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As reformas implementadas no museu e parte das mais 8 mil peças, que formam um dos maiores acervos de arte contemporânea da América Latina, estão representadas no livro publicado graças à Associação dos Amigos do MAC

 

Uma história em que o sonho chega sempre na frente. Com essa coragem e idealismo, o Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP completa 40 anos apresentando um dos acervos mais importantes da América Latina. Para ter um espaço digno dos grandes mestres, como Pablo Picasso, Chagall, Miró, Modigliani, Portinari, Anita Malfatti e Tarsila do Amaral, outros mestres da Universidade – como Walter Zanini, Wolfgang Pfeiffer, Aracy Amaral, Ana Mae Barbosa, Lisbeth Rebollo Gonçalves, José Teixeira Coelho Netto e a atual diretora Elza Ajzenberg – também pintaram a realidade com novas cores. Não mediram esforços para dinamizar as sedes da Cidade Universitária e do Ibirapuera e conseguir novos espaços, como a Galeria de Arte do Sesi.

Toda essa luta está no livro Coleção MAC Collection, da Comunique Editorial, que chega às livrarias a partir deste mês. A edição bilíngüe, em português e inglês, é resultado dos esforços da Associação dos Amigos do MAC (Aamac). Conta a história da arte do século 20 através de uma seleção de 213 obras do acervo, que já ultrapassa 8 mil. Traz também, logo nas primeiras páginas, um ensaio fotográfico de Fernando Lazlo, que registrou toda a reforma do MAC a partir de 2001. E textos de 11 especialistas que acompanham, cronologicamente, as obras escolhidas, sugerindo um passeio pela arte dos últimos cem anos.

“O museu público e universitário é questão desafiadora”, observa a diretora Elza Ajzenberg. “O MAC é espaço de pesquisa, de formação educacional e de informação. Constitui um campo fascinante do estudo da arte e instiga a recepção estética.” A diretora salienta que a USP foi sempre um valioso instrumento de criação e originalidade a serviço da ciência e da sociedade, contribuindo para a formação de uma visão crítica do Brasil com pesquisadores das mais diversas áreas do conhecimento. “A arte está inserida na USP desde as suas origens, com pesquisadores pioneiros como Roger Bastide, Lévi-Strauss, Jean Maugüé, Ungaretti e, posteriormente, Lourival Gomes Machado, Ruy Coelho, Gilda de Mello e Souza e Antonio Candido, entre outros. Tais contribuições continuam em várias unidades, institutos, museus, centros e associações de pesquisa. O MAC é um dos espaços de maior potencial para dar prosseguimento a essas conquistas.”

Mestres da USP – Elza faz questão de lembrar, na apresentação do livro, a contribuição de cada diretor do MAC. Destaca o trabalho pioneiro de Walter Zanini (1963-78). “Mesmo com os obstáculos dos primeiros tempos, ele elaborou uma estrutura funcional e administrativa que permitiu o desenvolvimento de projetos de incentivo aos novos artistas com as edições da Jovem Arte Contemporânea e o diálogo permanente com instituições e artistas internacionais.”

Sobre Wolfgang Pfeiffer (1978-82), cita o seu empenho na ampliação do acervo e na abertura do espaço para exposições resultantes do trabalho em teses e dissertações na Universidade. Aponta a gestão de Aracy Amaral (1982-86) como um período de definições para a adequação do acervo às regras museológicas modernas. Lembra também do desafio de Ana Mae Barbosa (1986-93) como arte-educadora, levando a arte para as diversas camadas sociais, proporcionando a aprendizagem na leitura de imagens e a educação através das linguagens estéticas. Apresenta o trabalho de Lisbeth Rebollo Gonçalves (1994-98), priorizando intercâmbios internacionais. E a gestão de José Teixeira Coelho (1998-2002), que deu uma intensa visibilidade ao museu através da parceria com a Galeria de Arte do Sesi, além de se dedicar a uma ampla reforma da sede da Cidade Universitária.

