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Ficou mesmo para esta terça-feira, dia 12, a próxima rodada de votações dos chamados destaques para votação em separado (DVS) e das emendas aglutinativas que visam a alterar pontos específicos do texto básico da reforma da Previdência, aprovado em primeiro turno na madrugada do dia 6, quarta-feira. A decisão de suspender a sessão extraordinária que ocorreria na manhã de quinta-feira foi tomada em reunião entre líderes da base governista e o ministro da Casa Civil, José Dirceu, após a confusão em frente ao Congresso Nacional, que teve como saldo 52 vidraças da fachada do Congresso quebradas e sete feridos.

A estratégia de adiantar a sessão de votação do texto básico para a madrugada de quarta-feira, numa clara tentativa de esvaziar manifestações, pegou os servidores de surpresa. Depois de quase 15 horas de negociações de bastidores, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 40/03 chegou a passar em primeiro turno na Câmara Federal sem grandes transtornos. Mesmo sob forte pressão dos chamados “radicais” e do “grupo dos 30” do PT – oito deputados do partido de Lula podem ser suspensos ou expulsos por se absterem de votar –, além da ameaça do PMDB de suspender a votação, o governo conseguiu aglutinar 358 votos (62 deles de tucanos e pefelistas) para aprovar o texto básico. Houve 126 votos contrários e nove abstenções. Segundo analistas políticos, no entanto, esta não foi exatamente uma vitória, já que, se contasse só com sua bancada, o governo teria sido derrotado na primeira prova de fogo no Congresso.

As negociações avançaram até a madrugada de quinta-feira e, na votação mais aguardada da noite, a Câmara manteve a contribuição previdenciária de 11% para aposentados e pensionistas, ao rejeitar – por 326 votos a 163 – o destaque do PFL que pedia exclusão desse dispositivo no texto da reforma. Por acordo, dois destaques sobre o mesmo tema, um do PCdoB e outro do PDT, ficaram prejudicados e não foram votados.

Outras mudanças importantes foram aprovadas por acordo. Entre elas, a elevação do subteto do Judiciário estadual, que passou de 80,5% para 90,25% da remuneração dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF), incluindo procuradores estaduais, Ministério Público e Defensoria Pública. Uma alteração ao texto básico criou uma transição mais branda para servidores que se aposentarem antecipadamente em relação às novas regras de idade mínima (60 anos para homem e 55 para mulher). Assim, o redutor de 5% sobre provento por cada ano que faltar para atingir a nova idade requerida será reduzido para 3,5% nos anos de 2004 e 2005, voltando a ser de 5% a partir de 1o de janeiro de 2006, de acordo com informações da Agência Câmara.

O PFL teve ainda outras duas emendas aglutinativas rejeitadas. Uma delas enfatizava requisitos para a criação dos fundos complementares, tais como ser de caráter público, ter capitalização em conta individual, garantia do Tesouro, gestão paritária e vedação do uso dos recursos para o pagamento de juros ou amortização de dívidas públicas. A segunda emenda aglutinativa rejeitada pretendia atribuir também aos ministros do Tribunal de Contas da União as mesmas regras de aposentadoria dos ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).

 

 

 

O que muda com o projeto

Paridade – O termo significa extensão dos benefícios de reajustes salariais, incluindo gratificações e adicionais, dos servidores da ativa para os inativos. Atualmente, a aposentadoria dos servidores é reajustada de acordo com o índice de reajuste dos funcionários da ativa. Com a Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 40/03, aprovada no dia 6, em primeiro turno, na Câmara dos Deputados Federais, os futuros servidores aposentados não terão direito à paridade e seus benefícios serão corrigidos pela inflação. Da mesma forma, os atuais servidores que não preencherem os requisitos para obter a integralidade também terão seus benefícios reajustados pela inflação, ao se aposentar. A paridade só será válida para os atuais servidores que conseguirem integralidade. O texto original do relator da reforma da Previdência, deputado José Pimentel (PT-CE), defendia a paridade parcial dos benefícios, ou seja, a paridade deveria ser aplicada apenas ao salário-base, e se excluiriam gratificações e adicionais.

Integralidade – Antes da aprovação da reforma, os servidores se aposentavam com benefício igual ao valor integral do último salário. Agora, futuros servidores não terão direito à integralidade. Para atuais servidores, a integralidade só valerá para os que cumprirem 10 anos no último cargo, 20 anos de serviço público, 30 anos de contribuição (mulher) ou 35 (homem) e 55 anos de idade (mulher) ou 60 (homem). Caso esses requisitos não sejam cumpridos, a aposentadoria será calculada de acordo com a média das contribuições. Assim, prevaleceu o texto do relatório do senador Pimentel.

Redutor e abono de permanência – Esse mecanismo não existe na legislação em vigor. Com o novo texto aprovado em primeiro turno, deverá haver um redutor de 5% para cada ano antecipado de aposentadoria, chegando ao limite de 35% (48 anos para mulher e 55 anos para homem). Os servidores que já cumpriram os requisitos para se aposentar antes da aprovação da reforma e quiserem continuar trabalhando não terão de contribuir com os 11% para a Previdência enquanto estiverem na ativa. A proposta já constava no texto do senador Pimentel.

Contribuição de inativos e teto – Atualmente, aposentados e pensionistas não são taxados pela Previdência. Com as mudanças, pagarão 11% de contribuição sobre o que exceder a R$ 1.200,00. Futuros aposentados e pensionistas estarão isentos de contribuição até o teto de R$ 2.400,00. Antes e depois da aprovação do relatório do senador Pimentel, as propostas do limite de isenção variaram entre R$ 1.058,00 (atual limite de isenção também para o imposto de renda) e R$ 1.200,00. Após o acordo acertado no primeiro turno das votações, prevaleceu o limite de R$ 1.200,00.

