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Wangari
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O
ambiente como causa social
A
ambientalista queniana Wangari Maathai ganhou o Prêmio
Nobel da Paz de 2004 por seu trabalho em prol do desenvolvimento
sustentável, da democracia e da paz em seu país.
É a primeira mulher africana a receber a premiação.
Vice-ministra do Meio Ambiente do Quênia e responsável
por projetos de reflorestamento no país, Wangari lidera
o Movimento Cinturão Verde, no Quênia, responsável
pela plantação de mais de 30 milhões
de árvores na África.
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Para
o Comitê Nobel de Oslo, Wangari está à
frente da luta para promover o desenvolvimento ecológico
que seja viável social, econômica e culturalmente,
no Quênia e na África. Segundo depoimento de
Wangari concedido à TV estatal norueguesa, o
ambiente é muito importante para a paz porque, quando
nós destruímos nossos recursos e eles ficam
escassos, nós lutamos por eles, provocando guerras,
esclarece.
Para Waldir Mantovani, presidente do Programa de Pós-Graduação
em Ciência Ambiental (Procam) da USP e professor do
Instituto de Biociências, as questões ambientais
extrapolam as dimensões que as pessoas normalmente
enxergam. O ambiente é um espaço partilhado
por todos e isso faz com que ninguém tenha consideração
por esse espaço e não pense em preservá-lo.
O professor acredita que, quando as pessoas tiverem consciência
de que o ambiente é de todos e que todos devem respeitá-lo,
implicitamente estará acontecendo o respeito ao próximo.
Vivemos hoje um movimento contrário. O que é
de todo mundo não é de ninguém.
Mantovani explica que Wangari Maathai é uma mulher
que tem um papel fundamental na luta pela paz, uma vez que
suas atividades extrapolam a questão ambiental. Incentivando
o plantio de árvores, Wangari busca valorizar atividades
desempenhadas pela mulher na sociedade queniana, que tanto
discrimina e desvaloriza o papel social feminino. Ela organiza
as mulheres para terem uma função social. Com
isso, protagoniza o resgate da cidadania.
Wangari vê o ambiente como um espaço partilhado.
Isso faz com que ele passe a ter uma dimensão que extrapola
a função ambiental propriamente dita. Quando
as pessoas lutam pela melhora do ambiente, ele passa a se
inserir também na luta pelas questões sociais.
Discutir o ambiente gera uma discussão de direito,
de melhoria de qualidade de vida, de cidadania, acrescenta
o professor.
Mantovani diz ainda partilhar do mesmo pensamento da queniana
quando esta afirma que muitas guerras no mundo são
travadas por recursos naturais. Enquanto grandes potências
exploram os recursos da natureza gerando grandes riquezas,
para a maioria da sociedade fica o ônus da recuperação,
da devastação. Há uma apropriação
equivocada do ambiente. Tira-se tudo e não se repõe.
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Elfriede
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O
caráter transformador da língua
em
1967. A professora Eva Maria Ferreira Glenk, que leciona Língua
e Literatura Alemã no Departamento de Letras Modernas
da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
(FFLCH) da USP, conta que a escritora é certamente
a autora mais polêmica e irreverente no cenário
atual da literatura austríaca. Com uma vasta
obra literária de feroz crítica à Áustria
e à hipocrisia da sociedade e uma atuação
política implacável, ela
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faz oposição ao governo atual e não poupou
governos anteriores. É festejada por alguns e violentamente
rejeitada por outros, ressalta. A autora, segundo Eva,
põe o dedo numa ferida aberta ao denunciar
a opressão nas relações entre os indivíduos,
flagelando a sociedade. Nada escapa à sua ira.
Sua necessidade de encarar a verdade de maneira impiedosa
incomoda profundamente.
Será a literatura de Elfried um reflexo da sociedade
em que vive? Para Eva, embora a obra apresente traços
de experiências próprias pai doente, mãe
opressora, doença psíquica, uma infância
infeliz por causa das exigências exageradas em relação
aos estudos, a experiência de um país um tanto
distante de seus ideais políticos , é
preciso compreender que a sua visão e sua crítica
transcendem um país concreto, um governo particular.