O MAC nasceu em 1963, durante a gestão do reitor Ulhôa Cintra, quando recebeu o acervo que constituía o Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo. “Nessa herança estão também obras de coleções particulares do então presidente do MAM, Francisco Matarazzo Sobrinho, o conhecido Ciccilo, e de sua esposa Yolanda Penteado”, diz Elza. “Se for feita uma retrospectiva, verifica-se que, desde a década de 1930, havia, entre personalidades que implementaram a arte, o desejo da criação de um museu segundo a visão moderna da arte. Várias personalidades brasileiras, desde o final dos anos 20, movimentaram-se em direção dessa possibilidade. Mário de Andrade e Sérgio Milliet, nos anos de 1930, reivindicaram museus didáticos e contemporâneos. Nesse clima de emergências e atualizações, na mesma década, houve a fundação da USP.”

Reforma radical – Durante a gestão de Teixeira Coelho e o vice-diretor Martin Grossmann, a sede do MAC no campus da Cidade Universitária passou, com o apoio da Fapesp, por uma reforma radical. “Quando assumi a direção do MAC em 1998, propus três metas prioritárias: dotar o museu de um espaço adequado para exposições; reconquistar, reafirmar e consolidar a sua visibilidade e introduzi-lo no circuito internacional da arte”, explica Teixeira. “Essas três metas revelaram-se na verdade intimamente imbricadas, a tal ponto que uma não se pode cumprir sem que as demais tenham sido alcançadas. Na contemporaneidade, nenhum museu de arte se torna realmente visível, na acepção simbólica como física do termo, se não dispuser de um espaço real, concreto, capaz de merecer essa visibilidade e se não fizer parte do roteiro internacional da arte.”

Teixeira explica que toda a reforma – feita em apenas oito meses – teve como finalidade específica abrigar a exposição permanente de seu acervo. “O MAC é um museu de acervo, não apenas um espaço que abriga exposições temporárias montadas fora e longe dele. E é o museu de um acervo muito particular, o mais importante em arte moderna e contemporânea do País e um dos dois ou três mais destacados da América Latina.”

Diante dessa importância, o professor defende que a coleção esteja permanentemente à disposição do público, numa relação de perenidade. “O que faz com que um museu tenha efetivamente um público e não apenas um conjunto aleatório de visitantes, assim como permite que um dado público se aposse simbolicamente de um repertório de obras, integrando-o à sua memória afetiva e transformando-o em motor de sua renovação criativa, é essa possibilidade de ser visitado repetidas vezes para que nele se revejam suas obras. É esse hábito que cria entre obra e observador a necessária familiaridade sobre a qual se completa o desenvolvimento cultural desse observador e do sistema cultural e artístico a que pertence.”

Livro traz a história da arte no século 20, reproduzindo o vasto acervo existente na USP

 

 

Modigliani, Miró, Portinari, Tarsila estão na USP

O MAC, aos 40 anos, renova-se abrindo espaço a todos os jovens que querem propor e viver a arte. É só olhar a fachada com as cores e imaginação dos grafiteiros para perceber que o museu está em sintonia com todos os movimentos e cada vez mais integrado ao dia-a-dia da cidade.

A Coleção MAC Collection mostra bem a história em que a criatividade e a liberdade andam juntas. E sugere um passeio pela arte dos últimos cem anos. Esse passeio começa com a paisagem de Giacomo Balla, de 1906-1907, obra de datação mais antiga do acervo. Lembra a importância do retrato através dos trabalhos de Cândido Portinari (Retrato de Paulo Rossi Osir) e Vicente do Rêgo Monteiro (Retrato de Joaquim do Rêgo Monteiro). Foi o gênero mais popular da pintura a partir do Renascimento, quando o homem se tornou principal tema e espelho da arte. Destaca também o Auto-retrato, de Amedeo Modigliani, um óleo sobre tela de 1919 que atrai estudiosos e críticos de arte do mundo inteiro. Mostra as transformações radicais do cubismo, que não queria mostrar as coisas como os olhos as vêem, mas como a inteligência as percebe, procurando a essência do mundo e não a impressão ou sensação, satisfazendo a razão e o intelecto. As obras de Gleizes, Lhote, Metzinger, Braque e Dufy exemplificam essa tendência.

