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A partir da análise de dois cursos de formação continuada de professores de primeira infância (0 a 5 anos) para o combate ao racismo, a pedagoga Lucimar Rosa Dias constatou que esse tipo de iniciativa traz resultados positivos para a educação das crianças. “De acordo com o relato  das educadoras, a amizade entre os alunos aumentou e eles passaram a considerar todas as diferenças – e não apenas aquelas ligadas à cor da pele – como algo positivo, tendo o aprendizado sobre as questões étnico-raciais ajudado a compreender outras diferenças”, conta.

Esses cursos apresentam um conteúdo específico sobre um tema e o educador, por meio de práticas pedagógicas, colocará isso em prática junto a seus alunos em sala de aula. “O educador pode propor às crianças oficinas de bonecas negras para trabalhar a questão da aparência, ou então faz uma releitura dos contos de fada, como contar a história de uma Rapunzel negra, para que os alunos percebam que reis e rainhas também podem ser negros”, explica a pedagoga. “Com isso, são levados a refletir e a questionar a visão inferior-superior que se tem a respeito de pessoas brancas e negras.”

Lucimar pesquisou o tema para sua tese de doutorado, defendida na Faculdade de Educação da USP no dia 20 de março. Ela analisou as experiências de um curso realizado na cidade de Campinas (SP), oferecido pela Secretaria Municipal de Educação,  e de um outro, em Campo Grande (MS), da Secretaria de Estado da Educação. “Há cursos de formação continuada com diversos formatos. Os analisados na pesquisa tinham duração de 60 horas”, explica. O estudo foi orientado pela professora Denice Barbara Catani.

Coragem – Lucimar propõe, em sua pesquisa, cinco itens que podem auxiliar na implantação dos programas de formação de professores no combate ao racismo. Ela considera fundamental valorizar as próprias experiências e saberes pessoais dos educadores; uso de recursos como filmes, livros e artes plásticas, que tragam referências a personalidades negras; não restringir o estudo do tema apenas sob o aspecto da educação e ir buscar embasamento em outras áreas, como a sociologia e a antropologia; e trabalhar o assunto constantemente em sala de aula e não apenas em situações especiais, como no Dia da Consciência Negra, por exemplo.

Já o último item é ligado à coragem. “Muitos educadores relataram episódios de preconceitos, em que as atividades de combate ao racismo dentro de sala de aula não foram bem recebidas por algumas pessoas da escola, enquanto outros foram questionados sobre a real necessidade de desenvolver essas atividades”, conta. “Isso mostra que ainda hoje é necessário ter muita coragem e empenho para tratar questões étnico-raciais em sala de aula.”


Valorização das experiências pessoais do educador, uso de recursos como filmes e artes plásticas e auxílio de outras áreas do conhecimento, como sociologia e antropologia, estão entre as recomendações da pedagoga Lucimar Dias para as escolas

A pedagoga entrevistou dez educadoras (cinco em Campo Grande e cinco em Campinas) e técnicos responsáveis pelo assunto nas Secretarias de Educação. Além de comparar as duas cidades, a pedagoga fez também um levantamento das experiências ocorridas no Brasil entre 1979 e 2003. “No ano de 1978, com a retomada dos movimentos sociais, aconteceu a reorganização do movimento negro no País”, esclarece. “E, em 2003, houve a aprovação da Lei Federal 10639/03, que modificou a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) ao instituir a obrigatoriedade de os sistemas de ensinos municipal, estadual e federal incluírem aulas de estudos das questões étnico-raciais em seus currículos”, completa.

Antes da existência da lei, vários municípios brasileiros já haviam incluído o tema, como Salvador (1989), Belo Horizonte (1990), Porto Alegre (1991), Diadema, Belém (1994), São Paulo, Distrito Federal (1996), Criciúma (1997), Teresina (1998), Campo Grande (1999) e Campinas (2000). “Escolhi Campo Grande pelo meu próprio envolvimento na criação dessa política naquela cidade e Campinas por eu ter recebido boas indicações sobre a experiência implantada lá”, conta.

De acordo com Lucimar, em Campinas esse tipo de formação continuada já é uma política pública e oferece um núcleo específico onde os educadores encontram material para trabalhar com o tema. É o Programa Memória e Identidade: Promoção da Igualdade na Diversidade (Mipid). “Esse mesmo apoio institucional não foi verificado em Campo Grande”, conta a pedagoga. “Na capital mato-grossense-do-sul não houve, além do curso, nenhum outro investimento oferecido aos educadores para que trabalhassem o tema em sala de aula”, explica Lucimar. “Mas mesmo assim conseguimos encontrar experiências positivas nas duas cidades”, conclui.

 
 

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O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
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