Propomos uma análise de Tutaméia — Terceiras Estórias, último livro publicado em vida por João Guimarães Rosa (1967), com ênfase em seus paratextos. Nossa hipótese inicial é que a composição de Tutaméia seja orientada por um projeto estético que prima pela velhacaria, a astúcia do sertanejo. Nosso objetivo é traçar, a partir dos elementos analisados, um esboço de projeto literário do autor. Sobre esta obra existem apenas alguns artigos e citações esparsas, além das leituras de Simões (1988) e Novis (1989). Simões (1988) orienta sua leitura pelos prefácios do livro, enquanto Novis (1989) desvenda suas intratextualidades. Ora, tanto os prefácios quanto as intratextualidades, assim como os paratextos e as intertextualidades, constituem o que Genette chama de transtextualidade do texto. A leitura dos elementos transtextuais em Tutaméia remete-nos a questões fundamentais para Guimarães Rosa, que explora em suas obras a ambigüidade das regiões fronteiriças. É na fronteira do livro que se situam seus paratextos, dispostos em Tutaméia de modo a suscitar dúvidas quanto a seu valor de verdade ou de ficção. Realizamos, nesta dissertação, uma análise de elementos paratextuais de Tutaméia — título, orelhas, índices, listas e dois de seus prefácios, “Aletria e hermenêutica” e “Hipotrélico” — para, a partir deles, chegar às diretrizes que norteiam o estilo de Guimarães Rosa, quais sejam, a valorização da cultura popular, polifonicamente relacionada à erudição livresca do autor, e o experimentalismo lingüístico, que leva ao enriquecimento do vocabulário e sintaxe do português brasileiro, elementos que atuam em conjunto, no sentido de transfigurar a realidade pelo primado da intuição.
Instituto de Estudos da Linguagem. Programa de Pós-Graduação em Teoria e História Literária.
Este texto busca estudar os aspectos políticos, históricos e sociais trabalhados por João Guimarães Rosa em "A estória de Lélio e Lina", texto presente em Corpo de Baile. Para isso, se analisará como as palavras e ações de Lina servem para resgatar a ordem de um mundo em transformação. Ao se perceber em pleno encontro do moderno com o tradicional na zona rural de Minas Gerais no final do século XIX e início do XX, Lélio sente-se perdido. Ele precisa de Lina para se situar em meio ao dinamismo da História e poder formular/reformular seu papel enquanto agente e sujeito de sua vida. As referências que o texto faz aos processos de transformação histórica são o objeto da pesquisa. O que insere este trabalho na linha de análise dos componentes históricos e sociais presentes na obra de Rosa e, sem desprezar os outros enfoques analíticos, busca analisar tal obra em meio à cultura e à época em que ela se desenvolveu e ver o que ela tem a dizer a respeito de seu mundo.
Nosso objeto será aqui a tradução examinada através do campo teórico da psicanálise. A tradução tem sido comumente observada a partir de um ponto de vista externo, que busca examiná-la como um processo que não inclui quem a pratica, e os resultados não podem ser, portanto, muito satisfatórios. O que nos interessa é saber o modo de produção daquele que a pratica, o tradutor, sujeito dividido, permeado por vicissitudes, movido por mecanismos que nem sempre lhe são claros, solicitado sempre a ser o autor/modificador de um texto que não lhe pertence, premido pela demanda do senso comum em ser fiel a algo que, intrinsecamente, não pode sê-lo. Essa produção é atravessada, entre outros, por processos identificatórios, processos transferenciais, pela presença de formações do inconsciente e pelo desejo que move o sujeito, em uma somatória de acontecimentos que certamente não deixam de incidir sobre o produto final. O corpus para verificação de nossas hipóteses será constituído exclusivamente pela troca epistolar entre um autor, Guimarães Rosa, e seu tradutor para o italiano, Edoardo Bizzarri, por constituir um depoimento sobre o mecanismo de construção de textos - tanto aquele da língua de partida, quanto o da língua de chegada. Através dessas cartas buscaremos rastrear não só as concepções que ambos têm sobre o que é tradução, mas os mecanismos transferenciais e as identificações em jogo que vão interferir no produto final, interessando menos as soluções encontradas em italiano que aquilo que faz questão para o tradutor. Nosso percurso será constituído por uma pequena volta pela literatura sobre tradução e psicanálise, buscando, ao menos parcialmente, onde esses campos de conhecimento cruzam-se explicitamente, oferecendo subsídios para uma teorização a respeito. Em seguida, falaremos sobre alguns conceitos da psicanálise que nos serão necessários na análise da correspondência. No terceiro capítulo, examinaremos a peculiaridade da escrita de Rosa, que coloca problemas específicos para qualquer proposta de tradução. No quarto capítulo isolaremos o que Bizzarri traz como obstáculo, como problemático na compreensão e na tradução do texto, e como Rosa responde a isso. Também faremos um levantamento dos conflitos, ainda que camuflados, que permeiam essa relação, buscando em todo esse material as incidências do inconsciente que atravessam a produção dos textos. Finalmente, a conclusão trará o que é possível depreender dessas reflexões que sirva para lançar luzes sobre o processo tradutório .
