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e não fossem as imagens de Thomaz Farkas, German Lorca e Eduardo Salvatore, inúmeras cenas do cotidiano da cidade teriam se perdido. E a fotografia brasileira não teria documentado a nossa história com tanta força nem teria alcançado a dimensão da arte. Os três pioneiros apresentam momentos especiais de seu trabalho em três diferentes exposições. Farkas, 80 anos, e Lorca, 82, estão no Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, na Cidade Universitária,
e Salvatore comemora os seus 90 anos no Museu da Imagem e do Som (MIS)

Com as imagens que foram registrando desde meados da década de 30, Thomaz Farkas, German Lorca e Eduardo Salvatore revolucionaram a fotografia brasileira. Mostraram que as fotos têm a sua própria linguagem, registrando muito mais do que o fragmento de um tempo. São capazes de despertar emoções, de dar força à realidade e também aos sonhos. No jornalismo, podem registrar denúncias incontestáveis. E na arte brincam com as luzes e sombras.

“Se foto é arte? Não sei. São os outros que devem dizer. Acho que foto é foto. E pronto”, argumenta Farkas. Aos 80 anos, esse fotógrafo, professor e fundador do Laboratório de Fotografia da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP continua na expectativa de um novo momento, uma nova imagem. Ele está certo. A sua foto é foto. Como as incontáveis imagens únicas e decisivas que foi captando e capturando. O conjunto de telhas com que se deparou num dia qualquer de 1940 na rua, próximo de sua casa, surpreende e intriga. Como Farkas conseguiu tamanha proeza? “Sei lá como. Bateu o sol e a imagem estava ali. Eu nunca armo a situação. Tento, apenas, reproduzi-la.” As telhas se transformaram em uma seqüência de espirais. A foto passou a ter ares de gravura, que ele denominou de costelas de minhoca. “A fotografia é a minha vida. Através de cada foto, eu documento a minha vida”, revela.

Uma mostra do trabalho pioneiro de Farkas está no Anexo do Museu de Arte Contemporânea (MAC) da USP, na Cidade Universitária, integrando o evento Arte Jornalismo. O fotógrafo se apresenta com outros dois artistas que foram professores precursores do curso de Jornalismo da ECA: Antonio Costela e Hélcio Deslandes. A exposição homenageia os 70 anos da USP.
Farkas é também engenheiro formado pela Escola Politécnica da USP, doutorou-se em 1977 pela ECA e, como cineasta, viajou por todo o País realizando mais de 30 documentários. Recebeu diversos prêmios nacionais e internacionais. Nasceu em Budapeste, na Hungria, em 1924, veio para o Brasil em 1930 e naturalizou-se brasileiro em 1949. “Ganhei a minha primeira máquina fotográfica do meu pai. Tinha oito anos. Era uma maquininha bem vagabunda, mas eu brinquei bastante com ela.” Dessa brincadeira foi se formando o fotógrafo. “Acho que a técnica você vai desenvolvendo. Eu não sei se fotografar é um dom que nasce com a gente. Talvez seja. Você só precisa saber ver, saber excluir.”

Os pais de Farkas, Desidério e Tereza, fundaram a Fotóptica. “Naquela época, a fotografia era muito chata, intragável e antiquada. Queria fazer algo diferente.” Com German Lorca e Eduardo Salvatore, integrou, em 1939, o grupo que organizou o Foto Cine Clube Bandeirante. “Nós conversávamos muito”, lembra Lorca. “Quando apresentávamos as nossas fotos, ninguém entendia nada. Elas não eram bem aceitas nos concursos. Não existiam escolas, trocávamos experiências nos fotoclubes.”

As fotos de Farkas, Lorca e Salvatore provocavam discussões. Somavam, às cenas do cotidiano, o imprevisível da luz, de um gesto, uma expressão ou um movimento inesperado. Imagens que o olhar comum não consegue alcançar. “Quando comecei a fotografar, fui descobrindo um mundo diferente e uma nova forma de enxergar o mundo. Eu me apaixonei pelas linhas e formas dos objetos”, diz Salvatore. O burburinho ou a calma das ruas da cidade, o casal passeando de mãos dadas, um rosto na janela, um instante singular de uma partida de futebol... Os três pioneiros aliaram à técnica a criatividade, e conseguiram abrir um novo rumo para a fotografia brasileira, tanto no fotojornalismo como nas artes.

Técnica e criatividade

“German Lorca – A fotografia como visão” é a exposição lançada no MAC no dia 24 passado. Reúne 38 fotos produzidas entre o final da década de 40 e meados dos anos 70. “A mostra foi organizada em dois eixos: a cidade de São Paulo e a ressemantização do cotidiano”, explica a curadora Helouise Costa. “As fotos nos remetem não só a um outro tempo, mas principalmente a um modo de olhar o mundo, que caracterizou a visão modernista.”

Helouise observa que a exposição resgata o modernismo abdicando dos temas bucólicos e pictóricos da fotografia moderna, lançando-se com avidez sobre a cidade moderna. “A afirmação do caráter artístico passou a se dar na exploração dos atributos específicos da técnica fotográfica, centrada nas possibilidades significantes dos enquadramentos oferecidos pela câmera, e dos jogos de luz e sombra que só a fotografia é capaz de oferecer.”

German Lorca nasceu em 1922, é paulistano do Brás. No final da década de 40, trocou a contabilidade pela fotografia e, se não fosse a sua paixão, muitos ângulos da cidade ficariam sem memória. “Há vistas da cidade que registrei que não poderão ser refeitas de nenhum ângulo. São irrecuperáveis”, diz. Lorca foi o fotógrafo oficial do Quarto Centenário de São Paulo. “A vista da Faculdade de Direito não é mais a mesma. Também o prédio de onde fotografei foi demolido.” Lorca foi um dos primeiros fotógrafos brasileiros a ganhar espaço no circuito dos museus de arte no Brasil. Em 1952, fez uma exposição individual no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo, no ano seguinte expôs na Sala Especial de Fotografia da 2a Bienal de São Paulo, organizada por Geraldo de Barros, e, em 1967, integrou a 9a Bienal Internacional de São Paulo, quando, pela primeira vez, a fotografia foi admitida oficialmente nesse evento.

Às vésperas de completar 90 anos, Eduardo Salvatore é homenageado no Museu da Imagem e do Som (MIS) com a exposição “Eduardo Salvatore – Uma sensibilidade revelada”. Sob a curadoria de Fernando Durão, faz uma retrospectiva de 1940 a 1980 através de uma seleção de 100 fotos.
Salvatore, formado pela Faculdade de Direito da USP, começou a fotografar em 1937. Até a década de 70, tem seu trabalho marcado pelo grafismo e pela geometria, em preto-e-branco. Passa a fazer fotos coloridas no final dos anos 70 e 80. Foi presidente do Foto Cine Clube Bandeirante até 1990 e atualmente é presidente do Conselho.

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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