Por ser um tema da moda, a questão da responsabilidade
social pode ser um perigo para a efetiva inclusão de pessoas
com limitações físicas, psicológicas
ou sociais em espaços culturais como museus. O alerta foi
dado por Amanda Tojal, educadora da Pinacoteca do Estado, uma das
palestrantes da 5a Semana dos Museus da USP, realizada de 9 a 13
de maio no Anfiteatro Camargo Guarnieri, na Cidade Universitária.
Todos, agora, querem acessibilizar tudo para todos, mas isso,
em geral, é feito através de projetos que não
perduram. A inclusão cultural ou social não deve ser
desenvolvida apenas como ação educativa. Precisa ser
encampada como política cultural. Deve ser uma vontade política
para o museu ter esse atendimento de forma permanente, defende
Amanda, que durante 14 anos desenvolveu no Museu de Arte Contemporânea
(MAC) da USP trabalhos voltados aos deficientes visuais, através
de exposições como O toque revelador.
A educadora, que vem assessorando o Museu de Arqueologia e Etnologia
(MAE) da USP a criar um espaço de exposição
para deficientes visuais e também recebeu convite do Museu
de Anatomia da USP para dar consultoria num projeto semelhante,
cita como exemplar o caso do Museu das Ciências e da Indústria
em Paris, que possui exposições adaptadas aos diversos
públicos e um departamento para cada deficiência.
Na Pinacoteca do Estado, um programa que Amanda coordena permitiu
o acesso de deficientes visuais a 20 esculturas originais que podem
ser tocadas, além de 20 réplicas de pinturas e outros
objetos. As reproduções são maquetes tridimensionais
desmontáveis e interativas, ou seja, a pessoa pode fazer
jogos com as peças para melhor compreender a obra. O trabalho
também foi adaptado para múltiplos deficientes sensoriais,
com objetos que estimulam o olfato e o tato e que também
são interativos.
Com o tema Ações afirmativas em museus: educar
e preservar, a 5a Semana dos Museus da USP, promovida pela
Pró-reitoria de Cultura e Extensão Universitária
e coordenada pela professora Maria Cristina Oliveira Bruno, do MAE,
apresentou mostra de vídeos, sessão de pôsteres,
mesas-redondas e grupos de trabalhos abordando diversos tópicos
sobre museologia, inseridos no contexto da inclusão cultural
e social. Nossa intenção é debater, sob
diferentes enfoques, estratégias para promover a inclusão
em museus e apresentar as ações afirmativas que vêm
sendo realizadas, diz Maria Cristina.
A 5a Semana dos Museus da USP: cultura para todos
Um
museu vivo
A idéia corriqueira de que museu é um lugar cheio
de peças esquisitas e sem uso cai por terra com a apresentação
do Projeto Sossego, desenvolvido por uma comunidade da região
de Canaã dos Carajás, no Estado do Pará, sob
a coordenação de uma equipe de educadores do Museu
Paraense Emílio Goeldi, em Belém.
O reconhecimento espacial e cultural do lugar e o levantamento das
tradições regionais foram o passo inicial para um
grupo de 211 crianças e adolescentes e 63 adultos iniciar
um processo de educação patrimonial naquela comunidade,
visando à valorização da cultura e identidade
e preservação da memória.
A ação educativa associada à pesquisa arqueológica
permitiu, após diversas oficinas, que os participantes recriassem,
em desenhos, artesanatos e pinturas, as expressões culturais
e folclóricas do lugar. O resultado foi além do esperado,
contou Edithe Pereira, que apresentou o trabalho ao público
presente no Camargo Guarnieri. Além das exposições
organizadas desde o início do projeto, em 2002, e de uma
mostra do Museu Paraense Emílio Goeldi, a iniciativa resultou
em livros didáticos e literários e vídeos.
Numa comunidade de 10 mil habitantes, a exposição
que o grupo organizou em Canaã dos Carajás, em abril,
recebeu 3 mil visitantes, que viram as técnicas de cerâmica
e artesanato aplicadas em azulejos, sacolas, camisetas e bonés.
