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Se as instituições de ensino fossem rigorosamente avaliadas nem haveria necessidade de avaliação externa dos alunos. A palavra da escola séria bastaria para dar credibilidade ao diploma. É nessa linha que começa a caminhar a política educacional do Brasil, mas sem perder de vista que se trata de um país ainda distante do ideal, cheio de instituições isoladas, cursos sem referência e faculdades criadas a toque de caixa. Por isso, ao mesmo tempo que dá prioridade à avaliação das escolas, em certos casos antes mesmo que sejam autorizadas a emitir diplomas, e das condições de ensino, o Ministério da Educação, por intermédio do Instituto de Estudos e Pesquisas Educacionais (Inep), esforça-se para aperfeiçoar as formas de avaliar também os alunos. O acompanhamento prévio das instituições e das condições de ensino é o único que garante que o aluno seja um bom pedagogo, um bom médico ou tenha boa formação em qualquer campo do saber, diz o presidente do Inep, professor Otaviano Helene. Nesta sexta-feira (30), às 15 horas, Helene fará uma palestra sobre a avaliação educacional no País, na Semana da Educação 2003, programada para os dias 26 a 30 na Faculdade de Educação da USP, auditório da Escola de Aplicação.

A Semana da Educação, realizada desde os anos 80, não limitará os debates à avaliação do ensino; examinará temas relativos à pesquisa e à pós-graduação, cultura e extensão universitária, políticas educacionais para o ensino médio, formação de professores, impacto de projetos sociais e direitos autorais. O educador Vítor Paro, que participará dos debates em vários momentos, considera encontros dessa natureza “fundamentais como elemento educador da sociedade” e recomenda a participação de especialistas de fora da USP. Pessoalmente, Paro, embora aposentado, ensina a um grupo de orientandas de iniciação científica as técnicas da pesquisa científica.

Otaviano Helene não considera o Provão – Exame Nacional de Cursos – o instrumento mais importante da avaliação educacional, embora seja em torno dele que se faça o maior barulho. “O Provão tem ofuscado pontos essenciais da avaliação do ensino superior”, diz o presidente do Inep. “O mais importante é acompanhar as condições do ensino. Antes de emitir diploma, o curso deve passar por avaliação. Se no segundo ano não se mostrar satisfatório, todos os alunos matriculados nele passarão para um curso já aprovado, sem prejuízo para ninguém.” Helene recorda que, no ano passado, o então ministro da Educação, Paulo Renato, autorizou que cursos ainda não aprovados emitissem diploma e que estes fossem registrados. “Resultado: 8 mil estudantes de 120 cursos se ‘formaram’ assim.”

O MEC considera que o instrumento mais importante é a Avaliação das Condições de Ensino, realizado no local de funcionamento do curso e da instituição, seguido do Censo da Educação Superior, que levanta uma série de dados quantitativos das instituições e seus cursos.

Provão — Embora secundário, o Provão continua a ser feito, mas passa por mudanças. Uma delas é a extinção dos conceitos — A, B, C, D e E — e adoção de nota, até 100. O presidente do Inep não autoriza ninguém a dizer que, a partir de agora, o Provão deixará de ser critério para a classificação de instituições. Deixar de existir, muito menos. Mesmo porque, conforme lembra o vice-diretor da Faculdade de Educação da USP e vice-presidente da Câmara de Educação Básica do Conselho Nacional de Educação, professor Nélio Bizzo, o Provão foi instituído por lei aprovada no Congresso Nacional. “Portanto, não estamos falando de um mero programa governamental; estamos falando de algo estabelecido em lei, que não pode ser simplesmente descumprido.” Para Bizzo, esse exame “trouxe um louvável aporte de informações objetivas sobre o desempenho da educação superior”, mas “tem se mostrado um instrumento com sérias limitações, que devem ser corrigidas rapidamente”.

