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Torquato: eleitor está mais racional

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


A professora Raquel Rolnik: "A eleição em São Paulo não está
sendo polarizada pelas diferentes propostas dos candidatos para a cidade"

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 












José Serra: candidato congrega a aposição à atual administração




 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


Marta Suplicy: aprovação de
seu governo não se transforma necessariamente em votos,
diz especialista

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 



A
nalistas da área de ciências políticas concordam: as eleições municipais deste ano tendem a restabelecer o equilíbrio político no País. Sobretudo se o PT, que cresceu nacionalmente, perder em capitais como São Paulo e Porto Alegre, como já perdeu no Rio de Janeiro. A falta de consenso se manifesta, porém, quando se toca na questão da concentração de forças em apenas dois partidos, o próprio PT e o PSDB. “Não creio que o quadro para 2006 (eleições presidenciais) esteja definido num sentido ou outro. Ainda há muita água a rolar sob a ponte. Mas, neste momento, é inegável que existem riscos para o pluripartidarismo político, e nesse sentido as eventuais vitórias do PSDB, assim como a do PFL no Rio de Janeiro, são positivas”, afirma o cientista político Bolívar Lamounier. Gildo Marçal Brandão, do Departamento de Ciência Política da USP, discorda: “Não há bipartidarismo, há polarização. Nenhum partido tem mais de 20% do eleitorado brasileiro. A estrutura federativa, combinada com o voto proporcional, praticamente impede o bipartidarismo”. Segundo Brandão, PT e PSDB são partidos orgânicos, têm quadros e programas, ao contrário do PMDB, uma federação que segue a lógica da política brasileira: saiu da esquerda para ir para o centro e se perdeu, embora ainda mantenha profundo enraizamento no País. Quanto ao PDT, obteve até resultado razoável depois da morte do líder Leonel Brizola; mas o PC do B pagou caro pelo atrelamento acrítico ao PT e está depauperado. O PFL, forte no Rio de Janeiro com César Maia, estaria condenado a se atrelar ao PSDB. Gaudêncio Torquato, professor de Jornalismo da Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, especializado em comunicação empresarial e marketing político, entende que o PT cresceu nas eleições de primeiro turno e contribuirá para equilibrar o quadro político. Se perder a Prefeitura de São Paulo, o PSDB lançará a candidatura do governador Geraldo Alckmin para presidente da República. Será uma disputa acirrada cujo desfecho se definirá pela situação econômica do País. “Se a economia for bem, a ponto de oxigenar os pulmões sociais, certamente Luiz Inácio Lula da Silva terá condições de se reeleger. Se o oposicionismo crescer com a contrariedade social, Lula poderá dar adeus.”

Sobre alianças, o professor Lucio Kowarick, também do Departamento de Ciência Política da USP, diz que existem algumas difíceis de entender. Uma delas é a de São Paulo, entre a candidata Marta Suplicy, do PT, e Paulo Maluf, do PP. “O malufismo é tradicionalmente força política personalizada e situada no espectro conservador, de origem próxima do primeiro andar da ditadura. Maluf é a expressão dela. Não só ele; há muita gente próxima do governo na mesma situação.” Kowarick distingue vários PTs: “O dos anos 80 e 90 e o de 2002 para cá. O PT dos anos 80 ainda existe no PT de 2002. Um terço dos deputados, senadores e militantes tem referência nos anos 80, ainda ligados aos anos 70, do tempo de São Bernardo (base sindical em que Lula firmou sua liderança). Houve uma virada significativa. Se governar é preciso, fazer alianças é preciso também, mas algumas são muito contrárias ao que foi dito nos anos 80. A aliança com Maluf é o exemplo disso”. Conclusão do professor: “A aproximação com o malufismo, para quem tem referências dos anos 80, é algo intragável”. Lamounier não se distancia dessa opinião: “A aliança PT-Maluf é de uma incoerência clamorosa, não só à luz da história política de São Paulo e do Brasil, mas à luz das próprias acusações que a campanha de Marta faz ao PSDB por ter Kassab como vice de José Serra. Como explicar isso? Não sei. Limito-me a constatar que, de uns tempos para cá, o PT não prima pela coerência”. Menos severa, a professora Maria D’Alva Gil Kinzo, do mesmo departamento de Kowarick, entende que as alianças seguem a lógica da eleição majoritária em um quadro partidário fragmentado. São necessárias, senão para ajudar, pelo menos para evitar que ajudem o adversário. “Daí que há lógica na aliança de Marta com Maluf: evita que ele apóie Serra e assim carreie ainda mais votos dos malufistas a essa candidatura, que por sinal já conta com a tendência maior de apoio por parte do eleitorado que votou em Maluf.” Outro professor da USP e do departamento, Eduardo Kugelmas, afirma que o sistema de dois turnos praticamente força alianças, “porque o contingente de eleitores é o objeto de desejo dos candidatos”. Na sua opinião, o PT com Lula no poder “marchou resolutamente para o centro, desconcertando analistas e até outros integrantes do partido. Na construção da maioria vale até aliança com Maluf”.

