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A pobreza e a exclusão social ganharam foco na temática internacional especialmente a partir de 2000. Em fase de campanha eleitoral, como a vivida atualmente no Brasil, o tema é vedete de comícios e propagandas políticas. Para fomentar esse debate, pesquisadores e especialistas com diferentes formações no campo da política e macroeconomia se reúnem nesta quarta e quinta-feira, 14 e 15 de agosto, no auditório do USPOficina, durante o "Seminário
Internacional: Tendências e Desafios da Política Social na América Latina".
Nos dois dias do encontro, os palestrantes irão além da análise dos efeitos dos programas de liberalização da economia implantados na América Latina a partir de 1990. Com o olhar voltado para o futuro, os cientistas apontarão desafios que os governos regionais enfrentarão diante do novo desenho da política social criada a partir da modernização econômica.
Durante o seminário será lançado o livro Los Desafios de la Política Social en America Latina, fruto do simpósio "Sociedade, Estado e Políticas Públicas" apresentado em Moscou no ano passado por uma equipe de pesquisadores do Prolam/USP (Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina).
"De 2001 para cá, a crise econômica, social e política na América do Sul se aprofundou e, tendo em vista este cenário, decidimos agregar um conjunto de pesquisadores que refletissem a respeito da constituição do livro e simultaneamente transpusessem as preocupações do livro para o momento presente. Nesse sentido, o seminário é uma reflexão da problemática atual da América Latina", diz a professora Maria
Cristina Cacciamali, coordenadora do encontro.
Para Maria Cristina, o seminário será uma oportunidade de expor o resultado de cerca de cinco anos de pesquisas desenvolvidas no Prolam na área de políticas públicas. Trata-se de um painel abrangente envolvendo temas como desemprego, novas relações de trabalho, o
novo papel do Estado na sociedade, a formação de poderes locais, relações internacionais e direitos humanos. (leia o programa nesta página)
O evento é promovido em conjunto pelo Prolam, pela Associação Brasileira de Estudos do Trabalho (Abet) e pelo Programa de Estudos de Pós-Graduação em Economia Política da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC/SP).

Neoliberalismo é resposta simplista para problemas


É fato que pobreza e dificuldade generalizada nas economias da América Latina dominam as discussões atuais sobre os países do bloco. Mas só o termo neoliberalismo não é suficiente para definir a situação latino-americana, na opinião do professor Cláudio Dedecca, coordenador do Centro de Estudos Sindicais e de Economia do Trabalho (Cesit), do Instituto de Economia da Unicamp.
Dedecca, que coordena no dia 14 uma mesa redonda sobre o tema "Restrições Macroeconômicas para o Desenvolvimento Econômico Latino-americano", afirma não ser "muito afeito a discutir os males da política neoliberal, pois a atual crise latino-americana não se reduz a isso". Para ele, poucas pessoas têm clareza do que seja neoliberalismo e fazer análises sob essa ótica é simplificar os problemas.
No entanto, Dedecca não nega que o atual cenário na Argentina -país que foi considerado "primeiro aluno" por analistas financeiros internacionais na década de 90 por seguir à risca a cartilha do Fundo Monetário Internacional (FMI)- é o fruto exemplar extraído da política de abertura. "A reversão não será fácil na Argentina, onde o reordenamento da economia foi violento e abraçou setores importantes. No Brasil, a abertura econômica foi um processo mais lento e limitado. Nosso parque industrial não foi totalmente destruído como ocorreu lá. Assim, ainda é possível manejar a crise brasileira."
Segundo o professor Dedecca, a abertura das economias latino-americanas não gerou nenhuma modernização e competitividade internacional, argumento usado como base de sustentação para implantar os programas de liberalização. "Quando Collor (Fernando, ex-presidente da República) implantou as medidas de abertura, dizia que deixaríamos de fabricar 'carroças' para fabricar 'último tipo'. O único carro nacional que deixamos de fabricar foi o Fusca, ou seja, continuamos a fabricar carroças com a diferença que importamos 'ultimo tipo'. Não houve qualquer modernização para competirmos internacionalmente", afirma Dedecca.
Para o professor, não só a década de 80 foi perdida, como também a de 90, do ponto de vista do crescimento. Daí o discurso comum nos debates eleitorais estar centrado na retomada da produção interna voltada para mercados locais, com maior controle das exportações .
Do ponto de vista da produção, o Brasil precisa voltar a ser parecido ao que era na década de 90, na opinião de Dedecca. A reinternalização de parte do consumo de insumos permitirá reduzir despesas externas e fortalecer o emprego local.
A crise do dólar vem reforçar essa análise, diz o professor da Unicamp. "Com a atual crise no câmbio, algumas empresas internacionais já sinalizaram a intenção de retomar a produção do que atualmente é importado. Os candidatos dessa eleição farão políticas explícitas nessa direção e a própria crise já leva a maior parte das indústrias a buscar este caminho."


