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Grupo interdisciplinar da USP investiga com sucesso a chamada terapia fotodinâmica no combate a vários tipos de doença. “Selecionamos os pacientes de acordo com as doenças que estamos estudando e conforme a aparelhagem que desenvolvemos, mas a técnica funciona para qualquer tipo de câncer”, diz o professor Vanderlei Bagnato

Quem nunca ouviu falar dos “milagres” proporcionados pelos tratamentos a laser no campo da medicina e da odontologia? As terapias de clareamento de dentes e recontorno de gengivas são as mais difundidas quando se pensa em estética dentística com uso de laser. Mas pouca gente sabe ou procura o dentista para tratar cáries ou eliminar aftas, herpes labiais, mucosites e outras doenças usando essa técnica. E ainda menos pessoas conhecem outras aplicações possíveis para as fontes luminosas no tratamento de uma série de doenças.

As terapias com laser e um tipo de luz fria chamada LED (diodos emissores de luz) vêm sendo estudadas no Brasil desde 1997, a partir de uma parceria inicialmente firmada entre o Grupo de Óptica do Instituto de Física da USP de São Carlos (IFSC) e o Hospital do Câncer de Jaú (SP). O trabalho pioneiro teve o primeiro paciente tratado a partir de 2000. Desde então, esse tipo de terapia já tratou mais de 2.500 lesões tumorais. A técnica se difundiu e vem sendo aplicada em alguns centros especializados, como o Hospital do Câncer de São Paulo, o Hospital do Câncer de Jaú, Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto, Hospital Sírio Libanês e Incor, em São Paulo. Não bastasse uma taxa de 80% de sucesso para os casos de câncer de pele (não melanoma), pesquisas vêm sendo feitas para aplicar a técnica também em outras doenças.

Alessandra Rastelli
Terapias com laser são estudadas no Instituto de Física de São Carlos da USP desde 1997

O grupo composto por uma equipe multidisciplinar vem estudando a chamada terapia fotodinâmica (TFD) para transplantes de fígado e eliminação de alguns tipos de bactérias e de fungos, tais como a Candida albicans, responsável pela candidíase, de parasitas humanos como o Plasmodium falciparum, causador da malária, e do Trypanosoma cruzi, responsável pela doença de Chagas. A lista não pára por aí. Existem pesquisas clínicas com as terapias fotodinâmicas sendo realizadas em portadores de psoríase e HPV, além de diversos tipos de câncer, incluindo os de boca, esôfago, pulmão, intestino, bexiga e ginecológico. “Selecionamos os pacientes de acordo com as doenças que estamos estudando e conforme a aparelhagem que desenvolvemos. Mas a técnica funciona para qualquer tipo de câncer”, diz o professor Vanderlei Salvador Bagnato, coordenador do Grupo de Óptica do IFSC.

Nos tratamentos odontológicos, o laser também pode ser usado para remoção de fibroma, freios de língua e labiais e remoção de tecidos moles na boca. Como selante dos sulcos dos dentes, apresenta maior eficácia e durabilidade, por isso “ao longo do tempo acaba sendo muito mais barato”, diz a cirurgiã-dentista Rosane Lizarelli, pesquisadora responsável pela área de Odontologia Fotônica do Centro de Pesquisa em Óptica e Fotônica do IFSC. Aplicada na Europa há 40 anos, “a técnica começou a ser vista com maior interesse científico no Brasil nos últimos 15 anos, quando grupos interdisciplinares de pesquisa se formaram para o desenvolvimento de experimentos padronizados”.

“A utilização da LED é especialmente interessante em tratamentos odontológicos porque é uma luz fria. Os dentes são muito sensíveis à alteração de temperatura”, diz Alessandra Narq de Souza Rastelli, pós-doutoranda em Física e Ciências dos Materiais pelo IFSC.

Alessandra Rastelli

Agente fotossensível – A terapia fotodinâmica envolve o uso de um agente fotossensibilizador, ou seja, uma medicação administrada ao paciente algumas horas antes do início do tratamento. As células sadias eliminam essa droga num período que varia de 24 a 36 horas. Depois desse tempo, a substância fotossensível estará mais concentrada nas células doentes, estabelecendo-se uma seletividade e assim o laser poderá ser aplicado com precisão.