Este trabalho compõe-se de uma Bibliografia Geral da Obra de Guimarães Rosa, contendo aproximadamente 2.000 títulos e da Bibliografia Comentada de Sagarana, composta de resumos de 187 trabalhos entre dissertações e teses, produzidos a partir da década de 70 e textos críticos, estes elaborados desde o momento de publicação do livro de Rosa. Tais resumos objetivam orientar o leitor interessado na produção crítica que a comunidade interpretativa mais especializada, a crítica literária, vem elaborando a respeito do livro, fornecendo aos pesquisadores e leitores em geral parâmetros que podem auxiliar a compreensão das relações entre cultura e sociedade, na medida em que compõe o caminho crítico por ele percorrido desde 1946. É abrangendo, pois, parte deste material aqui descrito, inserido no período específico de 1946 a 1956, que se apresenta um pequeno estudo que analisa os parâmetros da recepção crítica do primeiro livro de Rosa, Sagarana, no sentido de promover a emancipação desta obra dos códigos cristalizadores da tradição. Emancipar o livro do conjunto de valores cristalizados pela historiografia literária no momento em que foi publicado pressupõe discutir as relações entre crítica literária e sociedade pela análise do horizonte de expectativas que efetivou a recepção do livro em 1946.Nele, o embate entre as duas tendências discursivas, o regionalismo e o universalismo, que compuseram os discursos de hegemonia da crítica, ficou marcado por relações que extrapolaram o âmbito de uma discussão literária e adentraram a complexa rede de discursos subjacentes àqueles hegemônicos. Tais discursos estabelecem,assim,comopano de fundo,as relações como momento tenso de modernização industrial na sociedade brasileirada décadade 40. Nesta trilha, o movimento de ruptura com a tradição e o surgimento de uma nova, paralelos à validade cultural da obra, fazem a travessia crítica do livro, neste período, tomando possível reconhecer críticos que ocuparam um lugar alternativo, que, por força desta mesma tradição, não puderam ter reconhecidas, de imediato, suas vozes sensíveis e, de certa forma, mais próximas do livro de Rosa e da cultura sertaneja brasileira, nele, representada.
Estudo da sabedoria chinesa em Primeiras Estórias a partir de elementos de linguagem que, devidamente avaliados, constituem o ponto nevrálgico da trama e da cosmovisão da obra. Fazendo-se sentir por todos os seus poros -léxicos, sintáticos e poéticos - embora hegemônica, o livro não se restringe àquela sabedoria. Seguindo a tradição crítica, o autor indica, na Introdução, pontos distintivos e de contacto no profundo e constante diálogo com religiões como o cristianismo e o budismo, outras filosofias como o existencialismo, o platonismo e mesmo a sabedoria pré-socrática. Diferenças e semelhanças incidem decisivamente no estilo utilizado pelo escritor mineiro. o "foco narrativo", constituinte do olhar infantil, articula a fatura da prosa poética e da cosmovisão e, portanto é o elemento dinamizador e de descanso propagado pelo "amarelinho" - jeito carinhoso de Guimarães Rosa denominar Primeiras Estórias. As estórias escolhidas para exame procuram revelar a estruturação da obra e os principais temas narrativos: a constituição e construção do novo homem, o governo dos "homens verdadeiros", a transitoriedade da vida e a superação do medo, a graça e a predestinação, o encanto infantil. Finalizando, o texto procura amarrar pontos e aspectos revelados sem transformá-Ios em nós, porque as estórias roseanas indicam o eterno refazer da vida e não se estaria fazendo jus a elas concluir a dissertação de modo axiomático.
