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Uma sobreposição de narrativas, que interrompem e problematizam o roteiro principal. Desmontando uma alma boa é uma peça experimental que traz para a contemporaneidade o contexto histórico do teatro épico proposto pelo teatrólogo alemão Bertolt Brecht na primeira metade do século 20. Ou seja, quer refletir sobre a estética teatral brechtiana à luz do nosso tempo, pensando nas mudanças históricas ocorridas nesses cerca de 60 anos. Além de Alma Boa de Setsuan, que conduz o enredo do espetáculo, são inseridos trechos de Sr. Puntilla e seu Criado e A Resistível Ascensão de Arturo Ui, todas criticando o sistema capitalista. Há ainda outros fragmentos que são interpostos, como canções, pequenas histórias e outras duas peças teatrais, Dr. Faustus, de Marlowe, e Woyzeck, de Buchner.

A concepção da montagem em justapor todas essas narrativas tem como objetivo propor uma obra aberta para que o público faça sua própria montagem. Nas palavras do professor da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP Flávio Desgranges, responsável pela pesquisa que agora é levada além dos muros da universidade é uma obra explodida. São fragmentos narrativos, que precisam ser “montados” pela platéia, bem diferente da linguagem utilizada em uma obra pronta. A cena quer provocar o espectador a elaborar não apenas uma visão do espetáculo.

No enredo principal, a história foi adaptada e traz dois deuses à Cidade de Han, um pequeno vilarejo no extremo Oriente, que estão dispostos a implementar um experimento sobre a transformação na vida humana – intervir no curso dos acontecimentos para acabar com a condição de miséria dos habitantes do lugar. Para isso precisam encontrar uma alma verdadeiramente boa e elegem Mei Pi, uma prostituta da região. Então compram uma loja de alimentos e entregam a ela, que deve organizar a produção e distribuição de riquezas do vilarejo, mas o mercado ganha grandes dimensões e o crescimento da empresa se choca com as intenções iniciais dos deuses, já que, de um lado, o experimento divino deve manter a integridade moral, e por outro, a norma empresarial exige agressividade.

Dr. Faustus entra na medida em que Mei Pi acaba vendendo a alma ao Diabo, perdendo sua aura e mergulhando no mundo dos homens. Traz para a encenação o burlesco, o teatro medieval de praça, até porque o espetáculo começa do lado de fora do teatro. Woyzeck, de linguagem expressionista, faz analogia com o experimento, já que nesse texto um soldado do exército é utilizado como cobaia para investigar as alterações comportamentais, como Mei Pi, que também acaba sofrendo mudanças de comportamento. A trilha sonora é também uma narrativa. As canções são utilizadas como linguagem teatral e contam uma história, entre elas, a de um cãozinho encontrado na rua, ferido, que é tratado e quando ganha sua liberdade, o novo dono o machuca novamente só para ter que cuidar dele. Assim, a alma boa é tratada sob diferentes perspectivas, e por isso o título da peça, Desmontando uma alma boa. E essa peça é só uma possível leitura da atualidade do teatro de Brecht.

A peça Desmontando uma alma boa faz temporada até 2 de novembro, com apresentações às sextas e sábados, às 21h, e domingos, às 20h, no Tusp (r. Maria Antonia, 294, tel. 3255-5538). Os ingressos custam R$ 10,00 e R$ 5,00 (estudantes); para alunos, professores e funcionários da USP a entrada é gratuita.

 

 




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