A partir da leitura crítica de Luiz Tatit e Marília Librandi Rocha, este trabalho procura demonstrar a relevância de duas forças aparentemente opostas na composição do conto “Nenhum, nenhuma” de Guimarães Rosa: uma disjuntiva, que diz respeito ao tempo enquanto agente desagregador capaz de nos transformar em estranhos de nós mesmos; e outra conjuntiva, a latência. As cinco personagens estariam decididamente disjuntadas ou seriam uma o estado de latência da outra? O trabalho conclui com o triunfo da ambiguidade: não a prevalência, mas a presença vacilante de ambas as forças. Assim, o conto mantém uma poética enarmônica - conceito musical que expressa a diferença naquilo que contém a mesma substância - ilustrada no paradoxo final deixado pelo narrador: “eu; eu?”.
O primeiro índice do livro Corpo de Baile (1956) de João Guimarães Rosa, de caráter emissivo, classifica o conto "Cara-de-Bronze" como um "Poema"; o segundo, de caráter remissivo, classifica-o como uma "Parábase". Esta dupla identidade, no entanto, não se anula, mas se complementa: o conto pode ser lido como uma "Parábase da Poesia", um comentário metatextual do autor sobre seus próprios procedimentos poéticos. Para tanto, Guimarães Rosa elabora um projeto narrativo inusitado, sobretudo híbrido. Estão presentes diversas formas de representação textual para expressões artísticas cujas plenas realizações se dão somente fora do livro, como o cinema, o teatro e a canção, criando assim uma tensão insolúvel entre texto e performance. Esta dissertação procura entender a relação entre a forma híbrida e o conteúdo parabático, trabalhando com a hipótese de que a arquitetura única e exemplar de "Cara-de-Bronze" está desenhada para ilustrar a função hiperdeterminante da poesia e seu paradoxo de representação.