texto: Circe Bonatelli
fotos: Cecília Bastos

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

© Francisco Emolo
Lin Tchia Leng, professora da Faculdade de Medicina da USP

 

 

 

 


Sabe para que serve a dor? Ela é um sinal emitido pelo corpo alertando que algo está errado. É um belo mecanismo da natureza, não? É, mas falta só um detalhe: descobrirmos o que está errado quando o alarme soa.

Principalmente quando a dor se arrasta por meses, como aconteceu com Maria Aparecida Sales, funcionária da FEA (Faculdade de Economia, Administração e Ciências Contábeis). "Até descobrir como curar minha tendinite, tomei muito antiinflamatório", conta. "Eu tinha dores no ombro, não arranjava posição para dormir à noite... e fiquei muito abalada pela falta de disposição." Maria Aparecida só conseguiu melhorar depois de seis meses de acupuntura afastada do trabalho.

Ocasionalmente, todos sentimos dores temporárias que desaparecem naturalmente após algumas horas ou poucos dias. Estima-se que 85% da população em fase adulta tem ou já teve dores agudas. Já em outros casos, as dores persistem, acompanhando o sujeito por meses ou anos.

A dificuldade em resolver o problema crônico está na inexistência de uma relação direta entre causa e dor. A mesma lesão pode provocar sensações diferentes em cada pessoa, ou até mesmo sensações diferentes na mesma pessoa ao longo dos dias.

A dor é resultante de um ou mais fatores internos e/ou externos, o que deixa seu diagnóstico e tratamento mais complexos. Por isso, as causas psicossomáticas, que envolvem estrutura física e emocional, assumiram uma importância tão grande quando o médico investiga o diagnóstico.

Para clarear melhor o assunto, a Sociedade Brasileira para Estudo da Dor, entidade autônoma de pesquisas na área, fez uma divisão dos fatores em três partes: biológicos – lesão, condição física e efeito colateral de medicamentos –, sociais – suporte social, relação familiar e influências culturais – e psicológicos – comportamento, grau de conhecimento e personalidade. A idéia é vasculhar a conjunção de variáveis suspeitas de causarem dor.

“Em diversos casos, não houve nenhuma lesão. A pessoa é que joga suas frustrações e estresses para o corpo,” aponta Lin Tchia Leng, professora da Faculdade de Medicina da USP. “O resultado é que a parte mais fraca adoece e surge um problema cervical, uma úlcera, uma depressão ou outras formas de dor.”

Para mostrar como a personalidade, por exemplo, é capaz de influenciar na saúde, a professora dá o exemplo de sujeitos pessimistas. “Aquelas pessoas de perfil hipocondríaco, que olham para tudo como uma catástrofe, têm tendência a adoecer porque não conseguem relaxar,” diz.

Entre os aspectos multifatoriais que provocam dores, a professora cita alguns dos principais motivos que passam despercebidos pela maioria da população. Veja o quadro:

Sono: ele proporciona relaxamento físico e mental. Em caso de noites maldormidas e insônia, há predisposição para início ou agravamento de dores musculares.

Estresse: o corpo se prepara para a “luta”, com aumento da freqüência respiratória e cardíaca, diminuição das funções digestivas e dilatação das pupilas. Quando o estresse é diário e a pessoa não tem chances de reagir, o quadro se torna crônico, resultando em baixa da imunidade, úlcera, dores de cabeça e disfunção sexual.

Obesidade: o excesso de peso compromete as articulações, provocando dores nos pés, tornozelos, joelhos e quadris.

Nutrição: dietas que exageram na perda de peso e o hábito de passar horas sem comer nada induzem o organismo a queimar a energia presente nos músculos.

Sedentarismo: a falta de atividades físicas deixa os músculos flácidos e instáveis, vulneráveis a lesões quando submetidos a um esforço maior, como levantar um objeto pesado.

Cigarro: o fumante absorve substâncias tóxicas que comprometem o disco intervertebral, que funciona como um amortecedor entre as vértebras da coluna. Um forte candidato a dor nas costas.

“A dor gera incapacidade e a pessoa acaba ficando ansiosa. Ela perde produtividade no trabalho, fica desanimada, depressiva, compromete sua relação com a família, o convívio social e a parte sexual”, afirma a médica Lin Tchia Leng. “Ainda assim, muitas pessoas não tomam consciência sobre a necessidade de se dedicarem ao tratamento.”

Lin se refere aos muitos pacientes que demoram para aderir às soluções propostas, porque esperam encontrar resultados mais imediatos através de remédios. No entanto, o tratamento requer mudanças no estilo de vida. Como evidenciam os itens do quadro, não há comprimido para sedentarismo ou postura durante o sono.

“Recebi um engenheiro que já estava no sexto médico reclamando de dores cervicais. Ele passa horas sem comer, não faz exercícios, é estressadíssimo e dorme mal. Para relaxar, toma dois copos de uísque. No caso dele, é preciso fazer os ajustes como o controle do estresse, melhoria na alimentação e acertar a postura. Aí, ele me perguntou se não tem comprimido para tudo isso!”

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