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O Estado de São Paulo sai na frente na área ambiental e lança um relatório tido por cientistas da área como ‘quase’ completo no que diz respeito a dados de meio ambiente reunidos nos últimos dez anos. O documento – produzido a toque de caixa para ser apresentado na África do Sul entre 26 de agosto e 4 de setembro na Cúpula de Johannesburgo, ou Rio+10, que será coberto para a Coordenadoria de Comunicação Social pelo jornalista Pedro Ortiz, diretor da TV USP – foi avaliado por mais de 20 especialistas durante seu lançamento, dia 9 de agosto, na sede da Secretaria de Estado do Meio Ambiente (leia texto nesta página). O professor de Planejamento e Urbanismo da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, Candido Malta Campos Filho, comentou para o Jornal da USP alguns aspectos do relatório. De maneira geral, definiu a Agenda 21 paulista como “uma análise bem feita porém ainda insuficiente sobre meio ambiente, já que muitas questões foram deixadas de lado”.
Para o professor e ex-secretário de Planejamento do município de São Paulo, a abordagem “muito esquemática” preteriu uma composição mais crítica do documento, que poderia ter sido mais amplo e abranger itens presentes no Plano Diretor para a Cidade de São Paulo. O “casamento” da Agenda paulista com o Plano Diretor do município seria feliz no sentido de direcionar objetivamente políticas públicas para o desenvolvimento sustentável, diz o professor.
Campos acredita que grande parte dos principais problemas urbanos, incluindo enchentes, trânsito e contaminação de mananciais, está relacionada à maneira como o solo é ocupado. “Essa não é só uma questão social, mas principalmente ambiental. Se não resolvermos esse problema, os outros persistirão. A regulação do uso do solo presente na lei de zoneamento precisa ser refeita a partir de uma análise crítica e democrática. Acho que seria muito interessante abordar essa questão na Agenda paulista.”
Sobre o tópico referente a mananciais, o professor observa que o relatório deveria trazer o grau de ocupação desordenada ocorrido nessas áreas nas últimas décadas. Para ele, é importante saber a velocidade de quanto piorou a ocupação irregular para que se possa dimensionar o problema e produzir políticas públicas específicas.
A região metropolitana está sob risco de perder seus principais mananciais, como as represas Billings e Guarapiranga, segundo Campos. Se isso ocorrer, diz, será necessário “roubar” água de outros mananciais como, por exemplo, da bacia Ribeira do Iguape, no litoral sul, ou dessalinizar água do mar, como é feito em Israel. “Essas opções são muito caras. Mais barato seria redirecionar uma política habitacional inteligente e evitar, inclusive, que os rodoanéis sejam implantados dentro de mananciais, pois isso acaba atraindo mais populações.”
Além da ocupação e uso do solo, outros itens da Agenda 21 em São Paulo apresentaram falhas, na opinião do professor Campos. No capítulo 6, que trata do gerenciamento de recursos hídricos, ele aponta a falta do dado de quanto do esgoto produzido na região metropolitana de São Paulo é efetivamente tratado. O relatório mostra que a capacidade de tratamento do esgoto produzido aumentou seu percentual de 20% para 60%. Porém, parte dessa capacidade está ociosa por conta de interceptores (grandes ramais de esgoto) que ainda não foram interligados à rede.

Goldemberg e Fernando Rei: documento inacabado

Segundo a assessoria de imprensa da Sabesp (Companhia de Saneamento básico do Estado de São Paulo), cerca de 30% da capacidade de tratamento da rede está ociosa na região metropolitana. Para aumentar esse potencial, o governo do Estado está iniciando a segunda etapa do Projeto Tietê, o que permitirá a ampliação dos serviços de coleta e tratamento de esgotos, além da diminuição da contaminação dos rios Tietê, Pinheiros e afluentes (leia texto nesta página).
Gerôncio Rocha, diretor do Comitê da Bacia Hidrográfica do Alto Tietê e um dos especialistas convidados para a leitura crítica da Agenda 21 em São Paulo, também observou a falta do dado sobre o total de esgoto tratado. “Não detectei essa informação no capítulo que me coube analisar. Na região metropolitana, cerca de 40% do esgoto produzido é tratado. Isso é pouco, mas sem dúvida um avanço se comparado aos números de dez anos atrás, quando se tratava apenas 10%.” Em países desenvolvidos, cerca de 90% do esgoto produzido é tratado e o mesmo acontece em algumas áreas do interior paulista.
Assim, apesar de o cidadão pagar uma tarifa composta que embute o tratamento da água e do esgoto, apenas uma parte desse preceito é cumprida. “O esgoto, sobretudo nas periferias, é afastado, ou seja, despejado no córrego mais próximo. Essa cultura sobre o tratamento do esgoto só vem sendo cultivada há pouco tempo porque envolve custos muito altos”, afirma Rocha.



