Os
quatro meses de duração do Programa Pró-Universitário
iniciado em julho de 2004 , uma parceria da USP com
a Secretaria da Educação do Estado destinada a reforçar
o ensino médio nas escolas públicas paulistas, deixaram
conseqüências e lições para todos os participantes:
os alunos (inscreveram-se 5 mil, mas houve desistências) ganharam
confiança e auto-estima, habitualmente rebaixada pelo preconceito
contra a periferia, onde a maioria reside; os professores das escolas
públicas inscritas no projeto apresentaram mudanças
positivas de hábito, como melhorar o relacionamento com os
colegas, provavelmente em razão do comportamento dos próprios
alunos e do contato que tiveram com pessoas, técnicas e materiais
do ensino superior; os alunos monitores da USP tomaram consciência
do papel social que lhes cabe desempenhar como beneficiários
de um sistema de ensino público e gratuito; e a USP aprendeu
a lidar mais conscientemente com um segmento da população
que vive precariamente e até em grande parte desconhece o
que é uma universidade.
Em linhas gerais, esta é a avaliação do Pró-Universitário
apresentada em encontro na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
(FAU), dia 17 de dezembro, com a participação na abertura
do coral da Faculdade de Educação. Agora, a expectativa
de todos é que o programa tenha continuidade este ano, já
mais bem organizado e com tempo maior de duração,
o que depende de decisão da Secretaria da Educação.
O tom otimista dos testemunhos e dos expositores só foi quebrado
pelo depoimento de uma aluna do terceiro ano do ensino médio
Lunalva de Oliveira Mendes Silva , de Cidade Tiradentes,
que em carta aberta considerou a experiência do Pró-Universitário
uma farsa, apontando falhas, logo rebatidas e em parte
admitidas e explicadas.
O encontro na FAU, que avaliou o Programa Pró-Universitário,
com participação
do coral da Faculdade de Educação: resultados bons
para todos
Auto-exclusão
A pró-reitora de Graduação Sonia Penin disse
que a Universidade vai analisar e corrigir as deficiências
apontadas no projeto piloto e tudo fará para que ele continue
neste ano. O representante da Secretaria de Educação,
Luis Fábio Pucci, depois de lembrar que ele também
estudou em escola pública, garantiu que o desempenho inicial
do programa será avaliado cuidadosamente, sendo conveniente
ampliar o número de vagas e de bolsas para os alunos monitores.
Sonia, observando que, embora no ano passado a Fuvest tenha ampliado
para 60 mil o número alunos da escola pública isentos
de taxa de inscrição, apenas 48 mil se inscreveram,
o que, segundo ela, pode ser interpretado como auto-exclusão.
Cabe à Universidade ajudar esses alunos, pois na hora de
provas como a da Fuvest um curso complementar faz a diferença.
O papel da graduação seria duplo: estabelecer maior
contato com o estudante da escola pública e, internamente,
aprimorar a formação de profissionais e de professores,
para que possam contribuir para o desenvolvimento do País.
Uma das propostas de caráter social vem do Cruesp (Conselho
de Reitores das Universidades Estaduais Paulistas), que sugere que
USP, Unesp e Unicamp mantenham cursos preparatórios para
os egressos ou concluintes da escola pública.
Fenômeno parecido com o da auto-exclusão citada pela
pró-reitora foi apontado pela professora Eleny Mitrulis,
coordenadora geral do Pró-Universitário. Ela disse
que 14 mil alunos concorreram às 5 mil vagas do programa,
mas a maioria deles estava concentrada em algumas escolas, enquanto
em outras não havia inscrição nenhuma. Demanda
grande, mas pouca matrícula: como explicar? Luis Fábio
Pucci, garantindo que as inscrições estavam abertas
em todas as escolas do Estado, e não apenas da zona leste,
disse que as desistências devem-se provavelmente a dificuldades
relacionadas com distância e transporte. A necessidade de
trabalhar e atrasos constantes dos alunos foram citados por outros
depoentes como justificativas para as desistências. O ideal,
segundo o representante do governo, seria que houvesse pólos
de ensino complementar em cada região da cidade.
