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ímbolo da partilha, alimento do corpo e da alma, o pão, como na Santa Ceia – quando foi sublimado pelos primeiros cristãos –, tem se multiplicado, gerando renda e propiciando uma vida mais digna a milhares de paulistas a partir da disseminação do Projeto Padarias Artesanais, de iniciativa do Fundo Social de Solidariedade do Estado de São Paulo (Fussesp). Ao todo, já foram distribuídos cerca de 6.500 kits de panificação artesanal e capacitados cerca de treze mil agentes multiplicadores em todo o Estado. Em Bauru, o Serviço de Nutrição e Dietética do Hospital de Reabilitação de Anomalias Craniofaciais da Universidade de São Paulo (HRAC/USP ou Centrinho, como é mais conhecido), localizado na cidade de Bauru (SP), adaptou o projeto original para Padaria Artesanal Itinerante e, desde 2002 – quando o hospital recebeu a doação de três kits de padaria –, profissionais da área e voluntários capacitados estudam meios para implantar o projeto, atingindo plenamente os objetivos de capacitação profissional, melhoria da qualidade alimentar e geração de renda, levando-se em consideração a complexidade da rotina hospitalar e a rotatividade diária de pacientes e cuidadores (pai, mãe, parentes e amigos), que vêm das cinco regiões do Brasil.

“Na primeira etapa, elaboramos manuais com receitas, técnicas dietéticas e informações sobre boas práticas na cozinha, higiene do manipulador, história do pão e sua importância nutricional”, explica a coordenadora do projeto Padaria Artesanal Itinerante, Suely Prieto de Barros Almeida Peres, também diretora do serviço de nutrição e dietética do Centrinho. “Depois, criamos subprojetos que abrangem todos os usuários em diferentes situações e, finalmente, definimos os locais das atividades e treinamos os agentes multiplicadores, também chamados de monitores voluntários”, completa.

A partir deste ano, com voluntários capacitados e informativos concluídos, os subprojetos – Brincando com a massa, Enriquecendo a massa e Mão na massa – passaram a ser desenvolvidos em caráter experimental com pacientes, seus familiares e com pessoas da comunidade em locais variados: internação, ambulatório e unidades externas do Centrinho e na Profis (Sociedade de Promoção Social do Fissurado Lábio-Palatal), entidade que atua, desde 1975, como parceira do Centrinho oferecendo assistência social a seus usuários.

Brincando com a massa

“Debulhar o trigo, recolher cada bago do trigo, forjar do trigo o milagre do pão e se fartar de pão...” esta é a trilha sonora (Cio da Terra, de Chico Buarque e Milton Nascimento) que conduz, quinzenalmente, a performance de Rosimeire Polla, Fátima Menão e Fábio Gomes da Rocha durante a apresentação realizada para crianças que aguardam atendimento no ambulatório do Centrinho. Numa verdadeira brincadeira, uma nutricionista e os três monitores voluntários abordam pacientes no ambulatório de atendimentos, entregando manuais e contando, de forma lúdica, a história do pão às crianças. Depois, as crianças são convidadas a brincar com a massa. Para a nutricionista Eliane Petean Arena, que coordena esta atividade, o momento no ambulatório é de relaxamento e estímulo ao lúdico. No próprio ambulatório, é montada uma mesa onde os participantes amassam o pão, aprendendo a valorizar a massa sagrada, num momento também considerado terapêutico. Surgem pães em forma de cachorrinho, casinha, cobrinhas, flores e outras figuras do imaginário infantil feitas com as massas cruas. Num segundo momento, os pães – assados na padaria artesanal do Cantinho da Nutrição – são servidos aos pacientes da espera do ambulatório.

Enriquecendo a massa

Favorecer o estado nutricional familiar, evitando desnutrição, anemias, constipação intestinal, infecções etc., por meio de receitas saborosas, balanceadas e econômicas, é o objetivo do subprojeto denominado Enriquecendo a massa, que funciona integrado com o programa de orientação nutricional do hospital. O trabalho acontece duas vezes por semana, no período da tarde, no Centro de Educação Nutricional – chamado Cantinho da nutrição.

