Morre de COVID19 o jornalista Marcello Bittencourt, da Rádio USP

Ex-diretor da emissora era detentor de dois Prêmios Jabuti por sua dedicação aos livros e à leitura

O radiojornalismo – em especial a Rádio USP – está de luto. Morreu nesta quinta-feira, dia 30 de abril, o jornalista Marcello Bittencourt, aos 68 anos, vítima de covid-19. Ex-diretor da Rádio USP – onde atuou por mais de 35 anos –, Bittencourt produzia atualmente o programa Biblioteca Sonora, em que abordava o lançamento de livros e entrevistava autores. Por seu trabalho em favor do livro e da leitura, ganhou duas vezes o Prêmio Jabuti, a maior honraria na área da literatura no Brasil, concedido pela Câmara Brasileira do Livro (CBL). Formado em Sociologia, era mestre em Jornalismo pela Escola de Comunicações e Artes (ECA) da USP, com a dissertação Ficção e Realidade – O Rádio como Mediador Cultural, apresentada em 1999, sob orientação da professora Gisela Ortriwano. O corpo do jornalista sairá às 8 horas do Hospital das Clínicas (HC) para o Cemitério Getsêmani, em São Paulo. Não haverá velório, em razão da proibição de aglomerações.

“Bittencourt foi um dos maiores profissionais com quem tive a honra de trabalhar”, afirma o radialista Dagoberto Alves, supervisor da Rádio USP. Ele destaca o profissionalismo, o cuidado e o preciosismo do jornalista. “Quando ia entrevistar um escritor, ele lia o livro e incorporava os personagens, de modo que surpreendia até o próprio autor”, diz o radialista. “Ele não fazia perguntas simples, mas abordava questões profundas, o que também surpreendia o entrevistado.”

Alves acrescenta que Bittencourt era o que se chama, no jargão dos radialistas, “rato de estúdio” – aquele produtor que passa o dia inteiro no estúdio, ouvindo várias vezes as gravações, tirando ruídos e aperfeiçoando o áudio até que ele esteja perfeito para ir ao ar. “Como pessoa, era muito generoso, com um coração enorme.”

Caricatura de Marcello Bittencourt feita pelo artista João Monteiro, amigo do radialista. Disponível no site do Jornal da USP.

 

O mesmo perfil de Bittencourt é traçado pela jornalista Lygia Trigo, diretora da Rádio USP entre 1994 e 2004. Para ela, o jornalista – além de carinhoso e generoso com os colegas – era “inteligentíssimo, talentoso e extremamente criterioso”. Emocionada com a morte do colega, ela acentua que o jornalista abriu “todo um campo” dentro do rádio ao priorizar a literatura. Ao criar o programa Vamos Ler – antecessor do Biblioteca Sonora –, ele ampliou a difusão de livros, de autores e de ideias de uma forma sem precedentes no País. “Bittencourt tinha um jeito largado, que convivia tranquilamente com o perfeccionismo dele no trabalho”, lembra Lygia, confirmando que Bittencourt, ao fazer suas edições, buscava sempre a perfeição. “Era realmente um perfeccionista.”

“Ele me confessou, a um tempo sério e brincalhão – como era seu costume –, ter criado o programa no intuito de não precisar ter de comprar livros”, revela outro colega de trabalho, o jornalista Jurandir Renovato, editor da Revista USP.

“Bittencourt se dedicou totalmente à Rádio USP. A rádio era a grande paixão da vida dele”, confirma, também emocionado, o irmão do jornalista, o arquiteto Maurício Bittencourt. Ele é testemunha da dedicação do irmão à emissora e à causa da cultura no Brasil. “A vida toda ele gostou de ler. Quando a gente era criança, ele passava o tempo entre as partidas de futebol e os livros”, diz Maurício, lembrando os tempos de infância vividos no bairro paulistano da Pompeia, onde Bittencourt morou até o fim da vida. O arquiteto lembra as preferências do irmão: gostava de rock – era fã dos Rolling Stones e assistiu ao show da banda inglesa Queen no estádio do Morumbi, em São Paulo, em 1981 – e torcia para o Palmeiras. “Ele era verdadeiro. Não se importava com as aparências, mas com os relacionamentos, com os outros, e sabia que ninguém é melhor do que ninguém”, relembra Maurício. “Era uma pessoa maravilhosa. Merece mesmo todas as homenagens.”

A rádio USP publicou um podcast para homenagear Bittencourt. Clique aqui para ouvir o conteúdo.