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Cada vez mais, muçulmanos esclarecidos se negam a permitir que os valores do islã sejam pervertidos pela ideologia da Jihad e trazema esperança de que
a reconciliação pode ser alcançada

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 


O mundo assistiu, estarrecido, à tristeza dos colonos judeus, que tiveram que abandonar suas casas, construídas com tanto carinho ao longo de 30 anos, entre os pomares, campos e jardins




Torna-se necessário apresentar um pequeno histórico de Gaza, assunto batido e rebatido pela imprensa e, no entanto, pouco descrito e estudado. Gaza é uma das cidades mais antigas do Oriente Médio, situada na estreita faixa de planície de mesmo nome, distante 15 quilômetros do mar Mediterrâneo, no  extremo sul de Israel. Em tempos mais remotos, antes da era cristã, servia como principal base para as operações egípcias em Canaã, até a conquista desta pelos israelitas, quando Gaza foi incluída na tribo de Judá.

No século 12 antes da era cristã, foi ocupada pelos filisteus, povo navegador e guerreiro. Gaza, que no início foi vista como uma guarnição de soldados  egípcios, tornou-se depois a mais importante cidade dos filisteus, a Pentápolis.

Foi em Gaza que Sansão demonstrou sua força espetacular e foi lá que pereceu na luta com os inimigos, no templo de Dagon. Com o enfraquecimento do apoio egípcio, os filisteus submeteram-se ao rei Davi, mas logo Gaza foi conquistada pela Assíria. Depois de uma luta ferrenha, os persas sitiaram a cidade e esta tornou-se uma importante fortaleza, chamada Kadity por Heródoto (na língua persa, Gaza quer dizer “pequena moeda de cobre”).

Por sua terra fértil, famosos vinhedos, frutas abundantes, trigais e a favorável situação geográfica, servindo como rota para caravanas que se ocupavam da  troca de produtos, Gaza foi cobiçada por muitos povos, pois deve-se aqui lembrar que naquele tempo não havia aviação nem outros meios de transporte automotivos. Tudo era carregado nos lombos dos camelos. Na época helenística, em torno de 330 antes da era cristã, Gaza foi a única cidade de Eretz Israel cujos habitantes opuseram-se à influência de Alexandre, o Grande, que por sua vez sitiou a cidade e vendeu seus habitantes como escravos.

Ao longo de toda sua história, Gaza foi conquistada, reconstruída e abandonada. Foi cobiçada pelos gregos, que faziam incursões constantes na Eretz Israel. Na história de conquistas da cidade, encontram-se nomes como os de Jonathas, Hasmoneu, Pompeu, Gabinius e Herodes. Gaza chegou a abranger extensos territórios e até possuir seu porto – Maiumas.

Sob o domínio romano, na era cristã, Gaza novamente prosperou e chegou a ter uma famosa escola de retórica. Seus habitantes foram fanaticamente devotados ao deus Marnas. Mesmo a cidade estando sob domínio cristão, somente no século 5 o templo de Marnas foi destruído e, em lugar dele, erguida uma igreja e a religião cristã tornou-se dominante. Embora os judeus habitassem Gaza, já nos tempos talmúdicos  a cidade não foi considerada como parte da Terra Santa. O Novo Testamento refere-se a Gaza como cidade-deserto, porque nas épocas de abandono as  grandes dunas cobriam a cidade, chegando a diminuir o seu tamanho. Grande devastação provocaram nela as Cruzadas dos séculos 11 e 12 da nossa era, e a cidade foi completamente abandonada até pela próspera comunidade judaica, massacrada pelos cruzados. Depois do  século 14, Gaza caiu em esquecimento, por terem sido descobertas novas rotas de comércio com as Índias Orientais, graças ao desenvolvimento da navegação.

Com a  Inquisição portuguesa e espanhola, os judeus afluíram a Gaza, e durante os séculos 16 e 17 foram os judeus e samaritanos os maiores produtores dos melhores vinhos. A prosperidade não decresceu com a conquista otomana, bem  ao contrário: floresceu mais ainda, enquanto os árabes, judeus e cristãos viviam em paz. Em 1665, visitou Gaza o falso messias judaico Sabbatai Zwi, e a cidade se tornou centro de movimento messiânico. Um de seus principais discípulos ficou conhecido como o Natan de Gaza. Até Napoleão ocupou Gaza, em 1799, por um curto tempo. Os judeus, nessa época, entre outras atividades, comerciavam a cevada, que exportavam para as cervejarias da Europa.

Durante a Primeira Grande Guerra Mundial (1914-1918), Gaza foi uma fortaleza turca, que resistiu a dois ataques ingleses em 1916 e outro em 1917, caindo finalmente sob as manobras do general inglês Allenby. Sob o domínio inglês, Gaza desenvolveu-se muito devagar. Em razão dos distúrbios árabes antijudaicos, em 1929, os judeus abandonaram a cidade, que permaneceu sob administração egípcia, como única parte do território do anterior protetorado inglês.

