O texto busca refletir sobre algumas passagens da trajetória artística e intelectual do artista plástico mineiro Arlindo Daibert que antecipam e iluminam aspectos da série G.S.:V, realizada por ele entre 1981 e 1993 como uma tradução plástica do romance de João Guimarães Rosa. O texto trata com especial interesse de duas questões que emergem e se entrecruzam na obra e nas preocupações teóricas do artista — as relações entre a imagem e a escrita e a apropriação crítica das tradições pictóricas e literárias —, buscando compreender como elas marcam o desenvolvimento de sua concepção de desenho como "forma de raciocínio", e de seu trabalho em G.S.:V. como uma espécie de "ensaio plástico" que não se limita ao interior da obra literária, mas explora suas relações com o biográfico e o auto-biográfico, com o dado histórico, com elementos do cotidiano, com referências artísticas e culturais diversas, com a tradição e a contemporaneidade, revelando uma visão da arte como "diário de bordo" em ininterrupto diálogo com a realidade.
O trabalho toma a série de setenta e um desenhos, colagens, aquarelas e xilogravuras G.S.:V. – uma tradução em imagens do romance Grande sertão: veredas, de João Guimarães Rosa, feita pelo artista plástico mineiro Arlindo Daibert – como recriação de processos descritivos e descrição de processos criativos do romance. Parte-se do pressuposto de que, ao se esquivar do compromisso tradicional da ilustração com o encadeamento e o conteúdo narrativos, de modo coerente com sua concepção de desenho como forma de raciocínio e com seu próprio projeto artístico, Daibert consegue retomar e desdobrar algumas das questões estéticas, culturais e históricas mais importantes do romance, através do estabelecimento de uma cartografia que se caracteriza antes pela mescla de referências que pela fixação de limites entre elas. Buscou-se abordar essas questões de forma a estabelecer, adicionalmente, um estreito diálogo com a crítica especializada da obra de Guimarães Rosa, não a fim de legitimar as reflexões visuais através da crítica literária, mas ao contrário, a fim de mostrar o quanto ambas podem ganhar em mútua colaboração.
A dissertação investiga os contos de Primeiras Estórias, de João Guimarães Rosa, em termos da subversão de algumas metáforas conceituais convencionalizadas - conhecimento como visão, estados como lugares, propósitos como destinos, mudanças como movimentos, e algumas outras, tais como descritas pelos cognitivistas George Lakoff, Mark Johnson e Mark Turner - e em termos do vínculo entre esta subversão e o conflito instaurado entre os modos de vida dos personagens.