A última semana começou tensa para
a Universidade, com perspectivas um tanto sombrias traduzidas
em ameaça de greve geral, manifestações de estudantes
contra o reitor Adolpho José Melfi, a permanência da
paralisação das atividades na Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas (FFLCH) e passeata de funcionários
até a Assembléia Legislativa , e terminou com
o céu mais desanuviado. Nada, porém, que permita o relaxamento.
Se na segunda-feira, dia 10, a possibilidade de uma greve geral de
funcionários e professores das três universidades públicas
paulistas USP, Unicamp e Unesp surgia como uma chance
concreta, já no dia 12 a idéia parecia estar descartada
pelo Fórum das Seis, a entidade que congrega associações
de professores e sindicatos de funcionários das três
universidades do Estado. O fórum, em reunião realizada
na quarta-feira passada, reconheceu, em documento conjunto, que a
proposta de uma greve unificada, neste momento, não se concretizou,
dada a baixa adesão às paralisações durante
a campanha salarial 2002. Entre outras reivindicações,
o Fórum das Seis desejava uma reposição salarial
de 16%, enquanto o Conselho de Reitores (Cruesp) não abria
mão de oferecer 8% de reajuste valor que acabou sendo
implementado pelas universidades e que foi inicialmente reconhecido
pela Adusp como uma vitória. Diante do resultado
da reunião do Fórum, o diretor do Sintusp (Sindicato
dos Trabalhadores da USP), Magno de Carvalho, declarou que possivelmente
a entidade irá defender a volta ao trabalho a partir
desta segunda-feira (17), mas o tema deverá passar primeiro
por avaliações nas unidades. A nova Assembléia-Geral
dos funcionários aconteceria na sexta-feira (14), após
o fechamento desta edição.
Para se ter uma idéia da pouca adesão ao movimento,
apenas os campi da Unesp em Marília, Assis e Bauru entraram
em greve conjunta de docentes, técnicos administrativos e alunos.
Nos demais campi e nas outras duas universidades públicas paulistas
houve somente focos de manifestação, como
assinalou o documento do Fórum das Seis. Na USP, por exemplo,
estavam paralisados os trabalhos apenas na Escola de Comunicações
e Artes (ECA), no Museu de Arqueologia e Etnologia (MAE), na Prefeitura,
no Fundusp e na Coordenadoria de Assistência Social, a Coseas,
além da FFLCH.
Mas este último caso é uma questão à parte,
já que a faculdade está paralisada desde 2 de maio devido
à reivindicação inicial dos alunos de Letras
por mais professores. Agora, são todos os 13 mil alunos da
FFLCH que reclamam da falta de docentes. Só que, às
vezes, perdem o senso de como fazer suas reclamações
e acabam tomando atitudes intempestivas. Como invadir o anfiteatro
da FEA durante o seminário de Cultura e Extensão ou,
mais sério ainda, apedrejar o carro oficial no qual estava
o reitor Melfi. Foram justamente situações como essas
que fizeram o reitor convocar uma entrevista coletiva no final da
tarde da última quarta-feira para esclarecer uma série
de pontos envolvendo todos os acontecimentos da semana.
Não há descaso da Reitoria para com a FFLCH. Os
claros estão sendo dados. Mas falta seriedade nas solicitações
da faculdade, já que ela pede 115 professores e os alunos falam
em 259. A discrepância é muito grande, disse Melfi.
Nos últimos cinco anos, foram contratados 541 docentes
pela USP. Desses, 20% foram para a FFLCH. Agora, como é feito
o preenchimento de vagas, se de forma eficiente ou não, não
sabemos." Mas, para o reitor, há outros problemas envolvendo
a faculdade, como a falha no preenchimento da carga didática
dos professores e o excesso de alunos nos chamados ciclos básicos.
Se há professores que não estão com a carga
didática completa, por que não dão duas aulas
ao invés de dar uma só?, questiona o reitor para,
mais adiante, comentar a respeito dos ciclos básicos, aprovados
na Letras há três anos. O resultado disso são
salas superlotadas de calouros e poucos professores. Era preciso
ter havido uma discussão mais aprofundada sobre esse tema,
prevendo quantas contratações seriam necessárias.