Na coleção do MAC, é possível perceber também os objetivos do modernismo brasileiro e a questão da antropofagia. Nas telas de Tarsila do Amaral (A negra, Floresta e Estrada de ferro), por exemplo, observam-se os processos sensíveis que materializam o programa da modernidade brasileira.

As Formas expressivas que Jean Arp criou em 1932 revelam uma fase que vai contra os excessos das técnicas pictóricas. Com formas orgânicas, o pintor procura uma nova representação da natureza, do constante estado de mudança e transformação.

A obra de Marc Chagall, Primavera, de 1938-1939, também é destacada no livro. Não se encaixa em nenhuma denominação ou estilo, apesar de revelar as influências recebidas tanto do surrealismo quanto do expressionismo.

Nesse passeio, o leitor/público tem a oportunidade de apreciar o expressionismo do brasileiro Oswaldo Goeldi nas xilogravuras Pescadores, 1950-1952, e Peixe vermelho, 1938. Ver Alberto da Veiga Guignard com cenas do cotidiano, as paisagens dos pintores operários, como Alfredo Volpi. E sentir o resultado do incentivo do MAC aos artistas da década de 60 através do trabalho de Claudio Tozzi, Luiz Paulo Baravelli e Antonio Henrique Amaral, entre outros.

 

 

 

 

No MAC Ibirapuera,
o livro de Josely Carvalho

Uma arte com a proposta de um livro. Capaz de contar e inspirar histórias. É assim que a paulistana Josely Carvalho apresenta o seu trabalho. Suas exposições trazem sempre novas páginas com novos contos. Desta vez, Josely traz Livro das telhas: 0001. Tracajá, uma instalação que, a partir de 9 de setembro, ocupará espaço no MAC Ibirapuera.

Josely dedica esse novo capítulo de sua história à tartaruga tracajá, originária da bacia amazônica, de manchas amarelas, que está em extinção. “Sempre presente em minha obra, essa pequena tartaruga dá o título e a temática da primeira página do Livro das telhas: uma série constituída por uma instalação de cinco grandes impressões digitais, vídeo e som, uma edição de 40 gravuras originais em técnica mista e 300 telhas moldadas em papel artesanal”, explica a artista.

A exposição é uma versão do Livro das telhas apresentada em 1997 no Paço das Artes. “Tive a idéia desta montagem quando estava na praia do Morro de São Paulo, na Bahia, e vi uma pilha de telhas coloniais que tinham sido moldadas na coxa dos escravos. Pensei, então, em fazer uma reverência a esse trabalho artesanal.” Josely empilhou 3 mil telhas em formato de espirais. “Cada telha de barro se tornou, então, uma página do Livro das telhas. No final da mostra, elas foram doadas para um mutirão de São Paulo.”

As telhas rendem muitas histórias. Josely cria fazendo reflexões sociais, econômicas, filosóficas. “As telhas lembram o abrigo, o desabrigo. Hoje, vivemos a fluidez da moradia. A noção de espaço mudou. Estamos em casa e, ao mesmo tempo, estamos perdidos no mundo. Percebemos isso quando entramos na Internet, ligamos a tevê e nos deparamos com as guerras ou o drama dos desabrigados.”

Na avaliação de Kátia Canton, curadora e pesquisadora do MAC, as telhas de Josely são teias. “Teias porque detêm uma forma circular e crescente, que acompanha a busca incessante de abrigo na história humana. É também espiralizada como o infinito, labiríntica, na forma como abre todas as portas, expondo fragmentos e frestas da realidade.‘‘

 

 

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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