Se ela vivesse em qualquer outro país do mundo,
a sua crítica seria tão feroz quanto é
agora. Mas, devido ao engajamento político e
às posturas públicas que ela assume, a literatura
que faz às vezes é confundida com uma espécie
de anti-heimatliteratur: uma literatura que não
procura engrandecer e sim diminuir a pátria, porém
tão centrada e limitada quanto aquela. Isso seria
uma visão injustamente limitante da obra de Elfried,
considera Eva. A escritora é uma farejadora dos
excessos da sociedade. Toma uma determinada sociedade como
paradigma e usa uma lente de aumento nas feridas infectadas,
proporcionando uma visão às vezes grotesca,
distorcida, porém sempre mortalmente séria,
reflete Eva.
Elfried constrói sua obra valendo-se de uma linguagem
que não deixa pedra sobre pedra, diz Eva. Evoca
os estereótipos e clichês inscritos na língua,
que influenciam nosso pensar e nosso agir, e os desconstrói,
fazendo explícito o implícito. Ela percebe e
se utiliza com toda lucidez do caráter transformador
da língua que de um lado é reflexo de
uma sociedade e, de outro, a influencia, sendo, portanto,
movida e motor ao mesmo tempo, transformada e transformadora,
apoderando-se das estruturas lingüísticas estereotipadas
que, cristalizadas, veiculam os padrões de ação
e pensamento. Ela as toma e as rasga, as modifica, revelando
seu poder, sua verdade e seu veneno embutidos, mostrando o
absurdo do discurso vigente. O resultado desse tratamento
é uma obra polifônica com inegável qualidade
musical, acrescenta a professora.
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Kydland
e Prescott
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Mercados
e ciclos empresariais
Finn
Kydland, Universidade da Califórnia, e Edward Prescott,
da Universidade do Arizona, nos Estados Unidos, receberam
o Prêmio Nobel de Economia 2004 por fazer avançar
os estudos da macroeconomia dinâmica ao desenvolverem
duas teorias que transformaram o rumo das pesquisas, das análises
e das práticas político-econômicas. Uma
delas é a teoria da inconsistência no tempo e
a outra, das forças que movimentam os ciclos empresariais.
A primeira, publicada em 1977, está ligada à
habilidade de o governo efetivamente implementar as medidas
que anuncia como políticas ótimas
para determinado momento, ou seja, positivas para a economia.
A professora Fabiana Rocha, do Departamento de Economia da
Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade
(FEA) da USP, dá um exemplo didático do significado
da teoria da inconsistência no tempo: Se digo
para meu filho comer toda a comida porque depois ele vai ganhar
um pirulito e ele não come e mesmo assim eu dou o pirulito,
perco a credibilidade e também crio nele uma expectativa
de um comportamento inconsistente. Assim funciona a teoria
da inconsistência no tempo, variável que influi
fortemente nos resultados macroeconômicos.
Aplicada à política estratégica do Banco
Central, a teoria da inconsistência no tempo pode influir
nos rumos de inflação e emprego, por exemplo.
Assim, se o BC promete uma política monetária
apertada, com juros altos para conter a inflação,
mas os agentes econômicos sabem que o BC na verdade
tem incentivos para aplicar uma política monetária
frouxa, de inflação alta, com vistas à
geração de empregos, o setor privado vai rever
suas expectativas de acordo com essa inconsistência
e vai esperar uma inflação mais alta. Dessa
forma, a economia não terá os resultados esperados
em ganhos de produtividade e emprego. O resultado desse
comportamento inconsistente é gerar um viés
de inflação sem ganho de produtividade,
diz Fabiana.
Uma forma de conter esse viés de inflação,
diz a professora, é aumentar o custo de o governo ser
inconsistente no tempo, através de uma regra de targeting,
ou seja, de meta de inflação. As metas
de inflação devem ser claras para toda a sociedade
e o BC tem de segui-las. O governo brasileiro adota esse mecanismo
a fim de aumentar o custo de o BC ser inconsistente no tempo,
tanto que atualmente os mercados consideram consistente o
comportamento do BC.
