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Santana do Ituqui
no rio Amazonas

 

O gaiolão, como é chamado o barco que possui redes ao invés de camas, sai do porto de Santarém a caminho das comunidades ribeirinhas do Pará; passa pelos rios Amazonas, com suas comunidades “urbanizadas” até porque estão mais próximas da cidade (mesmo assim são 200 km de Santarém), e pelo Tapajós, onde predominam as casas feitas de barro, além do Arapiuns, pequeno mas belo como informa um dos tripulantes, Maurício Monteiro Filho. Ele acompanhou durante 16 dias o trabalho da ONG Saúde e Alegria, registrando a população local, seu modo de vida, no caso o da subsistência, e, principalmente, como eles participam do projeto. E agora expõe 26 imagens em cores de sua viagem, no Departamento de Jornalismo e Editoração da Escola de Comunicações e Artes da USP.

No começo, apenas um médico e um assistente viajavam pelos rios, atendendo à população ribeirinha. O projeto cresceu e desde 1987 a ONG vem ancorando seu barco pelo menos uma vez por semana em 33 comunidades da região, mostrando a seus moradores como ficar livre de doenças, colocando, por exemplo, cloro na água para o consumo; fabricando uma multimistura, com vários grãos torrados, para combater a desnutrição (aliás, a ONG foi convidada a implantar essa técnica na Índia); como se organizar para conseguir fazer chegar na região uma estrada, um posto de saúde, uma escola; como se relacionar com outras comunidades (implantando uma rede de rádio); e ainda serviços de economia comunitária, como o beneficiamento de frutas – a região é rica nesse produto, assim como a mandioca, o milho e o feijão, mas produzidos apenas para subsistência dos moradores –; e na infra-estrutura de granjas. Além de informações, a ONG também leva alegria, montando, no final da estada em cada uma das comunidades, um circo, onde são apresentadas esquetes teatrais, com a participação dos próprios moradores. Um espetáculo lúdico e ao mesmo tempo didático. Há também um projeto de educação voltado para as crianças, em que um monitor coordena gincanas, cirandas e brincadeiras, além de oficinas de desenho.

Personagens – Em Piquiatuba, bem na beira do rio Tapajós, Monteiro encontrou Taumaturgo Neves, de 95 anos, um homem que conhece a selva como ninguém, contador de causos e lendas da região, uma tradição oral que hoje, infelizmente, está se perdendo por causa da grande evasão de jovens das comunidades ribeirinhas. Taumaturgo, que apesar da idade é pai de uma menina de 2 anos, de um menino de 4 anos, e de mais dez filhos, foi também quem fez a ponte entre o conhecimento natural das ervas e pós “mágicos” que curam os moradores da comunidade, e o conhecimento técnico que veio de fora com a chegada da ONG. Na comunidade de Santana de Ituqui, nas margens do rio Amazonas – uma das maiores da região, com cerca de 200 famílias –, o seu Francisco, pescador, faz dos consertos de redes, chamadas por eles de malhadeiras, um ritual. No primeiro dia, estende a rede no rio, no segundo, ela é retirada e de lá, os peixes; no terceiro, os furos deixados por piranhas e jacarés são consertados para então no dia seguinte voltar a se estender a rede.

Duas comunidades diferentes, mas com um modo de vida parecido. Nessas regiões chove todos os dias, sempre no meio da tarde, arrastando árvores e folhas pelos rios. A energia vem de geradores a diesel, que funcionam durante o dia e são desligados à noite. Banhos, só nos rios – o Amazonas, caudaloso, e o Tapajós, de água escura, são como um mar de água doce. O dia começa cedo, às cinco horas da manhã, geralmente com café e tapioca, feita da farinha de mandioca. A fruta principal, o açaí, e o prato, o peixe. O transporte, uma voadeira, lancha de motor na parte traseira, que em funcionamento projeta o bico para cima. Também há barcos de linha, assim como os ônibus, mas custam caro, dependendo de onde se quer ir. E principalmente, um povo que fica feliz com a chegada do barco da ONG, que por onde passa vai levando, literalmente, saúde e alegria.

CLAUDIA COSTA

A mostra será inaugurada nesta quinta e fica em cartaz até o final de novembro, com visitação de segunda a sexta, das 8h às 23h, no Espaço A.C. D’Ávila do Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA (av. Prof. Lúcio Martins Rodrigues, 443, Cidade Universitária). Gratuita.

Seu Francisco e o ritual de malhadeiras
 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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