Alunos do curso de Ciências Moleculares em aula: currículo
está estruturado em disciplinas de Matemática, Química,
Física, Biologia e Computação
Entrar na Universidade para cursar Letras e terminar
na pós-graduação do Instituto de Química
ou ingressar na História e doutorar-se em Física:
esses dois casos reais da USP têm em comum a passagem por
um curso que, apesar de estar apenas entrando na adolescência,
já coleciona números expressivos e histórias
de muitas vocações direcionadas para o trabalho científico
em profundidade. Trata-se da graduação em Ciências
Moleculares, que se prepara para selecionar sua 14ª turma,
consolidando cada vez mais sua proposta de multidisciplinaridade.
O grande atrativo do curso é a liberdade acadêmica,
diz a professora do Instituto de Biociências (IB) da USP Lucile
Winter, integrante da comissão diretiva do curso.
A criação do curso deu origem a uma história
bem-humorada envolvendo o reitor da USP no início dos anos
90, Roberto Leal Lobo e Silva Filho, e um de seus pró-reitores,
Erney Plessmann de Camargo. Conta-se que o físico Lobo comentou
com o biólogo Camargo que seria ótimo se os físicos
soubessem mais de biologia e vice-versa. Como ambos concordaram,
a pergunta seguinte passou a ser: Então por que não
fazer isso?. A partir daí, foi estruturado um currículo
baseado em disciplinas das áreas de Matemática, Física,
Química, Biologia e Computação. Os primeiros
dois anos do curso compõem o chamado Ciclo Básico,
quando o aluno completa 60% dos créditos para a obtenção
do bacharelado. O principal objetivo dessa etapa é o aprendizado
de conceitos básicos, visando ao conhecimento geral nas áreas
da ciência.
Os dois anos seguintes formam o chamado Ciclo Avançado. Nele,
o aluno tem um professor-orientador e inicia o desenvolvimento de
suas atividades científicas. Ao lado do orientador e com
aprovação de uma comissão coordenadora, o estudante
compõe seu próprio currículo, podendo escolher
as disciplinas que quiser cursar inclusive de pós-graduação
em qualquer unidade da USP. Esse é o conceito
de universidade, aproveitando toda a ciência e a riqueza de
pensamento que já temos aqui, diz a professora Lucile.
Cada aluno é único, sai com sua própria
cara, o que inclusive em termos de mercado é muito interessante.
Uma aluna formada em 2003, por exemplo, direcionou seu Ciclo Avançado
para a área de Matemática e na iniciação
científica pesquisou o trabalho do artista holandês
Mauritius Cornelius Escher (18981972), cursando disciplinas
até na Escola de Comunicações e Artes (ECA).
Perguntadores
Para ingressar em Ciências Moleculares, é preciso ser
aluno da USP, em qualquer curso (leia o texto ao lado). A habilitação
não é ligada a nenhuma unidade, mas sim diretamente
à Pró-Reitoria de Graduação. O corpo
docente também não é próprio, e as horas-aula
dadas ali contam na carga da unidade de origem do professor. Para
Lucile Winter, o fato de a classificação não
ser feita via vestibular, como nos demais cursos, garante
isenção tanto na escolha quanto na avaliação
do desempenho dos alunos. Os estudantes precisam dedicar-se
em tempo integral e não podem ser reprovados, sob pena de
desligamento. Essa decisão, entretanto, só é
tomada após realizada uma análise, caso a caso, por
uma comissão de professores. Caso o aluno desista ou seja
desligado, sua vaga permanece garantida na unidade de origem.
Atualmente são 44 os estudantes de Ciências Moleculares,
e já foram formados 67 bacharéis. Como o curso procura
encaminhar para o aprofundamento em pesquisa, a pós-graduação
acaba sendo um caminho natural. Cerca de 15 alunos oriundos da habilitação
já concluíram o doutorado, outros 30 estão
em andamento. Um dos formados virou professor no Instituto de Matemática
e Estatística (IME) da USP e cinco atualmente realizam pós-doutorado
no exterior. Outro número expressivo são os mais de
80 trabalhos publicados por egressos do curso em periódicos
indexados.