O Projeto Tietê e a nova postura social

O projeto de despoluição do rio Tietê – que ganhou grande impulso com ações populares vitoriosas, como o abaixo-assinado promovido em 1992 pela rádio Eldorado – está entrando na sua segunda etapa. Até 2005, cerca de 1,2 milhão de moradores da região metropolitana de São Paulo deverá ser beneficiada pela extensão dos serviços de coleta e tratamento de esgotos e programas de educação ambiental.
Até o presente, o Projeto Tietê conta com recursos de US$ 1,1 bilhão, financiados pelo Banco Mundial, pela própria Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) e pela Caixa Econômica Federal.
O sistema de tratamento de esgotos da região metropolitana apresenta capacidade ociosa da ordem de 30%, embora o esgoto efetivamente tratado seja apenas 40% do total produzido. Essa disparidade acontece porque ainda inexistem interceptores (emissários que interligam ramais menores da rede de esgotos às estações de tratamento) em pontos-chave do sistema. A assessoria de imprensa da Sabesp explica que o Projeto Tietê ainda é um programa em andamento, daí a falta de interceptores e outros recursos em locais importantes.
A segunda fase do projeto pretende corrigir aquelas falhas do sistema e outros problemas graves, como o despejo de esgoto em áreas de mananciais. As principais intervenções da segunda etapa devem acontecer na bacia do rio Pinheiros, no sistema São Miguel (zona leste) e na represa Billings. “As obras nessa área são caras e feitas em etapas. Os avanços dos investimentos nesse campo são reflexo de uma nova postura da sociedade como um todo em relação ao meio ambiente”, afirma Lucina Cortez, da assessoria de imprensa da Sabesp.


Documento sob revisão

Elaborada em 180 dias com esforços de mais de cem técnicos voluntários, agrupados pela Secretaria de Estado do Meio Ambiente, a Agenda 21 em São Paulo será apresentada na Rio+10, de 26 de agosto a 4 de setembro, em Johannesburgo, África do Sul. Escrita em português e inglês, as 152 páginas mostram um balanço dos avanços e retrocessos ocorridos na área ambiental desde a Rio 92.
Durante o lançamento do relatório, dia 9 de agosto, uma leitura crítica realizada por mais de 20 especialistas da área ambiental apontou imperfeições que, segundo a Secretaria, serão corrigidas na próxima edição do documento. De acordo com o editor-coordenador do relatório, Fernando Cardozo Fernandes Rei, da Cetesb (Companhia de Tecnologia de Saneamento Ambiental), a Agenda 21 em São Paulo não nasce como um programa de governo, mas como um documento que irá subsidiar as discussões em Johannesburgo.
Para José Goldemberg, secretário de Meio Ambiente e professor aposentado do Instituto de Física da USP, o objetivo do relatório é apontar caminhos. “A Secretaria de Meio Ambiente usa seus instrumentos para forçar empreendimentos no caminho do desenvolvimento sustentável.”
Segundo o relatório, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) de 0,87 no Estado ficou acima da média nacional, de 0,76, sendo superado apenas por países como, por exemplo, Estados Unidos, Austrália e Alemanha.
As ações de controle de emissão de poluentes empreendidas pela Cetesb especialmente a partir de 1997, com a adoção de tecnologias mais “limpas” em veículos, evidenciam a queda na concentração da poluição atmosférica na região metropolitana. Mesmo assim, a poluição permanece acima dos padrões legais. Segundo o relatório, os setores de energia e transportes geram 95% da poluição do ar nas regiões metropolitanas do Estado.
Na contramão do progresso ocorrido no âmbito da proteção atmosférica, outros números evidenciam um problema crescente: a falta de uma política voltada à racionalização da frota de veículos automotores. Assim, ao passo que o número de passageiros de transportes coletivos caiu 8,5% nas cidades médias e grandes do Estado entre 1995 e 1997, a frota de veículos leves vem aumentando sensivelmente. A região metropolitana de São Paulo, por exemplo, recebe 350 mil novos veículos diariamente em sua frota total.
A pergunta latente é saber como é possível os níveis de poluição atmosférica caírem com um aumento expressivo na maior fonte poluidora do ar. A resposta continua sendo a nova tecnologia dos automóveis e o controle das emissões industriais.
“Um carro na década de 80 emitia 40 vezes mais poluentes do que os automóveis atuais. Assim, conseguimos reduzir a concentração do monóxido de carbono no ar. Além disso, devemos lembrar do controle das emissões industriais implantado há décadas. No passado, o grande vilão da atmosfera era o dióxido de enxofre, produzido a partir da queima do combustível industrial. Hoje, quase não se houve mais falar nisso. Atualmente, o ozônio ocupa esse posto e, infelizmente, é o único gás cuja emissão não está caindo”, afirma Cláudio Darwin Alonso, assessor técnico para Qualidade do Ar da Secretaria de Meio Ambiente.
No Estado de São Paulo, a mortalidade infantil apresentou decréscimo de 63,5% entre 1980 e 1998. Apesar do índice de desenvolvimento habitacional em 1998, de 0,756, ter sido o melhor da média nacional, ainda existe uma parcela significativa da população vivendo em moradias informais e favelas.
Entre outros dados, a Agenda mostra que houve relativo avanço na área de gestão ambiental, especialmente na participação de ONGs (organizações não-governamentais) como instrumento de ações preventivas.

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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