A crítica rosiana voltada para “Campo geral” é unânime no destaque à maestria do
escritor ao fazer o leitor conviver com a interioridade do protagonista em que predominam
enorme sensibilidade e criatividade em meio a grandes dificuldades e sofrimentos. Como o
narrador é heterodiegético e a imagem que se constrói dele é de adulto, pergunta-se como o
leitor, além de ter acesso à vida interior do protagonista, à sua visão do mundo, reconhece o
linguajar infantil que emerge no discurso desse narrador caracterizado por forte componente
poético. O objetivo desta dissertação é procurar demonstrar que tal possibilidade decorre da
combinação entre narrador heterodiegético e focalização interna fixa (de acordo com
proposições genettianas) que parte do protagonista, permitindo, assim, configurar a relação
dele com a realidade que o cerca, em especial, e o mundo dos adultos, com as asperezas do
universo sertanejo. E é essa combinação que leva à constituição de um discurso ao mesmo
tempo altamente poético e revelador do linguajar infantil do protagonista. Para cumprirmos tal
objetivo analisamos, principalmente, o protagonista, o narrador, a focalização como
categorias que, organicamente construídas, têm sua expressão no mencionado discurso
poético estilizadamente infantil. O embasamento teórico da pesquisa é constituído por dois
grupos de estudos. Em primeiro lugar, estão os ensaios críticos sobre a obra rosiana em geral
e sobre a novela em pauta em particular como “O homem dos avessos” de Antonio Candido,
“O motivo infantil na obra de Guimarães Rosa” de Henriqueta Lisboa, O léxico de Guimarães
Rosa de Nilce Sant’Ana Martins, “Guimarães Rosa: um alquimista da palavra” de Eduardo F.
Coutinho, entre outros. Um segundo grupo é formado por proposições teóricas sobre a
construção da narrativa como O discurso da narrativa de Gérard Genette e sobre a prosa
poética e poesia como O ser e o tempo da poesia de Alfredo Bosi, Linguística e comunicação
de Roman Jakobson, O arco e a lira e Os filhos do barro de Otávio Paz e Conceitos
fundamentais da poética de Emil Staigner.