A regra de targeting é uma forma de otimizar os objetivos
macroeconômicos e o resultado disso é um aumento
na credibilidade do governo. O conceito da credibilidade
não aparecia assim de forma tão clara nas análises
econômicas. A idéia toda reflete, na verdade,
um jogo dinâmico entre setor privado e governo e está
ligada às estratégias de política econômica.
Num outro estudo, publicado em 1988, a dupla de economistas
concebeu a teoria da flutuação dos ciclos reais
de negócios, ou dos ciclos empresariais, segundo a
qual as economias são concebidas como um conjunto de
relações de mercado que se aproxima do paradigma
da concorrência perfeita e sujeito às perturbações
por choques, especialmente os de natureza tecnológica.
Assim, as flutuações cíclicas são
uma resposta ótima da economia a esses choques. O
conceito retoma a linha do laissez-faire, ou da liberdade
dos mercados. Nessa visão, os moldes concorrenciais
já seriam suficientes para explicar os fenômenos
econômicos. O que tem de novo no modelo é a contribuição
metodológica. Eles desenvolveram um instrumental de
análise que permite aos economistas estudar os problemas
de flutuação cíclica de negócios
reais, utilizando um núcleo de equilíbrio geral,
diz o professor da FEA Márcio Issao Nakane.
O novo método de análise das flutuações
econômicas se contrapõe à visão
keynesiana difundida especialmente após a Depressão
de 30. Nas análises macroeconômicas do período
pós-guerra, as flutuações de curto prazo
nos níveis de produtividade e emprego eram atribuídas
principalmente às variações na demanda
agregada, nas expectativas de investimento e na disposição
ao consumo. Nessa visão, a estabilização
macroeconômica podia e deveria, sistematicamente, controlar
a demanda agregada, a fim de evitar flutuações
recorrentes na atividade produtiva. Tais idéias refletiam
a experiência da Grande Depressão dos anos 30,
quando caíram a produção, o nível
de emprego e o investimento, fenômenos esses interpretados
como falhas do mercado na estabilização de oferta
e demanda. Esse desequilíbrio forneceu óbvios
motivos para intervenções estatais naquela fase,
especialmente nos Estados Unidos e Europa. Ou seja, os choques
e turbulências seriam explicados pela imperfeição
dos mercados, pois os keynesianos não acreditavam no
funcionamento ótimo dos mesmos.
Até meados dos anos 70, as teorias keynesianas eram
relativamente bem-sucedidas na explicação do
fenômeno da flutuação macroeconômica.
Mas os fatos pós-anos 70 demonstraram sérias
falhas nessas teorias, já que elas não podiam
explicar o novo fenômeno da simultaneidade da inflação
e do desemprego. A chamada estagflação parecia
muito ligada aos choques na oferta, como, por exemplo, quando
os preços do petróleo não paravam de
subir e ao mesmo tempo ocorria uma desaceleração
do crescimento econômico mundial. Tais choques de oferta
tinham desempenhado apenas um papel secundário nas
teorias keynesianas.
Prescott e Kydland argumentam que os períodos temporários
de baixo crescimento econômico não são
necessariamente o resultado das imperfeições
de mercado, mas podem ser interpretados simplesmente como
um reflexo da baixa produtividade na área tecnológica.
Com a teoria dos ciclos empresariais, os laureados demonstraram
como as variações no desenvolvimento tecnológico
considerado a principal fonte de crescimento econômico
a longo prazo podem levar a flutuações
de curto prazo.
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Axel
e Linda
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Os
genes dos cheiros
Este
ano, o Prêmio Nobel de Medicina e Fisiologia foi concedido
aos norte-americanos Richard Axel, da Universidade de Columbia,
em Nova York, e Linda Buck, do Fred Hutchinson Câncer
Research Center, em Seattle, por suas pesquisas para desvendar
os mistérios do funcionamento do olfato. Com estudos
pioneiros, os pesquisadores descobriram uma família
de genes responsável pela codificação
dos diferentes receptores olfativos, possibilitando o entendimento
de como os odores atuam no corpo humano.
