A
maior prejudicado pela greve nas universidades públicas paulistas
é o aluno, especialmente o da graduação. A
graduação é sempre a primeira prejudicada quando
muitas unidades param e isso não pode acontecer, disse
a pró-reitora de Graduação da USP, professora
Sonia Penin, para quem as discussões sobre salários
podem muito bem ser feitas sem greve. O pior de tudo no movimento,
segundo a professora, é a dificuldade de acesso aos locais
de trabalho e de aulas, provocada pelos piquetes dos grevistas.
Embora a greve seja um direito do trabalhador, lembra, as pessoas
também têm o direito à liberdade de escolha,
um valor básico da democracia. De qualquer modo, a pró-reitora
está segura de que, terminado o movimento (e já houve
paralisações mais longas do que esta até agora),
haverá negociações para recuperar o tempo perdido
e reposição das aulas com a mesma qualidade do ensino
em anos normais. Este é o ônus da greve: o compromisso
de garantir que a Universidade cumpra integralmente a sua tripla
missão de ensinar, pesquisar e prestar serviços de
extensão. Não pode nem passar pela cabeça de
alguém que na recuperação das aulas se deixe
cair a qualidade. Todos terão que trabalhar duro, nem que
seja nas férias, aos sábados e domingos. Se for necessário,
a recuperação avançará no semestre seguinte.
Alguns prejuízos já são evidentes, entre eles,
o atraso de unidades no envio dos relatórios anuais de reformulação
curricular planejamento e atualização de disciplinas
e cursos.
Ressaltando que vê a paralisação com grande
pesar e torcendo para que acabe logo, Sonia Penin lembra que, a
partir de agora, as negociações devem se limitar ao
âmbito do Cruesp, das próprias universidades, uma vez
que o lado externo a tentativa das representações
de professores e de alunos de conseguir na Assembléia Legislativa
o aumento do porcentual do ICMS destinado ao ensino superior público
já se definiu, com os deputados negando a pretensão.
Agora é trabalhar com as regras anteriores. E a pró-reitora
vislumbra uma luz no túnel: há indicações
de que algum aumento salarial poderá ser dado em outubro
deste ano e em janeiro do próximo, pelo menos como reposição
das perdas com a inflação no período. Sonia
destaca que até agora os reitores não propuseram nenhum
aumento, não por má vontade, mas por impossibilidade
orçamentária. E compara a situação com
o que aconteceu no âmbito federal: o presidente Luiz Inácio
Lula da Silva certamente gostaria de aumentar mais substancialmente
o salário mínimo, mas não pôde fazê-lo
por razões econômicas do País.
A pró-reitora não concorda com as críticas
que têm aparecido na imprensa à isonomia que deve vigorar
nas universidades públicas paulistas. Segundo Sonia, a correspondência
de salários nas três instituições sempre
trouxe mais vantagens do que prejuízos, especialmente
para a USP. É que a situação pode ser,
em determinado período, melhor em uma universidade do que
em outra, e se inverter em seguida. Nesse caso vale a solidariedade:
unindo forças vencem-se os obstáculos mais facilmente.
O que a pró-reitora não admite é que a greve
caminhe para a irracionalidade, e espera que tudo se resolva com
calma, competência e transparência.
Zona
Leste
A pró-reitora de Graduação da USP nega procedência
a notícias de que a greve esteja acarretando atraso na implantação
do campus da Zona Leste. Segundo ela, tudo está de acordo
com o cronograma inicial, tanto no aspecto das obras físicas
como das ações relacionadas com os cursos programados
e a contratação de professores. Mesmo a decisão
de adiar o início dos cursos voltados para as artes e a mídia
e o de música estava tomada antes da paralisação
dos professores e funcionários. Os outros dez projetos pedagógicos
terão início no primeiro semestre do próximo
ano. Nem a lei eleitoral, pela qual os órgãos públicos
estão proibidos de contratar servidores três meses
antes e três meses depois de eleições, prejudicará
a contratação de professores. O tempo necessário
para preparar e realizar os concursos é longo e as contratações
serão efetivadas em janeiro de 2005. E sem problemas, segundo
Sonia.
O novo campus não depende de recursos do orçamento
normal da Universidade. Para ele estão garantidos valores
extra-orçamentários, assegurados pelo governo do Estado
desde que se iniciou a política de expansão do ensino
superior público e gratuito em São Paulo. Recentemente,
o reitor Adolpho José Melfi informou que simulações
e cálculos indicaram que, mesmo que não houvesse recursos
extras para a USP Leste e as despesas corressem por conta do orçamento
anual, não pesariam mais que 0,2%.
O que pesa, e muito, nas contas das universidades oficiais, problema
que os reitores se empenham em resolver, são as aposentadorias
de professores e a manutenção dos serviços
de saúde que atendem não apenas a comunidade universitária,
mas também a população em geral. Embora ressalvando
que não poderia se manifestar formalmente sobre a matéria,
a pró-reitora de Graduação não deixou
de opinar sobre a importância dos hospitais universitários,
considerando-os fundamentais para os cursos de Medicina. Por serem
caros, poucas universidades particulares criam cursos de Medicina.
É certo que a universidade pública tem função
social e compromisso com a qualidade dos serviços prestados.
A discussão em curso é sobre até que ponto
ela pode e deve ir para sustentar esse serviço de dupla face,
interno e de extensão. O entendimento em torno do assunto
também enfrenta condições complexas, uma vez
que precisa se desenvolver com a participação de muitos
atores e em vários níveis: universidade, governo do
Estado, Assembléia Legislativa, governo federal e Ministério
da Saúde. A União entra nisso porque os hospitais
universitários são parcialmente custeados pelo SUS
(Sistema Único de Saúde). No caso do HU-USP, com cerca
de 1.800 funcionários, 75% do orçamento vem da própria
Universidade e o resto do SUS.
Diretores de alguns hospitais queixam-se da lentidão do governo
federal em reajustar os valores pagos pelo SUS, que há pelo
menos oito anos não teriam sido atualizados. Referindo-se
à proposta de orçamento federal para a saúde
para 2005 (R$ 14,6 bilhões para a assistência hospitalar
pública 4% a mais que no ano anterior), o presidente
da Associação Brasileira dos Hospitais Universitários
e Entidades de Ensino, Amâncio Paulino de Carvalho, declarou
recentemente à Agência Estado que os recursos são
insuficientes e o reajuste menor do que a inflação
projetada para o ano, de 9,5%. Outra queixa de diretores de HUs
é que uma parcela desse orçamento destina-se a outros
programas, como o Fome Zero e saneamento básico. Já
é uma dificuldade manter o orçamento; parece que virou
moda criar artifícios para tirar recursos da saúde,
disse o superintendente do HU-USP, professor Paulo Andrade Lotufo.
Para José Roberto Ferraro, superintendente do Hospital São
Paulo, da Universidade Federal de São Paulo, a proposta
de orçamento é muito ruim. Significa não encarar
o assunto saúde de forma correta. Hospitais paulistanos
declaram prejuízos: o Santa Marcelina, déficit de
R$ 60 mil diários; a Santa Casa de Misericórdia, déficit
de R$ 4 milhões por mês.
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