Lá, profissionais, voluntários e cuidadores de pacientes põem as mãos na massa, numa verdadeira comunhão pela saúde e o bem-estar. Frutas, verduras, leites e derivados compõem o cenário, complementado pelos ingredientes utilizados para a elaboração das massas de pães. No cardápio, algumas receitas diferentes: pães recheados com talos e folhas de verduras e legumes, bolos de farelo, de casca de banana e de mamão.

“Sempre que os cuidadores querem aproveitar esta capacitação para gerar renda, nós os estimulamos, mas não controlamos a venda. Nosso objetivo aqui é educativo”, frisa Maria Inês do Val Maringoni Marques, coordenadora deste subprojeto no Centrinho. “Não só ensinamos receitas de pães como também aprendemos com a rica experiência culinária de cada paciente ou acompanhante”, ressalta Aparecida Ivone de Godoy, monitora voluntária. “Estimulamos o enriquecimento dos pães com verduras, legumes, farelos e multimisturas, procurando utilizar alimentos regionais e de acordo com a safra”, conclui.

De fato, a diversidade cultural é o ponto alto das padarias artesanais do Centrinho. Afinal, todos os dias a cidade de Bauru, sede da instituição, distante 350 km da capital paulista, recebe pessoas de todas as regiões brasileiras em busca de tratamento especializado. São quase 300 pessoas por dia para atendimento ambulatorial. Mais de 25 passam por rotina de internação, diariamente. Na bagagem, além da esperança pela reabilitação, elas trazem consigo costumes e regionalismos que promovem um verdadeiro intercâmbio cultural. “Essa diversidade é interessante porque possibilita também a troca de experiência entre os participantes. Cada um expõe a realidade de sua região e sugere novas receitas ou alternativas mais econômicas”, diz Aparecida. Durante a capacitação, as próprias mães sugerem a troca dos ingredientes por produtos típicos da região onde moram.

Em visita ao Centrinho no último mês de novembro, a presidente do Fussesp, Maria Lúcia Alckmin, ressaltou o caráter educativo da padaria do hospital: “O Centrinho tem usado os kits recebidos para capacitar as mães e os jovens que estão sendo tratados”. Lu Alckmin também se surpreendeu com a criatividade dos cozinheiros e nutricionistas da instituição. “Vi aqui uma receita de pão de casca de banana. Essa eu não conhecia”, observou.

“Não basta ensinar. A gente quer que essas ações progridam”, declarou Lu Alckmin, lembrando que há muitos exemplos de sucesso e criatividade pelos municípios paulistas onde foram implantadas as padarias. Além de capacitar e educar, o Projeto Padarias Artesanais promove a cidadania das pessoas, cria vínculos e resgata valores deixados de lado. Um bom exemplo é a prática de criar hortas nos quintais, recuperada por algumas pessoas que se empolgam com a importância da alimentação saudável, após fazerem o curso de capacitação da panificação artesanal.

Mão na massa

Em fase de implantação, Mão na Massa é o nome da atividade desenvolvida na Profis, entidade filantrópica que presta auxílio social a pacientes do Centrinho, constituindo-se em importante parceira do hospital. “O nome Mão na Massa está relacionado à imprescindível importância da mobilização dos participantes para o êxito do projeto”, informou a nutricionista que coordena a atividade na Profis, Heloíse Lopes Fernandes. “Nosso objetivo é fazê-los saírem de suas cadeiras e, literalmente, utilizarem suas mãos no preparo de cada etapa da confecção das receitas, a partir de uma participação interativa com o monitor e demais companheiros de curso”, complementou Gildete Bondesan, presidente da Profis e multiplicadora da atividade. Para ela, o diferencial deste subprojeto é que ele objetiva habilitar seus participantes não só para a execução das receitas, mas também para a correta normatização do acondicionamento, controle de qualidade, validade e comercialização dos pães, bolos e salgados.