Pensões – Hoje, em casos de morte do servidor, cônjuges e filhos de até 21 anos recebem pensões em valor igual ao da aposentadoria. Pelas novas regras, pensões só serão pagas em valor integral até o limite de R$ 2.400,00, sendo que haverá um desconto de 50% sobre o que exceder esse valor. No relatório de Pimentel, o pensionista receberia pensão integral até o limite de R$ 1.058,00, com redutor de até 70% sobre o excedente.

Teto e subteto salariais – De acordo com a Constituição, existe um valor máximo para os salários de servidores, mas esse teto nunca foi regulamentado. Agora, o teto para servidores da União será de R$ 17.170,00 (salário do ministro do STF). Nos Estados e municípios, haverá um subteto correspondente à maior remuneração do chefe de cada poder. Para o Judiciário estadual, o teto deverá ser de 85,5% do salário do ministro do STF. As mudanças seguem, em linhas gerais, as propostas apresentadas no texto do relator Pimentel, embora este ainda não trouxesse os porcentuais para o teto do Judiciário estadual.

Aposentadoria complementar ou fundos de pensão – Não existe atualmente esse mecanismo para servidores públicos. Futuros servidores com aposentadoria superior a R$ 2.400,00 terão de contribuir para um fundo de pensão. Esses fundos, que serão regulamentados após as reformas, terão caráter público, fechado (só para funcionários de determinadas carreiras) e de contribuição definida (o beneficiário sabe quanto irá pagar, mas não quanto irá receber, já que o valor será calculado no futuro pela média das contribuições). Os servidores lutavam pelo benefício definido, ou seja, aquele em que o valor da aposentadoria é conhecido ao se optar pelo plano.

Teto do INSS e de futuros servidores – O teto da aposentadoria para trabalhadores da iniciativa privada (INSS) passa de R$ 1.869,34 para R$ 2.400,00 (esse total corresponde à correção referente ao valor de dez salários mínimos fixados para esse teto na Constituição). Esse é o mesmo teto estipulado para aposentadorias de futuros servidores. Da mesma forma, os futuros servidores que quiserem receber aposentadoria superior a esse teto terão de contribuir para um fundo de pensão.

Trabalhadores informais – Após a finalização dos turnos de votação da reforma previdenciária, deverá haver uma lei complementar regulamentando formas de inclusão dos cerca de 40 milhões de trabalhadores que ainda não contribuem e não recebem os benefícios da Previdência.

 

 

 

 

Reforma diminui desequilíbrios

Professores da FEA mostram que trabalhadores
cobertos pelo INSS recebem na aposentadoria
menos do que pagaram trabalhando, e o
contrário acontece com o setor público

Os professores Hélio Zylberstajn, André Souza, Anderson Stancioli e Marcelo Milan, todos da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade da USP, fizeram um estudo de avaliação das aposentadorias brasileiras, tendo por base dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (PNAD), de 2001, e concluíram que a reforma da Previdência, se não fugir muito da proposta do relator José Pimentel, diminuirá os desequilíbrios entre o que pagam e o que recebem posteriormente os trabalhadores cobertos pelo INSS e os funcionários públicos. Eles calcularam as contribuições de todos os que trabalham, do ingresso no mercado até a aposentadoria, e em seguida quanto vão receber como aposentados durante o período determinado pela expectativa de vida.

O estudo (publicado na Folha de S. Paulo, dia 6) mostra que os segurados do INSS contribuem em média com 21% de seus rendimentos (incluída a parte da empresa), mas para pagar as suas aposentadorias seria necessário recolher apenas 17% dos rendimentos. Isso quer dizer que os contribuintes do INSS pagam mais do que recebem e a diferença é usada para cobrir as aposentadorias dos informais, que não contribuem com o sistema. Em outras palavras, os trabalhadores do setor formal transferem renda para os informais.

Com os funcionários públicos acontece o contrário; eles pagam menos do que recebem e para pagar suas aposentadorias teriam que contribuir com 49% dos rendimentos, mas contribuem com apenas 16%. Os contribuintes em geral transferem renda para o setor público. Segundo Zylberstajn e colegas, a reforma proposta pelo governo não terá impacto no INSS, mas atenuará o desequilíbrio no sistema de aposentadorias dos funcionários públicos. Se o relatório de Pimentel fosse aprovado integralmente, a alíquota necessária para pagar as aposentadorias dos funcionários públicos se reduziria dos atuais 49% para 27%, mas suas contribuições aumentariam de 16% para 18%. Reduz-se, portanto, a diferença entre o que os atuais funcionários públicos recebem na aposentadoria e o que pagam para se aposentar. A esta altura da tramitação da reforma previdenciária no Congresso (quinta-feira), sabe-se que há alterações na proposta do relator, contudo Zylberstajn as considera pouco expressivas para mudar o fundamental do estudo dos professores. De qualquer modo, eles farão nova análise assim que as mudanças estiverem concluídas.

Coerente com as conclusões do estudo, o professor Zylberstajn reconhece que os professores universitários, funcionários públicos, são privilegiados. Nada muda para quem tem direito adquirido (tempo para se aposentar), mas, para quem está a caminho da aposentadoria, pode mudar muito. O servidor deverá trabalhar por mais tempo, uma vez que a idade mínima para se aposentar será maior. Por isso mesmo, o professor da FEA entende que “o grosso da economia com a reforma vem do aumento da idade mínima”.

 




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