Depois da repartição pela ONU, em 1948, das terras da região em dois países, uma parte  para os israelenses e outra para os árabes palestinos, os israelenses anunciaram, com grande euforia, sob a chefia de Ben Gurion, o Estado de Israel. A enraizada cultura de ódio contra o judeu venceu a razão e o Egito, a Síria e a Jordânia atacaram o  recém-formado Estado, prometendo aos fugitivos árabes de lá que eles voltariam com  o exército  vencedor, depois de ter afundado os israelitas no mar Mediterrâneo. Isso não ocorreu e os israelitas, apesar de muitas perdas, saíram vencedores dessa guerra desigual.

No Tratado de Armistício entre Egito e Israel, em 1949, Gaza ficou sob administração do Egito, mas nunca foi incorporada ao território egípcio propriamente dito. Os árabes, fugitivos de Israel, aglomeraram-se em Gaza, em campos de refugiados, quadruplicando o número da população e com isso cresceram a miséria, o desemprego e o cultivo do ódio contra o judeu, incentivado por seus governadores corruptos.

A ONU ficou encarregada de cuidar das fronteiras entre o Estado de Israel e seus vizinhos, mas não  conseguiu impedir os ataques terroristas aos civis israelenses. Em junho de 1967, o general egípcio Nasser pediu que a ONU retirasse seus soldados das fronteiras, planejando, com a Síria e a Jordânia, atacar novamente o Estado de Israel. Eles incentivaram os árabes de Israel  a fugir e aguardar fora de Israel até que os três exércitos vencedores afundassem os israelenses no mar Mediterrâneo.
Porém aconteceu diferente: os israelenses destruíram a aviação egípcia nos aeroportos antes que esta  levantasse vôo, expulsando os exércitos egípcios de Gaza e da Península do Sinai, os jordanianos da Cisjordânia e de Jerusalém Oriental e os sírios das Colinas de Golan. E isso em apenas seis dias. Essa espetacular vitória passou a ser chamada de Guerra dos Seis Dias.

Os anos se passaram e a população de Gaza cresceu muito. Israel implantou ali muitos melhoramentos na agricultura, na irrigação e na iluminação e incentivou novos imigrantes judeus a se estabelecer nas terras férteis de Gaza, incentivos esses feitos pelo mesmo Ariel Sharon, o atual primeiro-ministro de Israel, formando com o tempo 21 assentamentos modernos e prósperos, nos quais acharam emprego 50 mil árabes.

Parece que a história do destino de Gaza continua a se repetir: o primeiro-ministro de Israel, o mesmo que incentivou, há 30 anos, os assentamentos judaicos, chegou à conclusão de que seria mais vantajoso para Israel tirar de Gaza os assentamentos judaicos do que sacrificar jovens soldados em defesa deles, contra os terroristas assassinos e talvez, dessa maneira, incentivar a paz.

O mundo inteiro assistiu, estarrecido, à tristeza dos colonos judeus, que tiveram que abandonar suas casas, construídas com tanto carinho ao longo de 30 anos, entre os pomares, campos e jardins. Os religiosos sofreram mais ainda, pois acreditaram que as terras que cultivaram com tanto amor, onde criaram seus filhos, foram-lhes doadas pela força divina.

Jamais na história um povo entregou tantas terras ao inimigo que lhe declarou guerra e isso com a mera esperança de acabar com a morte inocente de ambos os lados e concluir a paz com os vizinhos. Israel ofereceu terras a Gaza com muito sacrifício em nome da paz, e essa devolução não foi a primeira que fez. Em 1973, depois da guerra do Sinai e a visita de paz a Jerusalém do esclarecido primeiro-ministro egípcio Anwar Sadat, foi entregue ao Egito, por um tratado de paz, a Península do Sinai e a cidade de Sharm el Sheik, com jazidas de petróleo nas suas proximidades.

Felizmente, estão surgindo cada vez mais vozes de muçulmanos esclarecidos, que se negam a permitir que os valores do islã sejam pervertidos pela ideologia da Jihad. Eles dão-se conta de que, desde o surgimento do Estado de Israel, várias gerações de jovens árabes podem freqüentar e se formar nas universidades israelenses, com o que nem poderiam sonhar antes. Estes bem sabem que a cultura do ódio, incentivada com mentiras sobre judeus já nas cartilhas de escolas primárias árabes, é  destrutiva.

Os  árabes esclarecidos, cada vez em maior número, trazem a esperança de que, num esforço comum, pode ser alcançada a reconciliação entre homens e mulheres árabes e israelenses, substituindo a destrutiva cultura do ódio pela construtiva cultura da amizade, da paz e da prosperidade. Resta dizer amém.

Bella Herson é historiadora, autora de Cristãos-novos e seus descendentes na medicina brasileira (Edusp)

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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