Mas queremos resolver o problema da FFLCH, que é uma unidade
importante, qualitativa e quantitativamente. Não queremos que
os alunos percam o semestre. Há possibilidade de as aulas serem
repostas nas férias.
Atores
políticos
Se
o problema da FFLCH ainda não está harmonizado
nesta quarta-feira, dia 19, haverá um ato em defesa da faculdade
no Anfiteatro Camargo Guarnieri, organizado pela Adusp, com a participação
de oradores como Antonio Candido, Aziz AbSáber e Marilena
Chauí , a possibilidade de greve geral está
cada vez mais distante. Mesmo com as entidades de professores e
funcionários ainda insatisfeitas com o resultado das negociações.
A Adusp não aceita a proposta de manter o reajuste
de 8%. Entretanto, dada a grave situação das estaduais
paulistas e do Centro Paula Souza, o Fórum concorda em que
a próxima reunião com o Cruesp discuta políticas
de reposição de docentes e funcionários nas
três universidades e a questão salarial do Centro Paula
Souza, afirmou o professor Otaviano Heleni, coordenador-substituto
do Fórum das Seis. Segundo Heleni, esses pontos foram
propostos pelo próprio Cruesp para continuar a discussão
da pauta de reivindicações. Na última
reunião com o Fórum, o Cruesp propôs manter
o reajuste de 8% válido a partir de 1º de maio, antecipar
de novembro para outubro a revisão salarial e realizar reuniões
mensais com o Fórum para acompanhamento da evolução
da arrecadação do ICMS (Imposto sobre Circulação
de Mercadorias e Serviços).
A questão salarial pode ser importante, sim, mas há
outros pontos que estão sendo trabalhados. Como a representação
discente nas reuniões entre o Cruesp e o Fórum das
Seis, um anseio antigo dos estudantes e que agora foi atendido.
Desde a criação do Cruesp e do Fórum,
esta é a primeira vez que os estudantes são tratados
como atores políticos, afirma Samantha Neves, diretora
do DCE da USP.
Se os ânimos estudantis com relação à
FFLCH por vezes ficam bem alterados, com relação à
possibilidade de greve eles se mantêm na ponderação.
Tanto é assim que em assembléia na última terça-feira
os cerca de 200 estudantes presentes preferiram não votar
a favor da paralisação. Não detectamos
condições concretas para adesão à greve
nesse momento, diz Samantha.
Uma
emenda que não anda
Se
a Reitoria, professores, funcionários e alunos da
FFLCH e de toda a Universidade ficam em lados opostos em
determinadas questões, em um ponto todos estão de
acordo: o Projeto de Emenda Constitucional (PEC) que coloca na Constituição
Estadual o repasse de 9,57% para as universidades públicas
paulistas deve ser votado logo. Na verdade, já deveria ter
sido votado pelos deputados e isso só não aconteceu
ainda por uma certa falta de sintonia entre os políticos.
E cada lado interessado no tema faz o que pode e como sabe
fazer. No último dia 13, por exemplo, cerca de 200 funcionários
das universidades estaduais foram em passeata da reitoria da Unesp,
na Alameda Santos, até a Assembléia Legislativa, no
Ibirapuera, para pressionar os deputados a votarem logo
a PEC. Encontraram-se com o deputado César Calegari (PSB),
que se solidarizou com o movimento, e ouviram dele que haverá
um encontro nesta quarta-feira, dia 18, entre os três reitores
e deputados ligados à questão da educação
para tratar do aumento de recursos para a expansão das universidades
públicas.
Dois dias antes da passeata de funcionários, os reitores
da USP, Unicamp e Unesp já haviam se encontrado com o presidente
da Assembléia, Walter Feldman, para tratar da votação
da PEC. Na coletiva que deu na quarta-feira, Melfi também
falou a esse respeito. Segundo ele, uma das propostas era tornar
o repasse matéria de lei complementar, e não constitucional.
Mas a idéia não foi bem aceita. Para as universidades,
a lei complementar é pior do que a lei constitucional, mas
melhor do que a lei ordinária. A complementar exige um número
maior de votos para ser mudada do que a lei ordinária. Mas
é claro que os reitores gostariam de ver o repasse previsto
na Constituição, disse o reitor. As conversações
continuam. Esperamos entrar em um acordo e fazer a matéria
entrar em votação.
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