Para falar sobre o perfil do aluno procurado para ingressar em Ciências
Moleculares, a professora Lucile remonta às chamadas tendências
castradoras da educação, desde o ambiente familiar
até as salas de aula. As crianças têm
a fase de ficar perguntando por quê? o tempo todo,
e estão sempre mandando-as ficar quietas. O cientista é
aquele que escapa dessa castração e continua perguntando,
diz. Em nossa seleção, estamos cada vez mais
aprendendo a ver no aluno o potencial de querer descobrir e fazer
perguntas, característica de quem quer resolver problemas.
Como escreveu o filósofo francês Gaston Bachelard (1884-1962):
Crianças, éramos pintor, modelador, botânico,
escultor, arquiteto, caçador, explorador. E o que aconteceu
com tudo isso?.
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Lucile:
liberdade acadêmica |
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Gustavo:
apaixonado pelo curso |
Exemplo
O vírus da multidisciplinaridade e da liberdade
acadêmica faz com que os alunos de Ciências Moleculares
trilhem os mais distintos caminhos, inclusive retornando para uma
graduação. Uma aluna bacharelou-se e, ao mesmo tempo
em que entrou no doutorado em Matemática, ingressou via vestibular
na Faculdade de Letras. Outro também uniu o doutorado com
uma nova graduação, desta vez em Medicina. Formado
em 1999, Tiago Moreno Castilho havia ingressado no curso de Biologia
e transferiu-se já no segundo semestre. De forma geral,
o que mais me agradou e chamou a atenção foi o fato
de poder ter uma formação mais ampla, a flexibilidade
e a chance de me beneficiar bastante da possibilidade de cursar
disciplinas em várias unidades, afirma. Tiago, que
está no último ano de doutorado no Instituto de Ciências
Biomédicas (ICB), avalia sua experiência como bastante
positiva e recomenda que quem quiser uma formação
mais ampla em ciências deve no mínimo conhecer
o curso.
Para Gustavo Troiano Feliciano, que se forma no final do semestre,
sua escolha foi a melhor que poderia ter feito. Depois
de um ano e meio em Engenharia Naval na Escola Politécnica,
o interesse por uma formação multidisciplinar e pela
atuação em pesquisa falou mais alto e a facilidade
em Física e Matemática também ajudou. Antes
eu pensava mais em quanto poderia ganhar na minha profissão,
mas depois passei a ver que o aprendizado que tive aqui tem muito
mais valor do que um reconhecimento financeiro, avalia. Atualmente,
Gustavo trabalha no Instituto de Química (IQ) da USP com
simulação computacional de proteínas do sistema
imunológico e seus próximos passos serão dados
diretamente no doutorado, onde pretende explorar a nova área
da Biofísica. Eu me apaixonei pelo curso. Ele é
pioneiro e um exemplo a ser seguido por outras universidades,
afirma.
Em
junho, inscrições para
a próxima turma
A seleção para a 14a turma do curso de Ciências
Moleculares da USP terá suas inscrições
abertas de 7 de junho a 2 de julho. A prova escrita ocorre
no dia 3 de julho e as entrevistas serão realizadas
nos dias 6 e 7. A primeira etapa é uma prova de dez
questões, cujo conteúdo é o mesmo exigido
no vestibular. Os classificados são chamados para uma
entrevista com dinâmicas de grupo, de onde sairão
os 25 integrantes da nova turma. Cerca de 1.500 convites serão
enviados aos alunos mais bem colocados no último vestibular
da Fuvest. As inscrições, no entanto, são
abertas a todos os estudantes, independentemente do tempo
de curso e da unidade. Os alunos selecionados são matriculados
no curso de Ciências Moleculares por transferência
da unidade de origem, onde a vaga é mantida durante
quatro anos para o caso de desistência ou desligamento.
Um evento especialmente dirigido para que os alunos da USP
conheçam o curso de Ciências Moleculares será
realizado no dia 4 de junho, sexta-feira, às 14 horas,
no auditório do 1º andar do prédio da Fuvest
(ao lado do portão principal da USP). O programa terá
palestra com professores convidados e membros da comissão
diretiva do curso, além de apresentação
de trabalhos científicos por alunos e ex-alunos.
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