Avaliação

É bom conhecer a análise que faz da política paulista e nacional Gaudêncio Torquato, que, junto com Gileno Marcelino, foi homenageado segunda-feira (18), no auditório do MAC, como destaque entre os primeiros professores do Departamento de Jornalismo e Editoração da ECA. O eleitor, explica ele, avalia a política de duas formas: examinando a qualidade dos administradores e da administração. Nem sempre esses pólos são convergentes. Pode haver administração exemplar e ao mesmo tempo o perfil do administrador se situar muito aquém de seu governo. No caso específico de São Paulo, o índice de aprovação da administração de Marta, em torno de 48% segundo pesquisa do Data Folha, não reverte necessariamente em votos. Isso ocorre, segundo o analista, porque o eleitor está olhando também para alguns valores individuais. Na candidata do PT o professor identifica “valores” que estariam sendo rejeitados pelo eleitor, que não eram claros na primeira eleição porque a então candidata ainda não tinha exposição pública suficiente. Três anos e pouco depois, a visibilidade tornou-se maior, o eleitor percebeu esses valores, distinguiu-os e fez comparações. “Acho que no caso de Marta”, diz Torquato, “pode ter ocorrido uma questão de foro íntimo, pessoal, a separação dela do marido, senador Eduardo Suplicy. Isto é muito sensível. O eleitor brasileiro age em alguns momentos de maneira tradicional. Marta é uma pessoa independente, uma psicóloga que nunca pôs a sua vida pessoal sob o foco da política. O fator pessoal tende a influenciar o fator político”.

E o perfil de Serra? Torquato não considera o candidato do PSDB um exemplo de simpatia. “É até muito antipático, porém congrega o oposicionismo à administração municipal e até o conjunto de forças na área federal.” Torquato lembra que Serra já foi derrotado algumas vezes, quando candidato a prefeito da capital pela primeira vez e, depois, à Presidência da República. “O político precisa ter em conta esses fluxos cíclicos. Em algum momento poderá ficar embaixo, outras vezes em cima. Desta vez, Serra é a bola da vez. Está carreando a contrariedade social e transformando-a em votos.”

O professor aposentado da ECA admite que Marta tem na área da saúde seu ponto fraco, e Serra o ponto alto, mas na esfera federal. “Inteligentemente, a campanha de Serra aproveita no campo municipal esse aspecto positivo, de ele ter sido bom ministro da Saúde. São realidades diferentes, porém a comparação que está sendo feita pelo eleitor é de perfis – o perfil de um bom administrador da saúde e o de um mau administrador.” A reação da candidata do PT foi apresentar uma maquete de CEU da Saúde que, na opinião do professor da ECA, não caiu bem no gosto do eleitorado, porque está muito “marquetizada”. Palavras de Torquato: “Eu diria que essa invencionice de Duda Mendonça pode ser um bumerangue, um tiro no pé”.

Sobre a aliança de Marta e Maluf, Torquato diz que o eleitorado está cada vez mais racional e menos maria-vai-com-as-outras. Maluf pode ir para um canto e o eleitor dizer “peraí, nós passamos o tempo todo combatendo o PT e agora devemos apoiar a sua candidata? Assim não dá”. Tanto é assim que as pesquisas mostram que 75% dos seguidores de Maluf não votariam em Marta em hipótese nenhuma. “Pior ainda”, acrescenta o analista. “Acho que o momento da aliança foi mal escolhido, em razão da crítica que vem sendo feita ao comportamento ético do ex-governador. Maluf é visado pelo Ministério Público e sua imagem negativa contribui para o mau desempenho da prefeita na campanha.”

O especialista em marketing político analisa a campanha dos dois candidatos à Prefeitura paulistana desse ponto de vista. “O marketing de Serra tem se conduzido por uma visão mais altaneira, mais equilibrada; o da Marta me parece muito agressivo, provocativo. Agora mais ainda com essas mensagens sobre o vice Kassab. O leitor percebe que é jogada. Temo que, em vez de ajudá-la, a esteja prejudicando.”
Dito assim, parece que os analistas dão como certa a derrota do PT em São Paulo. Mas não é bem assim. “Acho difícil alguma reversão a essa altura, mas não quero apostar. Em política ocorrem muitas surpresas”, resume Lamounier. Kugelmas condiciona a reversão da tendência a algum fato muito importante, que não está à vista.

