PROCURAR POR
 NESTA EDIÇÃO

 

©  Francisco Emolo

Com um atendimento de referência a uma população de 40 mil pessoas por ano, o Centro de Saúde-Escola Professor Samuel B. Pessoa, da Faculdade de Medicina da USP, completou 30 anos de atenção à saúde e à formação de recursos humanos. A data foi comemorada com uma solenidade e um seminário, intitulado Os Centros de Saúde-Escola e os Desafios do Ensino na Produção do Conhecimento e Atenção Primária à Saúde, realizados no dia 5 de julho na Faculdade de Medicina.

Além dos pacientes, o Centro de Saúde-Escola Samuel B. Pessoa acolhe os alunos de graduação de medicina, fonoaudiologia, fisioterapia e enfermagem e médicos residentes em pediatria, medicina da família e comunidade e medicina preventiva, para dar continuidade à formação acadêmica. Ele foi criado há três décadas a partir de um convênio entre a USP e a Secretaria de Estado da Saúde, com o objetivo de oferecer um espaço de ensino na área de saúde que não fosse exclusivamente hospitalar e superespecializado. “Naquela época o ensino médico era centrado no Hospital das Clínicas. O aluno raramente via o paciente ao longo da sua formação. A proposta era ter um espaço ambulatorial mais próximo da realidade da população, que fizesse atenção primária e desse continuidade no atendimento ao paciente”, explica o médico Ruben Kon, diretor-técnico do centro de saúde-escola.

©  Francisco Emolo
Atendimento à população: história de
dedicação à saúde pública

Por atenção primária define-se o primeiro nível de atenção dado ao paciente dentro do sistema de saúde, que é caracterizado por ser a referência mais imediata da população e se basear na promoção e prevenção da saúde. O posto de saúde, o centro de saúde, a unidade básica de saúde têm esse caráter de primeiro atendimento. A população sabe que nesse espaço encontra-se um serviço de referência e que pode contar com ele para todo cuidado ao longo do tempo. Kon ressalta que é a partir dessa porta de entrada que o indivíduo pode ser encaminhado para níveis mais especializados do sistema de saúde. “Uma consulta ou exame especializado, assim como para uma internação.”

O diretor lembra que a ênfase dada não é no atendimento curativo, mas em ações de promoção da saúde e qualidade de vida e de prevenção, que são combinadas com o atendimento dos problemas mais corriqueiros através de profissionais com um perfil mais generalista. “Não há o atendimento especializado, com o cardiologista, o dermatologista, mas há o clínico, o pediatra, o sanitarista e o psiquiatra.”

A missão do Centro de Saúde-Escola Butantã, como é mais conhecido, é sempre combinar a assistência ligada ao ensino e à pesquisa. Segundo Kon, no campo da pesquisa há várias abordagens. Para a área de tecnologias de assistência e atenção primária, as pesquisas vêm pensando formas de organização que combinam profissionais com modalidades de assistência e formas de enfrentar as necessidades de saúde.

©  Francisco Emolo

Projeto São Remo – Outras linhas de pesquisas ligadas a problemas e situações comuns à saúde trabalham com a questão de violência de gênero, com o atendimento ao homem no serviço de atenção primária, já que este é um individuo refratário para cuidar da saúde. É uma pesquisa voltada para a questão do acolhimento, ou seja, busca-se saber como se consegue desenvolver em um serviço de saúde uma relação mais humanizada com o indivíduo que procura esse atendimento. Há ainda pesquisas sobre patologias mais comuns nas crianças, como doenças respiratórias e desnutrição.

A pesquisa sobre violência de gênero na saúde se tornou um trabalho de referência regional, gerando inclusive uma modalidade de atendimento específico, chamada Confad – Conflitos Familiares Difíceis. Kon esclarece que esta foi uma pesquisa feita em colaboração com outros centros semelhantes e serviu para evidenciar o fato de que a violência era uma presença muito constante no serviço de saúde, mas nem sempre reconhecida. “Muitos usuários procuravam intensamente nossos serviços e tínhamos dificuldade de caracterizar o problema do paciente. Ao aprimorarmos o olhar para a questão da violência, começamos a perceber que o problema não é uma patologia bem definida, mas uma vontade de expressar sua situação de violência, pedindo socorro.”

