O seguinte artigo tem como objetivo analisar o romance de Guimarães Rosa, Grande sertão: veredas, através de um sertão ontológico. Em um primeiro momento, esse sertão é dividido por dualidades que atingem o ser tanto nas questões mais pontuais do romance – Os Gerais e a Bahia; os bandos de Joca Ramiro e do Hermógenes –, quanto nas mais complexas – bem e mal; luz e trevas; deus e o diabo. Conforme a narrativa vai se desenvolvendo, essas questões dialéticas, simbolizadas pelas margens do rio São Francisco, são vencidas, deflagrando um processo chamado Ritmanálise. Esse movimento tem constante relação com o termo travessia, a chave do romance para a compreensão da obra, e palavra reveladora do sertão ontológico, interior de Riobaldo, o ser-tão.
Romance mundialmente conhecido de Guimarães Rosa, Grande sertão: veredas se apresenta como um diálogo, uma vez que se inicia com um travessão inicial, porém não dá voz ao suposto receptor. Para quem, então, se está narrando? A partir desse estranhamento nos debruçamos sobre um estudo acerca da palavra diálogo, que tem como prefixo –dia e radical logos, nos levando aos primeiros pensamentos da Grécia Antiga com Heráclito de Éfeso. Os desdobramentos do lógos heraclítico abrem caminho para entender a natureza rosiana, que resgata a sua origem grega physis, bem como a palavra travessia. Esta, por conseguinte, revela múltiplas veredas pelo sertão narrado por um Riobaldo que quer saber da “matéria vertente”. Faz-se, portanto, um jogo de palavra a partir do radical vertere, que dialoga com os principais elementos poéticos de Rosa, bem como decifra o caráter transcorrente de uma estória contada por um narrador que transborda sua existência para o texto narrado, fluidamente, como um rio, semelhante ao de Heráclito, no qual não adentramos duas vezes.
Physis e Lógos: Riobaldo e a travessia das águas mitopoéticas no Grande Sertão tem como objetivo investigar o comportamento das águas emGrande sertão: veredas através do estudo da narrativa em forma de diálogo, travado pelo narrador e protagonista Riobaldo. No título da dissertação confluem os principais conceitos trabalhados, ressaltando a importância da travessia e do rio – esse contido no nome do personagem – sob a visão da physis e do lógos, palavras que se aproximam e desvelam a via de acesso para se interpretar o sertão mitopoético e seus afluentes. Dividida em três capítulos, cada um com três seções, a dissertação discorre primeiramente sobre a natureza do próprio sertão para focalizar as imagens dos principais rios da obra: o São Francisco, o de-Janeiro, o Urucuia e o misterioso “rio do pacto”, que surge no momento em que Riobaldo invocao diabo. Ao dissertar sobre as transformações da água, o último capítulo se dedica a interpretar o conceito de travessia no romance de Guimarães Rosa. Ao final, na última seção,uma recapitulação de todos os fundamentos propostosnos demais capítulos permitesubstanciar a reflexão sobre o principal rio da obra: o Rio baldo e a potência transformadora do seu narrar.