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Helena: soluções criativas

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


A recuperação socioambiental proposta pelo programa Bairro Legal - Mananciais incluiu a readequação da infra-estrutura urbana e de saneamento, fiscalização e regularização fundiária


A
os 450 anos, mesmo repleta dos velhos problemas que persistem nas metrópoles dos países pobres, a cidade de São Paulo poderá entrar para uma seleta lista de cidades saudáveis. Conceito amplamente difundido no meio acadêmico, o município ou comunidade saudável, na definição da Organização Mundial da Saúde (OMS), “é aquele que coloca em prática de modo contínuo a melhoria de seu ambiente físico e social, utilizando todos os recursos de sua comunidade”. O conceito implica também a existência de dirigentes municipais preocupados em enfatizar a saúde de seus cidadãos sob a ótica de qualidade de vida.

A partir de um convite feito em 2002 pela OMS, a Faculdade de Saúde Pública (FSP) da USP, com a Prefeitura de São Paulo, selecionou três projetos considerados inovadores na promoção da saúde, para integrar uma rede internacional de municípios saudáveis. A eficácia dos programas municipais selecionados foi avaliada por pesquisas coordenadas pela professora Helena Ribeiro, do Departamento de Saúde Ambiental da FSP. Os resultados dos estudos foram apresentados no dia 8 de novembro no seminário “Programa Cidades e Saúde”, no auditório Paula Souza da faculdade. “Se a OMS acatar esses projetos, São Paulo fará parte da rede internacional de cidades saudáveis”, diz a professora Helena.

Soluções inovadoras

“Plantões jovens: recepção e cuidado de adolescentes e jovens nos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTAs)”, “Avaliação da distribuição de kits de redução de danos em unidades de tratamento para dependentes de álcool e drogas, por profissionais de saúde e usuários desses serviços” e “Avaliação do pós-uso e nível de satisfação dos moradores em áreas reurbanizadas pelo Programa Guarapiranga” foram os projetos avaliados que tiveram seus resultados mostrados na seminário realizado no dia 8. Silvana Cappellini, psicóloga e assistente técnica da Secretaria Municipal da Saúde (SMS), Fabiana Delbon, também da SMS, Violeta Kubrusly e Nelson Baltrussis, da Secretaria Municipal da Habitação, apresentaram palestras sobre os projetos. Participaram do evento como debatedores a professora Maria Lúcia Refinetti Martins, da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da USP, e os professores Ivan França Júnior e Rubens Adorno, da FSP, além da professora Helena Ribeiro, que abriu as apresentações.

Integrar uma rede internacional de municípios saudáveis pode parecer contraditório para uma cidade caótica como São Paulo, com sua considerável carga de desordens socioambientais, culturais e econômicas que alteram a qualidade de vida dos seus moradores. Mas é a forma inovadora de enfrentamento dos problemas o que pode qualificar a metrópole paulistana para integrar o sistema da OMS. “Fazer parte dessa rede é importante porque dá visibilidade ao município e às suas políticas inovadoras, fazendo com que São Paulo não seja vista só como uma cidade cheia de problemas, mas acima de tudo capaz de propor soluções inovadoras para enfrentá-los. As questões abordadas são emergentes nas regiões metropolitanas do mundo inteiro e nossas soluções poderão ser aplicadas em países que têm problemas semelhantes”, diz Helena. Além da capital paulista, outros dez municípios participam do programa da OMS: Londres e Manchester (Inglaterra), Mississauga (Canadá), Dunedin (Nova Zelândia), Colombo (Sri Lanka), Xangai (China), Bangcoc (Tailândia), Rawalpindi e Islamabad (Paquistão) e Kobe (Japão).

De igual para igual

Jovens aconselhando e orientando outros jovens, que são ao mesmo tempo vizinhos e até colegas de bairro, sobre riscos e prevenção de doenças sexualmente transmissíveis, uso de álcool e drogas, aborto provocado, gravidez na adolescência, parto e puerpério. Essa é a estratégia inovadora adotada pelo programa “Plantões jovens: recepção e cuidado de adolescentes e jovens nos Centros de Testagem e Aconselhamento (CTAs)”, aplicado em bairros das zonas leste e sul de São Paulo. Ao ser avaliado pela pesquisa coordenada por Silvana Cappellini, da SMS, o programa apresentou resultados positivos tanto do ponto de vista dos plantonistas quanto dos usuários dos CTAs.

