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o início, as brincadeiras de rua gravadas e difundidas através do rádio. Depois, o surgimento do samba como gênero musical, na década de 30. E em seguida, sua herdeira, a bossa nova, sem exageros na melodia ou na letra. Na seqüência, o tropicalismo que, ao contrário, era uma mistura de gêneros e dicções – nacionais e estrangeiras, vulgares ou elitizadas, do passado ou do momento, sem suportar qualquer exclusão –, incorporando letras engajadas ao movimento estudantil dos anos 60. E mais tarde, na última década, a convivência entre gêneros e estilos diversificados em composições cantadas em português, demonstrando que o consumo da música norte-americana havia se findado. Tudo isso exemplificado com ícones da música de cada época. Luiz Tatit, professor do Departamento de Lingüística da USP, percorre todo o caminho da música no século 20, analisando seu desenvolvimento em O Século da Canção, que acaba de ser lançado.

“Os cem anos foram suficientes para a criação, consolidação e disseminação de uma prática artística que, além de construir a identidade sonora do País, se pôs em sintonia com a tendência mundial”, escreve Tatit no texto de apresentação, deixando claro que é apenas uma das muitas leituras do que foi o século 20 para a canção brasileira já que traz um ponto de vista seletivo, que talvez suscite outras (re)leituras.

A obra é dividida em duas partes. Leitura Geral é um apanhado dos acontecimentos que tiveram papel importante no desenvolvimento da canção brasileira em três capítulos: A Sonoridade Brasileira, com alguns antecedentes históricos; O Século XX em Foco, que concentra-se no surgimento do cancionista brasileiro, examinando ainda a fase moderna da canção nacional, especialmente a bossa nova e o tropicalismo; e o último, A Triagem e a Mistura, que sintetiza a leitura dos cem anos da canção. Na segunda parte, intitulada Detalhamento, são reveladas as tendências mais importantes que deram origem à produção artística e comercial das obras, reinterpretando circunstâncias históricas e analisando as condutas inscritas em algumas canções exemplares, em cada época, na relação da melodia com a letra.

A trajetória da música

Os primeiros sons mostram uma fusão das práticas nativas com a atividade doutrinária dos jesuítas portugueses: de um lado, a música de encantação dos índios, mais rítmica que melódica, embalada pela percussão e sopro rudimentares (apitos, gaitas, flautas de madeira); do outro, hinos católicos de celebração e catequese, mais melódicos que rítmicos, ressoando o canto gregoriano, mas também com cantos coletivos de lazer que beiravam o profano. Já em meados do século 18, assistia-se à “cancionalização” dos batuques africanos; o estalar dos dedos, típico do fandango ibérico e a introdução de acompanhamento de viola, marcas da influência branca e da transformação quase total dos rituais negros em música para diversão, o que ficou conhecido como lundu, e foi difundido através de pequenas peças cômicas.

No século 19, seresteiros e modinheiros cantavam declarações lírico-amorosas. Nascia o “canto falado”, dando margem ao teatro musicado, às operetas ou mesmo às grandes óperas.


Rumo ao século 20, a canção popular desvincula-se da música erudita que, na década de 30, mantinha o nacionalismo nas composições de Camargo Guarnieri e, com outra feição, em Guerra Peixe. Mas com a chegada do compositor e flautista alemão H. J. Koellreutter ao Brasil já no final de 1930, interessado na expansão massiva da música popular, a que chamava de “música funcional”, criou-se um movimento denominado música viva, com a participação de compositores como Cláudio Santoro e Edino Grieger.

Aliás foi Koellreutter quem abriu caminho para o que depois ficou conhecido como música nova (instituída na década de 60, com participação de Júlio Medaglia, Willy Corrêa de Oliveira e Gilberto Mendes, entre outros) e música eletroacústica, desenvolvida especialmente pelo carioca Jorge Antunes, e que através do uso da tecnologia evoluiu muito nas últimas décadas como pode ser visto em trabalhos de Tato Taborda, Livio Tragtenberg e Flo Menezes. O divórcio entre o mundo musical erudito e o mundo cancional se aprofundou no decorrer desse período até que, no final dos anos 90, surgiram iniciativas de aproximação de ambas as sonoridades. Mas, como Luiz Tatit escreve no livro, um fato tornou-se então mundialmente incontestável: quando se falava em música brasileira, pensava-se logo em canção.

O Século da Canção, de Luiz Tatit, é uma publicação da Ateliê Editorial, tem 251 páginas e custa R$ 32,00. Alguns capítulos ou trechos do trabalho já foram publicados em obras coletivas, revistas, jornais e sites eletrônicos.

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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