O presente artigo tem dois objetivos concernentes à tradução, por João Guimarães Rosa, do romance condensado Last of the Curlews (1954), do escritor canadense Fred Bodsworth, sob o título de O Último dos Maçaricos (1958). O primeiro diz respeito ao contexto da tradução, e busca compreender certos aspectos do processo tradutório, desde a motivação para fazê-lo até o uso de material bibliográfico técnico de ornitologia como apoio. O segundo se refere ao texto traduzido, e procura realizar descrição e análise de determinados trechos que demonstram a preocupação do escritor mineiro em produzir, em português, uma obra relevante poeticamente, ainda que a linguagem do original em inglês seja diversa daquela de radicalidade que caracterizou a obra própria de Rosa. Para alcançar tais fins, são utilizados – além do original e da tradução – documentos, depoimentos de terceiros e correspondência com seus tradutores italiano e alemão.
Dividida em três capítulos, esta dissertação se propõe a pensar a
temática do luto no Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa, principalmente na reação de Riobaldo à morte de Diadorim. Em um primeiro momento, a leitura do romance é feita com base nas concepções de dois pensadores do luto, Sigmund Freud e Jacques Derrida – o primeiro com uma perspectiva de um luto superável, enquanto o segundo, ao inseri-lo em uma esfera ética e engendrar crítica à compreensão freudiana, considera o luto um processo impossível. Em seguida, procura-se descrever o luto do narrador e demonstrar que ele contém características singulares, nomeando-o “luto manejável”, sendo esse aquele que se faz por uma outra metade de si. Por fim, intenta-se reconhecer na própria linguagem do romance – em procedimentos tal quais o anacoluto ou a repetição – as
marcas desse processo, aproximando-o finalmente do gênero diário de luto.