A partir da coleta de dados qualitativos, os plantonistas concluíram que a estratégia “jovem falando para jovem” facilitou a comunicação com os usuários do serviço pelo compartilhamento da linguagem e semelhança da vivência acumulada. Também possibilitou a criação de vínculos por integrarem a mesma comunidade e classe social e fez os agentes perceberem que eles se tornam referência na comunidade por serem jovens lideranças portadoras de transformações. Como, além de aconselhamento, os CTAs também distribuem preservativos, este foi apontado como um aspecto central no cotidiano do trabalho.

Para os usuários, a informalidade no acolhimento e a discrição do trabalho facilitam a entrada no serviço, como revela um dos depoimentos mostrados na palestra de Silvana: “Não foi aquela coisa chata, cheia de pergunta, não ficaram intimidando. Colocaram música, eu conheci as outras pessoas... Foi superlegal”.

Distribuir kits com seringas e outros objetos para os dependentes de drogas injetáveis é prática comum na Europa há muitos anos. Como política nacional de saúde pública, a estratégia de redução de danos foi implantada pelo Ministério da Saúde em 1994, em resposta à epidemia de Aids que atingia os usuários de drogas. Segundo a OMS, a prática surtiu efeitos positivos pelo mundo, pois “reduziu os comportamentos de risco quanto ao uso de agulhas e à transmissão do HIV, sem o aumento do uso de drogas”.

Desde setembro de 2001, a cidade de São Paulo começou a adotar a estratégia de redução de danos nos Centros de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas (Capsad). O atendimento ao dependente químico passou a ser desvinculado dos programas voltados à Aids. Foram cerca de 13 Capsads criados nos últimos três anos na cidade, segundo Fabiana Delbon, da SMS. O programa foca sua estratégia na mudança de padrões de consumo, nas terapias de substituição (incentivar o uso de uma droga menos danosa) e na prevenção de overdose ou intoxicação aguda. Os centros também dão orientação e distribuem materiais educativos, além dos kits para drogas injetáveis, e trabalham articulados com os três níveis de governo e em parcerias com organizações não-governamentais. A pesquisa sobre o projeto apontou que não há modelo imitável de redução de danos, mas diretrizes básicas, que a equipe técnica é fundamental para o trabalho e que houve integração dos usuários do serviço com os líderes comunitários, entre outros aspectos.

Água e ambiente

O descaso do poder público com o uso e ocupação do solo no entorno dos mananciais que abastecem a cidade de São Paulo só alarmou as autoridades para o problema da falta de moradia quando a ocupação desordenada começou a pôr em jogo a saúde de grande parte dos paulistanos, que se abastecem da água daqueles mananciais. Nos países em desenvolvimento, cerca de 80% de todas as doenças de origem hídrica e mais de um terço das mortes são causadas pelo consumo de água contaminada. Com milhares de pessoas habitando em condições precárias, não tardou que o esgoto e o lixo lançados na represa causassem a chamada eutrofização. O fenômeno, que é a fertilização excessiva da água por recebimento de alguns nutrientes como nitrogênio e fósforo, causa o crescimento descontrolado de algas e plantas aquáticas, que alteram o gosto e o cheiro da água.

De gravíssimo, o cenário poderia se tornar caótico, não fossem as medidas mitigadoras de contenção dos danos ambientais postas em andamento pelos poderes públicos, incentivadas por organizações não-governamentais e campanhas da população civil. No caso da sub-bacia do Guarapiranga, responsável pelo abastecimento de 20% da água potável destinada à Região Metropolitana de São Paulo, as ações de redução de danos fizeram nascer, há cerca de dez anos, o Programa Guarapiranga, agora rebatizado Bairro Legal – Mananciais. Esse foi o projeto avaliado pela SMS, em parceria com a FSP.

A recuperação socioambiental atuou em diversas frentes, começando pela readequação da infra-estrutura urbana e de saneamento, passando por uma fiscalização integrada e pela regularização fundiária. Redes de esgoto, canalização de córregos, coleta de lixo e iluminação pública, criação de vias públicas para veículos e pedestres e contenção de encostas foram implementadas, tentando harmonizar as legislações ambiental e de uso e ocupação do solo. Alguns núcleos habitacionais tiveram que ser relocados (reconstruídos dentro da própria favela mas em outra localização), remanejados (adequação ou recuperação de edifícios precários) ou reassentados (remoção da família para conjunto construído fora da área de mananciais). Segundo os resultados da pesquisa que avaliou o programa, 90% da população viu melhorias nas condições de vida, 93% acham que melhoraram os serviços de abastecimento, coleta de lixo e acessibilidade de veículos e pedestres, e 100% aprovaram as melhorias na oferta de áreas de lazer.

 

 




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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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