Ao
se aposentar no Departamento de Zoologia do Instituto de Biociências
em 1981 e ser oficialmente considerada integrante do quadro de servidores
inativos da Universidade, a especialista em plâncton marinho
Tagea Kristina Simon Björnberg sentiu-se como “morta,
colocada sobre uma mesa, entre quatro velas acesas”. Não
se conformou com a inatividade, porque ainda se sentia em plena
forma e entusiasmada com a ciência. Aceitou de bom gosto convite
para dar cursos sobre a sua especialidade e hoje, aos 77 anos, morando
em São Sebastião, orienta jovens pesquisadores no
Cebimar. E os elogia: “A juventude estudiosa de hoje é
mais aplicada que a do meu tempo. Leva os estudos muito a sério.
Antigamente,
na USP os jovens eram imaturos, inseguros. Esses meninos das teses
são pessoas inventivas que trabalham, brincam e sempre dão
um jeito de estudar os animais de modo inteligente”. O desenvolvimento
da tecnologia e a política de financiamento da pesquisa também
ajudam: “No meu tempo não havia verba para nada. O
aluno não tinha amparo. Vinham os americanos, em alguns dias
faziam o seu trabalho e iam embora. Eu até achava bobagem
ir para o exterior, porque ao retornar dava vontade de chorar. Nossas
bibliotecas eram mal equipadas, tínhamos que pedir ajuda
aos cientistas de outros países. Pedi muito livro aos franceses
na forma microfilmada e tive de pagar por eles do meu bolso. Agora,
não. Agora tem Fapesp, Capes, CNPq, bolsas da USP. Pode-se
fazer pesquisa de Primeiro Mundo sem sair do País”.
Tagea,
que por parte paterna é descendente de suecos e dinamarqueses
e da materna, de ingleses, considera os brasileiros muito inventivos
e até sugere contar em livro como eles sabem bolar aparelhinhos
simples de pesquisa e com eles chegar às mesmas conclusões
que os superequipados cientistas de países desenvolvidos.
Mas precisam aprender a reconhecer suas próprias qualidades
e não se apavorar diante do acúmulo de conhecimentos
demonstrados por cientistas estrangeiros. Aqui a pesquisadora conta
o caso de um de seus irmãos, que estudava geologia e tinha
como orientador um professor sueco. O professor parecia saber de
tudo, geologia, física, química, matemática,
e o orientado, impressionado com tanto saber, deu de comprar livros
sobre todas essas ciências e a estudar “feito doido”.
O sueco viu aquilo e um dia perguntou ao aluno brasileiro o que
estava fazendo. “Vejo que o senhor domina a física,
a química, a matemática, todas as ciências,
e resolvi estudar tudo isso para acompanhar as suas lições”,
respondeu o irmão de Tagea. “Deixa disso”, aconselhou
o sueco. “Vamos ser práticos: quando você está
na rua e encontra à sua frente um buraco que dificulta a
passagem, o que faz?”. “Coloco terra no buraco”,
respondeu o aluno. “Isso mesmo”, concordou o professor,
“um pouco de terra resolve, não há necessidade
de construir uma montanha em cima do buraco. Precisamos aprender
com a natureza.”
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Tagea:
a pesquisa brasileira é excelente |
Aluna
de escola pública, Tagea considera-se antes de tudo professora.
Nascida em São Vicente e criada no interior “entre
cães, gatos e galinhas”, deu aulas em colégios
secundários de Sorocaba e da capital, mesmo quando já
aluna de História Natural na USP e, depois, planctologista
do Instituto Oceanográfico. Só deixou o ensino secundário
depois de se tornar oceanógrafa-chefe e, posteriormente,
se transferir para o IB e conseguir estabilidade na USP. Antes disso,
trabalhou durante três anos na Universidade Federal do Paraná,
como assistente da cadeira de zoologia, com um dos maiores especialistas
em abelhas, o padre Jesus Moure, que ainda hoje, com mais de 80
anos, escreve sobre a especialidade em revistas científicas
e “está encantado com o computador”. Ela é
que não está tão encantada com essa máquina:
“Meu computador não se adaptou a mim, é muito
renitente, mas de vez em quando consigo que funcione”.
No
Cebimar, Tagea acompanha dois pós-graduandos, um dos quais
estuda o aspecto social de um grupo de pescadores de Parati, afetados
pela pesca comercial feita com barcos grandes. “Eles estão
me orientando. Sabem muito mais do que eu”, diz modestamente
a professora.
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