonaleste, está voltando à baila”.

Arte Concreta Paulista fica em cartaz até 8 de setembro no Ceuma (r. Maria Antonia, 294, tel. 3255-5538). No dia 20, haverá uma palestra com Antônio Maluf, e no dia 24, uma sobre o grupo Ruptura. Entrada franca.

 


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