Muito mais severo é o professor Vítor Paro, que prega o boicote à prova. “Sou radicalmente contra”, e enumera aspectos negativos. “É avaliação de produto, não do processo. O curso passa a transmitir conteúdos, para os alunos ‘vomitarem’ na prova. Como fazem os cursinhos. Não avalia se o aluno se formou. Parte de um conceito errado de educação, o de apenas passar a informação. Educação também é isso, mas não só nem o mais relevante. O computador imbecil faz essa tarefa. O aluno precisa se apropriar da cultura, que é informação, ciência, arte, literatura, postura política, companheirismo, lealdade.” E pergunta: se o Provão teve entre suas finalidades a possibilidade de fechar escolas ruins, por que nenhuma foi fechada? A educação integral defendida por Paro dá prioridade ao ensino fundamental, antes do superior. Lidar com jovens, lembra, exige conhecimento de psicologia da educação e método de ensino agradável, o único que faz o aluno aprender e reter o conhecimento. Na prática, isso não acontece e o ensino no grau fundamental é mal pago e desestimulante. Deveria ser o contrário, na opinião do professor.

Fase infantil — Outro professor da FE, José Sérgio Fonseca de Carvalho, que participa nesta terça-feira (27) de mesa-redonda sobre formação de professores, recua ainda mais no tempo do jovem aluno e defende maior empenho na formação básica e, principalmente, infantil. “É relevante especialmente para lares de pais sem escolaridade. No Pará, 50% dos alunos do ensino fundamental são reprovados por faltar a educação infantil, que dá a base.” O professor espera que o governo de Luiz Inácio Lula da Silva destine mais recursos para o ensino infantil. A propósito da Semana da Educação, José Sérgio Fonseca diz ter ligação estreita com o evento, pois, quando ainda aluno, foi um dos que criaram esses encontros, depois assumidos pela faculdade. Ele preside a Comissão Permanente de Licenciatura, criada com o propósito de apresentar ao Conselho Estadual de Educação documentos de avaliação dos cursos de licenciatura, e tenta formar uma representação ampla que reúna todas as unidades da USP que têm licenciatura. Busca também consenso para a criação de órgãos interunidades a fim de definir políticas educacionais, procurar a convivência na divergência e a realização de estágios, entre outros objetivos. O educador diz que o formato básico da licenciatura continua sendo o mesmo dos anos 30, quando a USP foi criada, mas as condições de hoje são totalmente diferentes de então. Naquela época formavam-se professores para cinco grandes ginásios do Estado; agora são mais de 6 mil. Daí porque falar em “renovação” do ensino não faz muito sentido. “Renovar o quê?”

Para outro professor da USP incluído entre os conferencistas da Semana da Educação, Francisco Maria Cavalcanti de Oliveira, aposentado da Sociologia, que fala quarta-feira (28), às 19h30, sobre Universidade, Trabalho e Conhecimento, cabe à universidade levar a todos os segmentos da sociedade o ensino, não profissionalizante, mas “o conhecimento científico em alto nível de abstração”. Segundo ele, é preciso começar já, “procurar o que de mais avançado existe em ciência e tecnologia, não o mais atrasado. O contrário é próprio do ensino economicista. Precisamos de tecnologia de Primeiro Mundo”.

Jovens — A professora Anna Maria Pessoa de Carvalho, que participará da mesma mesa-redonda do professor José Sérgio Fonseca, na terça-feira, está entusiasmada com o que considera valorização da educação no Brasil e o interesse dos jovens pela licenciatura. “A sociedade volta a pensar, a discutir, a valorizar a educação. Em todos os níveis. Revistas trazem artigos toda semana sobre o tema. Os jovens são idealistas. Levam o curso muito a sério. Na minha disciplina (Metodologia de Ensino de Física) dou mais horas/aula do que a grade curricular exige, no diurno e no noturno.” A professora apresenta uma prova do interesse crescente dos estudantes pela licenciatura na USP: o número de matrículas aumenta a cada ano. Em 2001, foram 3.268 no primeiro semestre e 2.879 no segundo; em 2002, subiram para, respectivamente, 3.880 e 3.211; este ano, houve 4.241 matrículas no primeiro semestre e há previsão de crescimento no segundo. Em dois anos, mil matrículas”, comemora. É verdade que nem sempre a procura pela licenciatura pode ser atribuída a razões idealistas; há também o “lado triste” do desemprego, e é melhor ser professor do que não trabalhar.

 




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