Renato Janine Ribeiro, diretor de Avaliação
da Capes, diz que a reforma universitária tem que ser feita,
mas não será feita se for ampliada demais. O professor
de Filosofia e Ética da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas (FFLCH) da USP discorda da proposta da Universidade
São Paulo de que a reforma deva incluir todo o sistema de
ensino, nos três níveis fundamental, médio
e superior. Estou convencido de que a reforma do ensino deve
começar não só pela universidade, mas até
pela própria pós-graduação, afirmou
Janine. A razão disso, explicou, é que a pós-graduação
pode formar professores para as instituições de ensino
superior, que por sua vez vão qualificar os docentes do ensino
básico, uma vez que, de acordo com a lei, quem leciona no
nível básico, para crianças de 7 a 10 anos,
também deve possuir diploma universitário. Mas
de que valerá esse diploma se ele não tiver uma formação
boa na sua universidade, que, por sua vez, depende em larga medida
de haver professores com mestrado e doutorado?, perguntou.
Janine fez, no dia 2 de maio, na sala do Conselho Universitário
da USP, uma exposição do que está sendo feito
administrativamente na Capes, para tornar a agência de financiamento
mais aberta à comunidade e mais eficiente na avaliação
dos programas da pós-graduação.
Debate
nacional
Depois da palestra, desta vez dirigida especialmente a coordenadores
de programas na área de ciências exatas e engenharias,
o diretor da Capes disse que o projeto do governo federal de reforma
da universidade conseguiu trazer ao debate grande número
de atores antes alheios ao tema e que o ministro Tarso Genro abriu
discussões com movimentos sociais, conseguindo apoio, ao
princípio da reforma, da UNE à Academia Brasileira
de Ciência. Isso representa ruptura enorme com a prática
do governo passado, que foi de hostilizar a comunidade acadêmica,
segundo o professor.
Na concepção do Ministério da Educação,
faz parte essencial da reforma universitária o Plano Nacional
de Pós-Graduação 2005/2010, que a Capes montou
e que quantifica a idéia de absorver doutores e mestres.
Por isso mesmo, são necessários nas universidades
cursos de mestrado e doutorado e corpo docente também composto
por mestres e doutores.
Acho que a USP tem dialogado muito bem com o MEC nesse ponto,
disse Janine, mas há um problema extremamente preocupante,
que é o pequeno número de docentes do ensino básico
e médio formados pela universidade pública no Estado
de São Paulo. Esse número tem que aumentar, do contrário
os professores continuarão a ser formados por instituições
fracas. É fundamental que a Universidade dê essa contribuição
ao Estado.
Mas será que, ao propor uma reforma ampla do ensino, do próprio
sistema, o Conselho Universitário da USP não estava
pensando exatamente na situação precária do
ensino fundamental e médio? A isso o diretor da Capes responde
que é preciso desbloquear o sistema universitário,
deixar clara a sua responsabilidade e cobrar das instituições
a formação de bons professores para o ensino fundamental
e médio.
Sobre a repartição dos recursos orçamentários
entre as universidades federais, Janine disse que, basicamente,
a reforma preceitua estabilizar a situação existente,
garantir a cada instituição federal de ensino superior
a manutenção do orçamento histórico
dela, e passar a pagar em duodécimos. É o que
garantiu a sobrevivência e o avanço notável
das universidades estaduais paulistas, disse o diretor da
Capes. Fora isso, continuou, estabelece-se um valor mais ou menos
competitivo em função da expansão do ensino
ou de outros critérios em cada instituição.
Assim, nem tudo estaria em concorrência; estaria em concorrência
apenas um-a-mais, quando, por exemplo, a instituição
se propusesse a criar um laboratório; conseguiria então
os recursos e a garantia deles por vários anos, durante os
quais poderia, por exemplo, construir prédios, equipá-los
ou contratar docentes para o programa. Janine insiste: A idéia
federal é fazer a concorrência sobre o a-mais e considerando
vários critérios, como o desempenho científico,
a criação de cursos noturnos etc.. Segundo ele,
essa concorrência também não é praticada
nas três universidades estaduais paulistas.
O modelo paulista de universidade pública tem por base, além
da autonomia administrativa e didática, a garantia de recursos
representados por uma parcela mensal do ICMS. Janine garante que
a proposta de reforma do Ministério da Educação
é mais forte que o modelo paulista: salvo engano, 75% dos
18% do orçamento da União que vão para a educação
deverão ser destinados às universidades. Então,
cerca de 13,5% do orçamento geral da União estariam
carimbados para as federais.
Atualmente, não há estabilidade nos orçamentos
das federais. Depende de cada orçamento e os recursos ainda
podem ser contingenciados (retirados e orientados para outros fins).
A idéia, segundo Janine, é que os orçamentos
não variem mais ano a ano, mas sejam estáveis.
O diretor da Capes espera que o projeto de reforma universitária
seja encaminhado ao Congresso Nacional no segundo semestre deste
ano, embora um novo texto ainda seja divulgado esta semana e deva
passar por muita discussão. Seria bom que a reforma
fosse votada ainda este ano, mas não sei se será possível,
admite Janine.
Nota
3 não forma doutor
Em
sua exposição no Conselho Universitário
da USP, Renato Janine Ribeiro mostrou que a graduação
no Brasil tem números grandes de 12 mil a 15
mil cursos, 2 mil instituições , mas o
gigantismo se retrai quando se fala em pós-graduação.
São 2 mil programas para avaliação trienal
da Capes, de 220 instituições de ensino. A USP
sozinha tem o mesmo número de programas de pós
que as demais instituições juntas. Tem também
membros em todas as áreas avaliadas pela Capes, exceto
a de Teologia.
O diretor da Capes falou durante três horas sobre novos
parâmetros para avaliação de programas,
número mínimo de docentes em cada programa,
obrigação de tornar a avaliação
e a produção transparentes para a comunidade
mediante publicação dos dados na Internet (excetuando
informações sigilosas ou destinadas a publicação
em livro) e a necessidade de haver cooperação
entre programas de alto nível (6 e 7) e programas fracos
(3) ou regulares (4). O último item seria um indicador
de solidariedade, inclusive de cooperação entre
regiões de níveis econômicos muitos desiguais
o Sudoeste e o Sul ajudando o Norte e o Nordeste.
Mas a proposta de maior impacto anunciada no encontro do dia
2 foi a de extinguir os doutoramentos em cursos de nível
3. Janine reconhece que este é um caso de difícil
solução, principalmente quando se trata de programas
de instituições privadas; a dúvida é
se a mantenedora do curso atingido dará continuidade
às aulas até a conclusão do curso, arcando
com as despesas com professores e outros itens.
Janine reservou um tempo para falar dos mestrados profissionais,
para os quais a Capes está definindo critérios
de avaliação. Segundo o professor, esses cursos
deveriam ser avaliados pelo menos dois anos depois de o aluno
concluir as aulas e provavelmente já estiver no mercado;
se se encontrar na academia, alguma coisa de errado existe,
pois os mestrados profissionais não visam à
pesquisa, mas a preparar pessoas para trabalhar fora da universidade.
|
|