Pretendemos que a prática sirva como orientação
de carreira e até como fonte alternativa de renda,
diz Edithe.
O museu construído pela comunidade e servindo como instrumento
de transformação social, como mediador das relações
sociais ou ainda como espaço de inquietações
e não simplesmente de indagações como
propôs em sua palestra o professor Ulpiano Toledo Bezerra
de Meneses, da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas
(FFLCH) da USP também foi o desafio encampado por
um projeto desenvolvido no Mexican Fine Arts Center Museum, de Chicago.
Com a mostra El Dia dos Muertos, a proposta da chamada
exposição dialógica configurou-se através
de montagens realizadas pelo público e por artistas com objetos
e oferendas aos mortos. A data (Finados, no Brasil) é
muito importante para os mexicanos e é celebrada por dois
dias no México. Daí a escolha do tema, justificou
Cesareo Moreno, do Mexican Fine Arts Center Museum. Trabalhar o
assunto foi também uma forma de resgate da identidade entre
aquela comunidade.
Vários
públicos
Formas mais simples de inclusão cultural e social nos museus
podem se dar também através do preço da entrada,
como acontece no Museu de Zoologia da USP, que cobra R$ 2,00 o ingresso.
Temos uma política de ingressos muito baratos, que
inclui isentar crianças de até 6 anos de idade e idosos
acima de 60 anos, além de estudantes de escolas públicas,
docentes e funcionários da USP. Outros estudantes pagam meia.
Mas se, por acaso, alguém tiver interesse em ver a coleção
e não puder dispor de R$ 2,00, nossos funcionários
estão orientados a liberar o acesso, disse o diretor
Carlos Roberto Brandão.
O enfoque da exposição do Museu de Zoologia também
foi alterado para poder atrair públicos mais abrangentes,
além de zoólogos e estudantes, conta Brandão.
O foco antes era sobre os animais e agora as mostras centram
as pesquisas sobre os animais, o que pressupõe a intervenção
do homem, o olhar do pesquisador. Cada exposição é
datada e localizada no tempo, refletindo a visão que temos
sobre aqueles animais, diz Brandão.
Na tentativa de incluir cada vez mais pessoas, a partir de 30 de
maio o Museu de Zoologia terá substituído quatro paredes
por vidros, permitindo que os visitantes tenham acesso visual às
áreas de reserva técnica e possam ver alguns ambientes
de trabalho dos pesquisadores. O museu planeja em breve iniciar
um projeto voltado a deficientes visuais, afirmou o diretor.
Entre outros exemplos de inclusão e ações afirmativas,
o Museu Paulista da USP destacou a implantação do
projeto de quebra de barreiras arquitetônicas para deficientes
físicos. O Museu de Arte Contemporânea mostrou o museu
lúdico MAC Virtual e outras iniciativas que proporcionam
o aperfeiçoamento e melhor entendimento da arte por parte
de professores e alunos, segundo a diretora Elza Ajzenberg.
Homenagem
A Fundação Vitae, através de sua diretora Regina
Weinberg e da gerente de Projetos Gina Gomes Machado, foi homenageada
pelo trabalho de 20 anos de incentivo e financiamento a projetos
culturais, educacionais e de promoção social no Brasil.
A instituição encerrará suas atividades em
janeiro de 2006 e, para mostrar um balanço de suas ações,
a 5a Semana dos Museus promoveu o Seminário de Avaliação
do Programa de Apoio a Museus Brasileiros (Pamb) da Fundação
Vitae, que, entre outras parcerias com a Universidade, financiou
o Curso de Especialização em Museologia do MAE.
A Vitae modificou o panorama da cultura no Brasil. Sem ela
estaremos num mato sem cachorro. É bom que comecemos
a pensar num modelo eficaz de financiamento para a cultura a partir
de 2006, ou algo que possa substituir a Fundação Vitae,
disse o secretário municipal de Cultura, ex-diretor do Centro
Cultural São Paulo e professor da Escola de Comunicações
e Artes (ECA) da USP, Carlos Augusto Calil.
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