Instituto de Estudos da Linguagem. Programa de Pós-Graduação em Teoria e História Literária
Este trabalho pretende investigar a matriz sensível na obra Grande Sertão: Veredas de João Guimarães Rosa enquanto experiência fundadora do plano existencial. Tal relação será trabalhada a partir das personagens Riobaldo e Diadorim já que esta passa a despertar no outro, antes mesmo do amor incompreendido, uma atenção para singularidades da natureza, fatos e relações anteriormente não percebidas, etapa primeira de uma série de questionamentos que acompanharão Riobaldo por toda sua vida. Partindo de alguns conceitos fenomenológicos, pretende-se analisar como a inegável presença do sensível - face à natureza (beleza natural) e à força lírica da personagem Diadorim - é capaz de conduzir ao plano existencial, à postura existencial, tão consolidada e inquietante em Riobaldo, narrador-personagem. Para isso serão analisadas algumas passagens do romance nas quais o vínculo entre natureza e apreensão sensível parece mostrar-se como mecanismo gerador do questionamento. Nesse trajeto, outros temas importantes, tais como a corporeidade, a percepção, o despertar estético, a função da arte, os efeitos do belo e a transformação através da leitura/arte, também serão abordados. Como e quando surge a atenção sensível no narrador? Quais os mecanismos e fatores que poderiam proporcionar essa espécie de despertar existencial em Riobaldo? Qual o papel da percepção e da natureza nesse processo? São apenas algumas das questões que essa pesquisa pretende abordar. Do ponto de vista de uma obra ficcional - que, portanto, difere do escrito filosófico - a intenção é também abordar Grande Sertão: Veredas como possibilidade de outro tipo de despertar: o proporcionado pela palavra ao nos atravessar como leitores, podendo modificar sensivelmente (transformar) aquele que lê, a partir de uma transformação em curso (a de Riobaldo via Diadorim/sensibilidade/natureza), o que reforça a tese da enorme importância da leitura como processo de experiência e formação.
Esta dissertação de mestrado faz uma análise da novela "Campo Geral", de Guimarães Rosa, considerando a percepção sensorial da personagem Miguilim. Antes, porém, há um estudo sobre a percepção sensorial na obra de Rosa, em que se consideram algumas idéias do filósofo Merleau-Ponty. Analisam-se trechos de Boiada (anotações que Guimarães Rosa fizera em sua viagem pelo sertão), além de passagens retiradas de "São Marcos", "A hora e a vez de Augusto Matraga" e Grande Sertão: Veredas. Discute-se, sobretudo, a relação entre a percepção sensorial das personagens e o caráter poético da linguagem de Rosa. Inclui-se, nesse estudo, também a relação entre o corpo da palavra e o corpo do leitor. Na análise da novela "Campo Geral", trabalha-se com a experiência do visível. O olhar míope da personagem Miguilim revela uma experiência de ordem poética e de resistência a um mundo que reduz o corpo a um instrumento de trabalho. Por fim, analisa-se a formação de Miguilim como contador de estórias. Essa atividade elabora sentidos para as percepções sensoriais da personagem e mostra ser recurso importante no enfrentamento da morte e na afirmação da alegria, temas fundamentais de "Campo Geral".