Essa pesquisa gerou tanto uma modalidade de assistência como também uma proposta de organização dos serviços para dar respostas concretas às pessoas que sofrem violência, gerando conhecimento para estar atento às formas de aparecimento do problema da violência, que nem sempre são explícitas, esclarece Kon.

O centro de saúde procura também desenvolver projetos de extensão e assistência que possam contribuir para a melhoria do atendimento.

O Projeto São Remo é um deles e já está em andamento há seis anos. É inspirado no programa Saúde da Família e busca repensar essa modalidade de atendimento para oferecer ao programa novas alternativas de trabalho.

Atualmente o projeto conta com 12 agentes comunitários de saúde, moradores da comunidade São Remo – localizada nas proximidades da Cidade Universitária, em São Paulo –, que foram treinados, selecionados e contratados e atuam diretamente no bairro em programas vinculados ao centro de saúde-escola. A atuação dos agentes é baseada em visitas às famílias, desenvolvendo algumas frentes de trabalho específicas. Fazem assistência a todas as crianças nascidas no bairro, assim como um acompanhamento intensivo e prolongado para aquelas identificadas como casos de risco – nascimento com baixo peso, com alguma patologia, ou se são de alguma família especialmente desestruturada –, além de identificar as necessidades dessa família e mediar possibilidades de intervenção do serviço, diminuindo os riscos da criança adoecer e morrer.

Os agentes também desenvolvem oficinas entre grupos de diferentes faixas etárias para discutir temas de saúde, crianças, adolescentes e idosos. Exemplos disso são as questões do lixo, da saúde e da sexualidade. Já com os idosos há um trabalho de resgate da memória.

Kon conta que em 2006 foi feito um projeto para resgatar a memória dos idosos, baseado em fotos dos objetos que remetiam à história de vida das pessoas. “Queríamos resgatar a história deles para valorizar o papel do idoso dentro dessa comunidade.”

Evermando dos Santos Santana há seis anos exerce a função de agente comunitário de saúde no Jardim São Remo. Morador do bairro, une seu conhecimento de cidadão ao de agente comunitário ajudando famílias mais vulneráveis com informações sobre saúde e cidadania. Também ajuda em atividades comunitárias para a melhoria do ambiente. “Com esse trabalho vejo melhor os problemas do bairro. Procuro promover nas famílias uma atitude de ir em busca do que é de direito delas”, ressalta.

Atenção domiciliar – Junto com o programa dos agentes comunitários da comunidade São Remo há um programa de atenção primária domiciliar. Formado por uma equipe multiprofissional, atende em domicílio os indivíduos que por diversos motivos têm dificuldade de se locomover até o centro de saúde, ou por limitação física, ou por estar acamados, até por problemas sociais e econômicos, como também a mãe que não consegue trazer o filho pequeno porque trabalha. “Nosso trabalho é dar assistência primária, em casa, para essas pessoas, procurando contribuir para o desenvolvimento de uma tecnologia de atendimento que possa ser aplicada em outros centros de saúde”, esclarece o diretor-técnico.

Para os adolescentes foi criado o projeto bate-papo. Como os jovens são outro grupo muito resistente aos serviços de atendimento à saúde, entendeu-se que o contato com eles é mais produtivo fora dos serviços de saúde, como nas escolas ou em outros espaços de encontro.

A equipe do centro de saúde fez um trabalho nas escolas da região e identificou jovens com interesse em trabalhar a questão saúde e juventude. Com treinamento e capacitação, os jovens tornaram-se multiplicadores e formaram uma ONG chamada Jovem Inventivo. Atualmente a sede fica em um contêiner, comprado com recursos próprios, e se encontra no pátio do Centro de Saúde-Escola Butantã. Kon conta que eles desenvolvem trabalhos em diversas regiões, procurando criar espaços para que o jovem se identifique com a atuação do núcleo de saúde e encontre abrigo para as suas questões, que são muito específicas e não podem ser tratadas de maneira convencional. “O jovem não vem aqui para ficar esperando pela consulta, nunca se acha doente. Ele está aberto para outras formas de discussão da saúde.”

 

 

ir para o topo da página


O Jornal da USP é um órgão da Universidade de São Paulo, publicado pela Divisão de Mídias Impressas da Coordenadoria de Comunicação Social da USP.
[EXPEDIENTE] [EMAIL]