“Outro diferencial será o estabelecimento de parcerias financeiras com empresários da comunidade de Bauru, para, em trabalho conjunto e participativo, adequar o local físico existente na Profis, de modo que funcione não só como Centro de Treinamento, mas como Centro de Produção e Distribuição do Projeto Padarias Artesanais, com renda revertida para os participantes”, informa Heloíse.

Para 2005, a previsão é atender, de forma sistemática, oito mães ou pacientes a cada curso, com duração de seis aulas, além de capacitar integrantes do Programa NIRH (Núcleo Integrado de Reabilitação e Habilitação) – unidade do Centrinho que atende pessoas de 5 a 30 anos, com surdez profunda, ensinando Libras (Língua Brasileira de Sinais) e dando treinamento profissional para que eles sejam incluídos no mercado de trabalho.

Na Profis, dois cursos experimentais já foram organizados com a participação de 50 interessados. O último aconteceu em 30 de novembro, com 30 participantes. “Essa aula de panetone foi bem pontual em virtude do Natal, que está chegando”, disse Heloíse, que afirma intensificar os cursos de pães para o próximo ano com o objetivo de colaborar para a geração de renda das famílias.

Para a mãe de paciente, Clessi Lucena Nobre, 43, os cursos oferecidos pela Profis oferecem novos aprendizados e oportunidades de renda extra. Ela participou do curso de panetone e afirma que está apta a reproduzir a receita: “Se não tivesse tão perto do Natal, eu faria panetones para vender em minha terra – que mora em Pelotas, no Rio Grande do Sul – não tinha idéia de que era tão fácil”. Mãe de Roberto, 6 anos, Clessi vem a Bauru desde que o garoto tinha 3 meses, por isso, esta não é a primeira vez que ela participa de cursos da Profis. Eu já fiz tear e vendi colchas no meu bairro. Agora, vou começar a fazer pães e, no próximo Natal, ninguém me segura”, avisa. Para Maria José Bento Lopes, 33, mãe de dois filhos, participar do curso foi uma experiência interessante. “Sempre tive vontade de aprender a fazer panetones e vou poder fazer para o Natal deste ano, meus filhos vão adorar. Já estou esperando o próximo curso.”


Parcerias produtivas

Compostos por forno de inox, batedeira, liqüidificador, balança e assadeiras de alumínio, os kits de panificação artesanal são doados ao Fussesp por empresas, bancos e pessoas físicas. O Fussesp repassa esses kits aos Fundos Sociais Municipais de todo o Estado e às entidades assistenciais da capital cadastradas. A entidade que recebe os kits nomeia pessoas para passarem por capacitação, feita por técnicos da Secretaria da Agricultura, na sede do Fussesp, para que atuem nas comunidades como multiplicadores, ensinando a fazer o pão, além de noções de cidadania, ética, saúde e higiene. O Projeto de Padarias Artesanais também está sendo levado às escolas que abrem as portas nos fins de semana para atividades esportivas, culturais e de lazer. Nos fins de semana, os kits são usados para ensinar os pais a fabricar pães e, durante a semana, são feitos pães para reforçar a merenda.

“Ainda não firmamos outras parcerias, a não ser com o Fussesp, que tem nos beneficiado com enorme confiança em nosso trabalho. Mas, pretendemos conquistar parcerias com supermercados para doação de produtos utilizados durante as aulas e com a Pastoral da Criança”, informa o superintendente do Centrinho, professor José Alberto de Souza Freitas (Tio Gastão).

Com tanto empenho, o pão vem se consolidando entre os participantes dos projetos como verdadeiro símbolo de fé pela transformação social e consagração da cidadania.


Equipe e colaboradores do Centrinho com a mão na massa: terapia lúdica

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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