Instituto de Estudos da Linguagem. Programa de Pós-Graduação em Teoria e História Literária
Esta tese de doutorado investiga a vocalidade na obra de Guimarães Rosa. O conceito de vocalidade, definido a partir dos trabalhos de Paul Zumthor, considera a voz não apenas como suporte ou veículo sonoro da palavra, mas também como manifestação de sentido que reverbera aquém e além da palavra. No texto literário de Guimarães Rosa, a dimensão da vocalidade é trabalhada no próprio corpo sensório da palavra poética, que produz feixes de sentido que escapam às determinações da linguagem e, dessa maneira, conseguem aludir ao que seria indizível no sertão rosiano. Além disso, as mais variadas e estranhas vozes escutadas nesse sertão ocupam um lugar central no desenvolvimento de algumas narrativas, como "Meu tio o Iauaretê", "Buriti" e "O recado do morro", que são detidamente analisadas. Em "Meu tio o Iauaretê", a vocalidade alia-se à questão da animalidade no decorrer da metamorfose do narrador em onça, cuja fala é continuamente atravessada por ruídos aquém do humano, quando a linguagem corre o risco de ser devorada pela irrupção de uma voz animal. Em "Buriti", a voragem sonora das noites do sertão é apreendida pela escuta hipersensível da personagem Chefe Zequiel, capaz de alcançar um núcleo insondável da noite, uma "voz de criatura" que mal resvala o sentido, mas que será revertida no erotismo pujante dessa novela. Em "O recado do morro", um recado enviado pelo Morro da Garça vai se formulando de modo fragmentado e confuso, à medida que é passado e alterado por sete mensageiros. Essa transmissão depende do entusiasmo (enthousiasmós, em grego = com um deus dentro de si) que se manifesta na voz das personagens para além das palavras do recado, até ele se organizar e se revelar na forma de um poema cantado. Por fim, essas questões são retomadas e expandidas com o objetivo de mostrar como a vocalidade ganha extensão em outras narrativas de Guimarães Rosa e elabora a seu modo importantes eixos temáticos dessa obra ficcional.
Instituto de Estudos da Linguagem / Programa de Pós-Graduação em Teoria e História Literária
Esta dissertação trata da relação entre política e forma literária no romance Grande sertão: veredas, de Guimarães Rosa. Parte-se do pressuposto básico de que há a apreensão de um modus operandi específico da política no texto rosiano: a saber, do processo de modernização, entendido em duas chaves: uma chave horizontal, que trata da distensão e enrijecimento das relações patriarcais de poder; e outra vertical, que diz respeito à força que penetra nos vãos legados pelas relações cordiais e remete ao funcionamento íntimo da soberania moderna, marcado pelo fortalecimento da lei através do embaralhamento das fronteiras éticas. Esta dupla remissão do conceito de modernidade obrigou um aporte metodológico transversal no tratamento da obra: buscou-se evidenciar os temas que, diferenciando-se de acordo com a camada do texto em que se encontravam, não deixavam de tocar no mesmo corpo de problemas. Assim se dividiu este trabalho em três principais seções: 1) o poder, na qual se buscou jogar luz sobre os rudimentos históricos básicos que alimentam a narrativa rosiana; 2) a lei, em que se empreendeu o trabalho de entrever o significado das guerras e de sua manipulação da violência frente à sobreposição do novo arranjo soberano às formas decadentes do direito cordial; 3) o amor, parte sobre a qual recaiu a importância da análise do regime da diferença no romance, intimamente ligado à maneira como se mobiliza a reação da forma rosiana ao estado ético da modernidade. O afunilamento de tais questões fez incidir sobre um só problema todas as tensões deste trabalho: o porquê da grande responsabilidade ética legada à palavra por parte de Guimarães Rosa. Tenciona-se, ao se apontarem os pontos de fuga desta questão, evidenciar os horizontes políticos que a obra rosiana oferece.
Instituto de Estudos da Linguagem, Programa de Pós-Graduação em Linguística Aplicada
A presente tese examina a minissérie Grande sertão: veredas, da Rede Globo de televisão, realizada em 1985 com base no livro homônimo de João Guimarães ROSA(1956/1986). Minha hipótese é de que o formato escolhido e sua função de prestígio na grade de programação da emissora foram os principais parâmetros utilizados na transformação do romance em ficção televisiva. Tradicionalmente, trabalhos com temas análogos tendem a privilegiar as diferenças de linguagem, pressupondo um original estável e potencialmente apreensível em sua "essência". Não foi esse o caminho trilhado em minha pesquisa, cujas principais referências teóricas são as noções de "reescritura" (LEFEVERE1,992a-b), "transformação regulada" (DERRIDA1972/1975) e "apropriação" (ARRoJO, 1993e). De forma complementar, utilizei ainda as noções de "comunidade interpretativa" (FISH, 1980) e "função-autor" (FOUCAULT,1969/1983). Como suporte empírico, recorri a um estudo da recepção do romance e da minissérie na crítica especializada e jomalística, aliado a uma análise de ambos os textos. No caso da produção televisiva, houve recurso à sinopse, ao roteiro e à edição final do programa. O fio condutor dessa "dupla leitura" (do romance e da minissérie) foi a aspiração de "fidelidade ao livro" propalada pela Globo e amplamente repercutida na mídia. Os elementos arrolados na pesquisa permitem a conclusão de que tal "fidelidade" diz antes respeito a determinadas tradições críticas e sobretudo aos próprios desígnios da televisão. De todo modo, o contato do enorme público televisivo com o Grande sertão: veredas representa uma significativa "sobrevida" do romance, no sentido de BENJAMIN(1923/1972), não em outra língua ou cultura, mas em outro sistema textual, de crescente interesse para os estudos da tradução.