O médico otorrinolaringologista e professor colaborador
da Faculdade de Medicina da USP João Ferreira de Mello
Júnior explica que os estudos sobre a olfação
sempre foram muito difíceis, pois envolvem uma questão
subjetiva. Para fazer essa pesquisa, é preciso
tirar a subjetividade do sentido. Sendo assim, a melhor saída
é estudar através da eletrofisiologia, embora
esta apresente outras dificuldades, explica Mello Júnior.
A forma como os cheiros são percebidos não era
bem conhecida pelos cientistas antes do trabalho de Axel e
Linda, conta Mello Júnior, daí a razão
por que o Nobel foi dado aos dois pesquisadores, que se dedicaram
a desenvolver uma ampla e original pesquisa sobre o tema.
Os pesquisadores identificaram um grupo de aproximadamente
mil genes que governam a captação de odores
e que, no final, permitem diferenciar o cheiro de uma comida
boa do de uma estragada, por exemplo. Cada gene codifica uma
proteína receptora específica, presente na membrana
dos neurônios, que ficam expostos ao ar dentro do nariz.
Em contato com um odor específico, esses receptores
enviam um sinal para o cérebro, que processa a informação
e identifica o cheiro. Os receptores são capazes de
reconhecer as cerca de 10 mil substâncias aromáticas
conhecidas.
O receptor olfativo pertence a uma família denominada
receptor de proteína G. Segundo Mello Júnior,
tal receptor é bastante comum no corpo humano, podendo
ser encontrado em vários outros órgãos.
Esses receptores são semelhantes aos do sistema
nervoso autônomo, responsáveis por vários
reflexos e diferentes funções fisiológicas,
como tosse, rinorréia, coriza e regulação
da pressão sanguínea, entre outras. Cada receptor
está ligado a um pequeno grupo de odores, o que representa
uma especificidade muito grande.
Vários de nossos reflexos, no fundo, são conseqüência
da ação de determinado mediador sobre receptores
de proteína G. O conhecimento de que esses receptores
são semelhantes sugere que todos se desenvolveram de
um receptor original, tornando-se levemente diferentes quando
evoluíram.
Os receptores olfativos são moléculas que funcionam
como fechaduras químicas no sistema nervoso. Quando
em contato com o odor capaz de ativá-los, transmitem
essa informação ao sistema nervoso central.
Nossas características físicas e fisiológicas,
bem como as doenças, são conseqüências
da combinação da ativação ou inativação
de inúmeros genes ocorrendo simultaneamente. Assim
sendo, a descoberta de que cada um dos receptores olfativos
é codificado por apenas um gene abre uma nova perspectiva
para entender como o organismo se desenvolve, o que no futuro
implicará o desenvolvimento de novos tratamentos, diz
o professor.
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Gross,
Politzer e Wilczek
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As
forças que movem os quarks
Premiação
já esperada de longa data pela comunidade científica,
o Nobel de Física deste ano dado aos norte-americanos
David Gross, David Politzer e Frank Wilczek representa o reconhecimento
de uma descoberta-chave na compreensão do comportamento
das partículas elementares do Universo. Quais
são, como interagem e como essas partículas
formam tudo que está à nossa volta ou quais
forças agem na natureza e como realmente elas funcionam
são algumas das perguntas que o estudo dos laureados
ajuda a responder, anunciou a Real Academia Sueca de Ciências
ao divulgar o prêmio. Já havia evidências
de que dentro do próton e do nêutron existiam
partículas que interagem entre si, embora ainda não
fosse possível comprovar essa interação
e nem como ela ocorria. Através da teoria da cromodinâmica
quântica (ACD), expressa em 1973, esses três físicos
demonstraram que, quanto mais perto entre si estiverem os
quarks (as menores partículas que formam o próton
e o nêutron), menor será a intensidade da força
forte que os rege. Assim, ao contrário do que supunha
a intuição, quanto mais distantes uns dos outros,
mais fortemente os quarks estarão ligados entre si
pela força forte.
A força forte é uma das quatro forças
fundamentais da natureza, junto com a força fraca,
a eletromagnética e a gravitacional. As três
primeiras são descritas dentro do chamado modelo padrão.
Esse modelo divide tudo o que existe no Universo em duas categorias:
a matéria e as forças fundamentais. A gravitacional
é a força mais conhecida no dia-a-dia e rege
o comportamento entre galáxias e planetas.