A cidade

Distante da polêmica e muito ocupada em Brasília para acompanhar os debates em São Paulo, a professora Raquel Rolnik (PUC-Campinas), arquiteta e urbanista formada pela USP e secretária nacional de Programas Urbanos do Ministério das Cidades, torce pela capital paulistana e lamenta que na campanha eleitoral não esteja sendo suficientemente considerado “o processo real de transformação da cidade com Marta”. Ela insiste que a transformação é indiscutível: a cidade teve nos últimos três anos a presença constante da Prefeitura; cuidado com a limpeza, preocupação com o espaço integral, não apenas com partes, e uma transformação em alguns aspectos pouco visível, como a mudança para melhor da gestão nas subprefeituras. “A eleição não está sendo polarizada pelas diferentes propostas dos candidatos para a cidade”, afirma a professora. “O projeto de quatro anos da Marta ninguém questiona. Aceita. Os destaques são para os transportes, setor que ficou 20 anos discutindo e só agora teve uma solução, e para a revitalização do Centro, que renasce após 15 anos de planos”. Raquel Rolnik avisa que a sua manifestação é apenas de reconhecimento por um trabalho realmente realizado na capital paulista.
A verdade é que a campanha eleitoral vem misturando temas da cidade com questões estaduais ou n
acionais. A isso a professora Maria D’Alva responde que cada candidato lança mão dos recursos que mais o favorecem ou que servem para fragilizar o adversário. “No caso de Serra, tratava-se de centrar as críticas nos problemas da administração Marta, especialmente na questão da saúde, na pouca abrangência de algumas políticas sociais, como a da educação, e na alocação de recursos do orçamento. Serra tem domínio sobre esse tipo de temática, de forma que se saiu bem (nos debates) ao questioná-la sobre isso. No caso de Marta, tratava-se de salientar suas realizações na periferia, que é onde ela teve maior apoio eleitoral, e de desconstruir a boa performance de Serra como ministro da Saúde, associá-lo às mazelas do governo Fernando Henrique Cardoso, além de salientar a questão do vice – sua ligação com Pitta (ex-prefeito).”

 

Os pés pelas mãos

Como analisar o caso de Fortaleza, onde o PT oficial apoiou, no primeiro turno, o candidato do PC do B contra a candidata do próprio partido Luizianne Lins? Será que o PT, tão rigoroso com os seus membros no Congresso Nacional, a ponto de expulsar de suas fileiras quem se rebela publicamente contra a orientação dos líderes nas votações, teria dado no Ceará um exemplo de “infidelidade partidária”? Gaudêncio Torquato acredita que o partido simplesmente errou ao fazer a análise estratégica em Fortaleza. A cúpula não acreditava na possibilidade da candidata; se acreditasse, a teria apoiado desde o primeiro momento. “Tenho a impressão de que se arrependeu e agora está dando a sua contribuição para que Luizianne vença. Foi uma das análises mais mal-feitas pelo PT no País”, conclui o professor. O mesmo pensa Bolívar Lamounier: “Um erro gritante de avaliação, que colocou a direção nacional do PT numa situação no mínimo curiosa”.

Eduardo Kugelmas distingue os casos do Congresso Nacional e da capital cearense. A senadora Heloísa Helena e outros parlamentares foram punidos porque não votaram com a orientação oficial do partido; em Fortaleza, o Diretório Nacional decidiu dar apoio ao outro candidato por razões que só as circunstâncias locais podem explicar. De qualquer modo, houve uma vitória das bases contra a cúpula do partido. Esse é também o ponto de vista do professor Gildo Marçal Brandão: “As conveniências levaram o partido a meter os pés pelas mãos. A moça resolveu bancar o jogo da morte. E ganhou contra todos. Luizianne venceu os caciques da cidade (entre eles Ciro Gomes) e o próprio PT oficial”.

Maria D’Alva Gil Kinzo tem a sua versão: o PT tornou-se um partido bastante pragmático na definição de seus apoios. “Havia a necessidade de apoiar o candidato do PC do B, mesmo porque a candidatura de Luizianne representava uma outra corrente no partido (demasiado radical para a lógica predominante no PT hoje). Além disso, era uma candidatura que não parecia ter condições de decolar. Logicamente que agora o PT tratará de apoiá-la e de computá-la como uma vitória do partido, caso a eleição de Luizianne de fato ocorra.”

Para Lucio Kowarick, tratou-se de uma questão de geografia política: assuntos regionais respondem à lógica das alianças nacionais. O PC do B é partido do governo, tem função importante no Executivo. A necessidade de governar leva a barganhas. “Mas esse
não é o caso de Fortaleza”, avisa – ele que, embora reconhecendo que a fidelidade partidária tem regras, achou absurda
a expulsão do PT da senadora Heloísa Helena, “a sua mais autêntica militante”.

 

 

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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