O monólogo de Grande Sertão: veredas se constrói a partir da descrição do um mundo real: o sertão nacional regido pela violência típica do coronelismo naquele início de século. Essa realidade, todavia, situa-se tão distante do cotidiano dos brasileiros letrados, que termina parecendo muito mais próxima do mito do que de uma experiência factível. Desde o início do romance regional no Brasil, tais cenários e lendas têm oferecido um material riquíssimo para a fabulação e o fazer literário. Mas foi na experiência traumática, na violência das ações e dos discursos do sertão, que Guimarães Rosa buscou o universo de significados com os quais compôs sua obra capital. Através de uma fala cheia de exaltações, confissões e lamentos, Riobaldo expõe o testemunho de fatos espantosos, experiências da intensa barbárie ante a ausência das leis oficiais do país. Como garantia de construir um discurso relevante, o narrador procura resgatar uma certa “época dos heróis” e seus feitos extraordinários. Desse modo, os jagunços são apresentados não apenas como brutos agindo por instinto, mas também como sujeitos que encontraram na luta (ou na guerra) a única possibilidade de expressão. Numa constante procura pela verdade das coisas, o narrador depara a todo instante com a dualidade que existe nos significados de seu mundo, o ser e o não ser de tudo, a dialética entre bem e mal. Tal atitude faz parte da ambiguidade formal que perpassa todo o romance e culmina com uma atitude que pode apresentar a violência tanto como destrutiva quanto como reveladora das virtudes humanas. Neste estudo proponho que a violência seja o elemento estruturante do romance de Guimarães Rosa, uma vez que, desde o conteúdo até a forma, as imagens da violência conferem uma força singular ao discurso da obra.