Menos invasivo que as técnicas convencionais, o laser funciona como um potencializador da droga usada no tratamento do câncer. As equipes brasileiras utilizam um medicamento russo e o ALA (ácido aminoleculeico), para lesões dérmicas superficiais, “por enquanto”, enfatiza Bagnato, “pois esperamos que em breve seja fabricado no Brasil”.

O agente fotossensível é excitado quando iluminado por uma luz laser de cor específica. Uma vez nesse estado energético, provoca uma reação química com o oxigênio molecular, produzindo uma espécie eletrônica do oxigênio (o chamado estado singleto), altamente reativa para os constituintes celulares e, portanto, bastante tóxica. Como conseqüência disso, a célula tumoral e o tecido como um todo são levados à necrose, eliminando a lesão.
De acordo com Bagnato, a terapia não é indicada para tumores generalizados ou em metástase, uma vez que a região a ser iluminada deve ser uma área determinada. A região deve ter acesso à luz e suprimento de oxigênio. “Sem a ação conjunta do fotossensibilizador, da luz e do oxigênio, não há resultados, a técnica não surte efeito”, diz.

O sucesso da técnica depende de todas as etapas do tratamento, desde o treinamento dos profissionais e os equipamentos e medicamentos utilizados até a determinação exata da dose de luz a ser lançada no tecido-alvo, diz Bagnato. Inicialmente aprovada pelo órgão norte-americano que fiscaliza e controla alimentos, medicamentos e procedimentos médicos nos Estados Unidos, o Food and Drug Administration (FDA), a técnica já vem sendo utilizada nos países mais desenvolvidos.

Francisco Emolo
Bagnato: terapia bem-sucedida

Entre as maiores vantagens da TFD está a maior eficácia dos resultados terapêuticos e cirúrgicos, os quais são, inclusive, esteticamente melhores que os convencionais. Mesmo nos casos em que a remissão completa do tumor não é atingida, a terapia proporcionou melhoras consideráveis e os pacientes não mostraram efeitos colaterais além dos previstos, ou seja, a fotossensibilização dérmica por cerca de 21 dias (o paciente não pode sair à luz nesse tempo). “Mesmo para os casos em que o ato cirúrgico vai deixar marcas permanentes, por razões estéticas a TFD pode ser aplicada com grande sucesso”, diz Bagnato. De acordo com o professor, o maior limitante na utilização da TFD “está mais relacionado às dificuldades de se levar a luz laser até o local do tratamento do que ao tipo de lesão”.

Biópsia óptica – Inventado na década de 1960, o laser é um dispositivo com propriedades importantes que só a partir da década de 1990 começaram a ser aplicadas na medicina. Trata-se de um feixe de luz com alta concentração de energia, a qual apresenta pouca dispersão à medida que a luz se propaga. Essa luz apresenta coerência e monocromaticidade, diferindo grandemente da luz comum, que possui um espectro ou variedade de cores em seu feixe.

Devido à monocromaticidade do feixe de luz, é possível selecionar a cor do laser de forma que a luz só interaja com uma determinada molécula em um universo de várias moléculas. Assim é possível detectar um determinado tipo de átomo na presença de bilhões de outros.

A seletividade propiciada por esse feixe de luz em breve poderá ser usada não só para o tratamento de doenças, mas também para o diagnóstico de tumores. A técnica de espectroscopia de fluorescência já vem sendo chamada de “biópsia óptica”. Num diagnóstico convencional de câncer, o médico geralmente remove um pedaço do material suspeito e o envia para um exame laboratorial, que dirá, com determinado grau de certeza, se a amostra contém células neoplásicas ou não e de que tipo.
A espectroscopia de fluorescência se baseia na excitação da amostra por radiação em comprimentos de onda curtos (ultravioleta e raios visíveis) e a observação da resposta luminescente da amostra em comprimentos de onda longos (visível). “A luz interage com o tecido e, de acordo com a resposta do espectro de fluorescência emitido pela amostra, tiramos as informações se ele é neoplásico ou não”, afirma o professor. A técnica já vem sendo usada como ferramenta de diagnóstico de aterosclerose, displasias no cólon, câncer no esôfago e alguns tipos de câncer do pulmão e bexiga.

 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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