As dimensões atuais da exclusão social e da pobreza

GILBERTO DUPAS


As profundas alterações na lógica da produção operadas pelo capitalismo global, nos últimos 20 anos, modificaram valores e padrões há muito sedimentados, estando aí uma das principais raízes do sentimento de insegurança que se generaliza e que está fortemente ligado às mudanças acarretadas no mercado de trabalho.
A percepção de aumento da exclusão social significa a concretização da ameaça de contínua marginalização de grupos até recentemente integrados ao padrão de desenvolvimento. Para complicar ainda mais esse quadro, a revolução nas tecnologias de informação e comunicação eleva incessantemente as aspirações de consumo de grande parte da população mundial, inclusive dos excluídos.
O padrão de acumulação do capital na era das tecnologias da informação vem transformando de forma dramática o conceito de ocupação. Criou-se, com efeito, um novo paradigma de emprego - mais flexível, precário e desprovido das garantias de estabilidades associadas ao padrão convencional. Emprego parcial e informal são, pois, partes integrantes dessa nova onda do capitalismo. Nos grandes países da periferia, inclusive no Brasil, eles se tornaram endêmicos e significam mais da metade do mercado de trabalho. Os sistemas produtivos globais, com o auxílio da tecnologia da informação, buscam espalhar pelo mundo a fabricação de suas partes e componentes em
busca das vantagens que reduzam seus custos. Uma delas é a mão-de-obra barata e flexível. Mas essa tendência não é típica apenas para os bolsões de pobreza. Em todos os países, inclusive nos mais ricos, regimes de trabalho cada vez mais flexíveis, induzidos pelo capitalismo global, pedem aos trabalhadores que sejam ágeis, abertos a mudanças de curto prazo, assumam riscos constantes e dependam cada vez menos de leis e procedimentos formais.
Trata-se de uma enorme revolução, com conseqüências psicossociais complexas e mal avaliadas. No Brasil, onde na última década os trabalhadores informais saltaram de pouco mais de 40% para 57% do mercado de trabalho metropolitano, os impactos se fazem sentir no aumento da precariedade e da desproteção social, além da queda
média dos salários. Na Argentina e em outros grandes países da América Latina a situação é ainda mais grave. O desemprego aumenta e parte crescente dos empregos formais está sendo substituída por "projetos" ou "parcerias transitórias". O capital é cada vez mais impaciente e quer um retorno cada vez mais rápido e com menos riscos


Em dois dias, 20 conferencistas


As inscrições para o "Seminário Internacional: Tendências e Desafios da Política na América Latina" são gratuitas e podem ser feitas até esta quarta-feira, dia 14, no Prolam (Programa de Pós-Graduação em Integração da América Latina) As informações estão disponíveis no site www.ups.br/prolam, ou pelos telefones 3091-3587, ou 3091-3589, ou ainda na rua do Anfiteatro, 181
Nos dois dias de debates, estarão presentes mais de 20 pesquisadores e professores das áreas política e econômica. O reitor da USP Adolpho José Melfi abre o evento às 9h30. Em seguida, discursam a coordenadora do seminário, professora Maria Cristina Cacciamali, a professora Suely Vilela, pró-reitora de Pós-Graduação, Armand Pereira, presidente da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil e o professor Samuel Kilsztajn, da PUCSP.
As discussões do primeiro dia do encontro estarão centradas em três temas distintos. A mesa-redonda "As Restrições Macroeconômicas para o Desenvolvimento Econômico Latino-Americano" será coordenada pelo professor Cláudio Dedecca do Instituto de Economia da Unicamp. Participa, entre outros, o economista argentino Rubén Lo Vuolo, do Cientro de Investigaciones Económicas e Políticas Públicas (CIEPP). O segundo tópico do dia será "Relações Internacinais e Direitos Fundamentais no Trabalho: Novos Conceitos e Práticas para a Política Social", sob coordenação da professora Maria Cristina. Fecha as exposições do primeiro dia a mesa redonda intitulada "As Limitações ao Desenvolvimento na América Latina: O Novo Papel do Estado e a Estratégia Local", presidida pela professora Anita Kon, da PUC/SP. Participam desta rodada a professora Catalina Banko, da Universidade Central de Venezuela, e a professora Maria Regina Nabuco, da PUC de Minas Gerais.
As exposições do segundo dia giram em torno de dois tópicos voltados especialmente sobre mercado de trabalho e políticas públicas nesse campo. "As Reformas Laborais: Gestão e Flexibilização" é presidida pelo professor Antônio Carlos de Moraes, da PUC/SP. "Políticas Públicas e Grupos Vulneráveis: Gêneros e Jovens", sob coordenação da professora Maria Lúcia Refinetti Rodrigues Martins, da FAU/Prolam/USP, terá a participação da professora Sônia Rocha, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro.

 




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