Transporte é problema sério também para os
monitores. Um deles, Augusto Monteiro Osório, disse que mora
em Taboão da Serra e todo final de semana enfrentava duas
horas de viagem em ônibus até a zona leste. Distância
e precariedade de condução concorrem, segundo o monitor
Domingos Galvão Silva (Geografia), para criar o mito de que
a zona leste é uma região complicada. Mesmo assim,
no Pró-Universitário havia gente de Jundiaí,
Barueri e Arujá, prova de que a disposição
de aprender vence qualquer obstáculo.
Alunos
ganharam confiança e professores aperfeiçoaram sua
prática pedagógica: esses foram alguns dos benefícios
trazidos pelo programa
Adaptações
Segundo Eleny e vários outros expositores, logo no começo
do curso percebeu-se que a maior parte dos alunos carecia não
apenas de conhecimentos avançados exigidos nos vestibulares,
mas de conhecimentos básicos. Adaptar conteúdos e
material didático a essa circunstância custou atrasos
na entrega de alguns módulos. Aliás, o Pró-Universitário
se diferencia dos cursinhos tradicionais pela não formatação
prévia, adaptando-se às especificidades de cada escola,
conforme notou o coordenador de área Maurício Pietrocola
Pinto de Oliveira (Física). Antes dele, Domingos Galvão
Silva contou que houve experiência com aulas multidisciplinares
(história, geografia, biologia) realizadas durante excursão
a Paranapiacaba, um roteiro improvisado.
De modo geral, na avaliação final o desempenho dos
alunos do Pró-Universitário foi fraco (35% de acertos
nas avaliações escritas), mas assim mesmo 85% consideraram
o curso positivo, e 97% disseram que, mesmo que não conseguissem
passar na Fuvest, voltariam a estudar neste ano. De qualquer modo,
de acordo com os monitores e os coordenadores, seria ingênuo
e injusto avaliar o sucesso ou o insucesso do programa apenas pelo
número de alunos que conseguiram aprovação
na Fuvest; o julgamento precisa levar em conta outros fatores: como
evoluiu a mentalidade dos alunos, como cada um ficou marcado pelo
contato mais direto com a Universidade e as conseqüências
do projeto na vida dos universitários que participaram de
sua execução.
O
Programa Pró-Universitário teve início
em julho de 2004, graças a uma parceria entre a USP
e a Secretaria de Estado da Educação, com o
objetivo de aumentar o índice de ingresso de alunos
da rede pública de ensino nas universidades públicas.
As
aulas ocorreram de julho a dezembro de 2004, de segunda a
sábado, nos turnos vespertino e noturno, de acordo
com a disponibilidade das 16 escolas participantes.
O
programa disponibilizou 5 mil vagas para alunos da terceira
série do ensino médio da rede pública
estadual. A seleção dos inscritos se fez por
critérios de desempenho escolar, freqüência
e renda familiar. As inscrições foram feitas
na própria escola onde o aluno cursava o ensino médio.
Além
de assistir às aulas, os alunos participaram de provas
mensais, que simulavam o vestibular, e fizeram visitas à
USP, a fim de se familiarizar com o ambiente universitário.
Oito
disciplinas foram oferecidas pelo Pró-Universitário:
português, matemática, física, química,
biologia, história, geografia e inglês. O corpo
docente do programa foi formado por 330 graduandos da USP,
escolhidos através de processo de seleção,
que realizaram atividades de monitoria sob a forma de estágio
remunerado. Coordenados por especialistas da USP, os monitores
receberam capacitação inicial, no mês
de junho, e durante todo o curso.
Todos
os alunos matriculados no programa receberam material didático
especialmente produzido pela USP.
O
programa teve o objetivo também de contribuir para
a melhoria do currículo, da organização
e da formação de professores do ensino médio
estadual paulista.
Dos
5 mil alunos que iniciaram o Programa Pró-Universitário,
134 passaram para a segunda fase do vestibular da Fuvest.
Os organizadores estimam que, embora o índice de aprovação
não tenha sido alto, o programa trouxe benefícios
incalculáveis para a educação paulista,
ao dar reforço escolar para os alunos do ensino médio,
fornecer experiência docente para os graduandos da USP
e inspirar novas idéias para o magistério.
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