Segundo Victor Rivelles, professor do Departamento de Física
Matemática do Instituto de Física, até
hoje ninguém conseguiu isolar as partículas
quark devido a essa propriedade que as mantém unidas,
chamada de liberdade assintótica. Existe até
um prêmio no meio científico que oferece US$
1 milhão para quem conseguir o feito. Ao tentarmos
separá-los, uma força muito intensa começa
a agir, impedindo que se desgrudem. Aparece uma energia muito
forte que se transforma num par de quarks, que, por sua vez,
forma outras partículas, diz. O processo, ou
tentativa de separação, chama-se confinamento.
A partir da teoria da ACD foi possível explicar por
que os quarks se comportam como partículas soltas apenas
quando estão próximos uns dos outros, ou seja,
por causa da atuação da força forte que
os rege. Para o professor Rivelles, a descoberta adiciona
uma peça muito importante no conhecimento do Universo.
É ciência pura e, como tal, a teoria ainda
não tem uma aplicação. Mas, como ocorreu
com o raio-X, por exemplo, levou anos até que aquela
descoberta tivesse uma finalidade prática, afirma.
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Ciechanover,
Rose e Hershko
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O
beijo da morte
As
proteínas estão por trás da construção
celular de todos os organismos vivos. Nas décadas recentes,
a bioquímica percorreu um longo caminho até
explicar como as células produzem e sintetizam as diversas
proteínas. Mas não existiam muitos cientistas
preocupados em explicar de que forma ocorre a destruição
das proteínas indesejadas, mecanismo fundamental ao
bom funcionamento celular. Os israelenses Aaron Ciechanover
e Avram Hershko e o norte-americano Irwin Rose, laureados
com o Nobel de Química de 2004, foram na contra mão
das principais tendências de pesquisas no início
dos anos 80 e desvendaram esse processo.
A professora Mari Cleide Sogayar, do Departamento de Bioquímica
do Instituto de Química da USP, explica que o mecanismo
funciona através de um sinalizador. As proteínas
sem função ou indesejadas são marcadas
por um peptídeo chamado ubiquitina. Em seguida, são
enviadas para o proteassoma, um complexo multiprotéico
que funciona como uma espécie de lixão
celular, onde as células marcadas para morrer são
trituradas e destruídas. A destruição
ocorre por uma ação enzimática chamada
ubiquitina-ligase, ou beijo da morte, como ficou
conhecida.
Segundo a professora, a função é providencial
para garantir o bom funcionamento celular. Se as proteínas
defeituosas ou indesejadas continuarem no interior das células,
estas não funcionam direito, ocasionando, no caso dos
seres humanos, o adoecimento por inúmeras doenças
graves, entre elas o câncer cervical e a fibrose cística,
afirma. Segundo a Real Academia Sueca de Ciências, a
descoberta do mecanismo de destruição das proteínas
indesejadas proporcionará oportunidades para que a
ciência venha a desenvolver medicamentos contra inúmeras
doenças.
Físico por formação, Ciechanover atua
como bioquímico e disse que nunca esperaria ganhar
um Nobel na área de Química. Em entrevista à
Academia de Ciências, disse que até imaginava
levar um prêmio em Medicina, ou talvez Fisiologia, mas
nunca em Química. Para os estudantes que desejam se
tornar excelentes cientistas, Ciechanover tem alguns conselhos:
Quando me formei com Avram Hershko e Irwin Rose, percebemos
um assunto que não estava no foco principal das pesquisas
científicas. Era a destruição das proteínas.
Todos pesquisavam a síntese protéica, o DNA
e como o genoma é traduzido para o proteoma. Então
pensamos: Não, talvez exista algo mais do outro
lado. Havia algo importante ainda escondido. E sabíamos
que ninguém estava se ocupando disso. Antes de tudo,
fomos criativos escolhendo esse tema. Não seguimos
a tendência geral. Então, especialmente no caso
de estudantes israelenses, digo que se você quer ser
competitivo, não siga a tendência dominante,
porque você estará propenso a perder. E pergunte-se
sobre qual grande problema precisa ser resolvido. A idéia
é escolher algo original, acreditar em si mesmo e fazê-lo.
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