Diferentemente de outras teorias mais próximas da retórica, a semiótica da Escola de Paris nunca foi muito pródiga ao tratar dos problemas de persuasão e argumentação. A partir de uma constatação simples como essa, procuramos, neste artigo, pôr à prova certos dispositivos semióticos que têm suas consequências nesse domínio, a começar pela problemática modal do crer e do saber. Seus valores são examinados num tipo de situação específi ca, a saber, quando as personagens confrontadas se acham em circunstância de ameaça imediata a sua integridade física. Nesse sentido, discutimos três tópicos principais: (i) a interação dos valores modais do saber e do crer, componentes de um mesmo universo cognitivo; (ii) as modulações tensivas do medo e das paixões correlatas; (iii) as formas de raciocínio inferencial mobilizadas pelas personagens do relato, e notadamente as ilações abdutivas postas em cena. O texto escolhido para a verifi cação do alcance e dos limites de tais dispositivos semióticos é o conhecido conto de Guimarães Rosa, ?Famigerado? (Primeiras estórias, obra originalmente publicada em 1962).
Este artigo coteja duas visões de construção do sentido, uma formulada de maneira científi ca pela semiótica de Algirdas Julien Greimas e outra elaborada em termos literários pela pena de João Guimarães Rosa. A partir de uma análise do conto ?Nenhum, nenhuma?, do escritor brasileiro, o autor desvenda as oscilações tensivas (de intensidade e extensidade) que regulam a trama narrativa da história, mostrando que os diferentes graus de tonicidade e/ou velocidade dos afetos revelados pelas personagens confi guram com maior precisão as causas de seus encontros ou separações. O próprio enunciador manifesta sua fi delidade a uma das personagens do conto por meio de ajustes tensivos (ambos cultivam a duração, a longevidade) que asseguram entre eles uma identidade profunda. Esse plano de interação difi cilmente seria reconhecido por um enfoque exclusivamente narrativo e discursivo.