Sertão: palavra de enorme riqueza no imaginário, na história e cultura(s) do Brasil. Lugar desértico, paisagem árida e desoladora, onde vive uma população em constante processo migratório, lugar de uma rica cultura popular e também um espaço de barbárie, misticismo e miséria? O sertão se apresenta sob diversos aspectos, despertando sensações e sentimentos, evocando imagens e apresentando-se como resultado de uma longa experiência sócio-histórica e ficcional. Este trabalho investiga a formação da identidade narrativa sertaneja, percorrendo assim uma trajetória que tem como característica central a multiplicidade de autores, gêneros e discursos que formam as veredas simbólicas de um espaço sembre aberto para novas representações.
O primeiro índice do livro Corpo de Baile (1956) de João Guimarães Rosa, de caráter emissivo, classifica o conto "Cara-de-Bronze" como um "Poema"; o segundo, de caráter remissivo, classifica-o como uma "Parábase". Esta dupla identidade, no entanto, não se anula, mas se complementa: o conto pode ser lido como uma "Parábase da Poesia", um comentário metatextual do autor sobre seus próprios procedimentos poéticos. Para tanto, Guimarães Rosa elabora um projeto narrativo inusitado, sobretudo híbrido. Estão presentes diversas formas de representação textual para expressões artísticas cujas plenas realizações se dão somente fora do livro, como o cinema, o teatro e a canção, criando assim uma tensão insolúvel entre texto e performance. Esta dissertação procura entender a relação entre a forma híbrida e o conteúdo parabático, trabalhando com a hipótese de que a arquitetura única e exemplar de "Cara-de-Bronze" está desenhada para ilustrar a função hiperdeterminante da poesia e seu paradoxo de representação.
Análise de seis contos do livro "Primeiras Estórias", de Guimarães Rosa. O ponto de partida da análise foi uma estrutura linguística chamada voz média, uma espécie de síntese entre a voz ativa e voz passiva. Com ponto de partida linguístico, o trabalho se inspira na obra Was Geht Uns Noah An, de Wolfgang Von Schöfer, e tenta resgatar significados de palavras que se perderam ao longo do tempo. Assim, encontra-se um ponto de diálogo com a obra de Suzi Frankl Sperber, que defende que Guimarães Rosa utiliza um recurso que a autora chamou de abertura do sintagma e também o de fundir espaço e personagem na narrativa com o objetivo de potencializar, ampliar os sentidos. A presente dissertação explora as dimensões simbólicas da obra de Rosa, mostrando de que maneira o autor se abria e investigava os mistérios da vida. Foram levantados alguns temas que se repetem em todos os contos, e a partir de uma análise minuciosa sobre os contos, encontra-se um tema principal que é desenvolvido: a importância de viver é compreendida através do aprimoramento da alma - e isso se dá através do conhecimento não de ordem racional, mas prática.
Haroldo Pedro Conti (1925-1976?) nasceu na cidade de Chacabuco, na província de Buenos Aires. Colaborador da revista Crisis, professor de latim, roteirista e premiado em 1975 pela revista Casa de las Américas, Conti teve sua produção literária interrompida quando foi sequestrado no começo da ditadura militar argentina. Ainda hoje figura na lista de desaparecidos políticos. Devido a este histórico, é comum a fortuna crítica realizar uma leitura da obra de Conti enfatizando mais o viés político e menos o estético. A este desequilíbrio soma-se outro: Conti ainda é um escritor pouco estudado. À guisa de exemplo, o volume de contos completos de Haroldo Conti foi lançado pela primeira vez apenas em 1994, ou seja, depois de quase vinte anos do término da ditadura militar argentina. No Brasil, Conti é ainda mais desconhecido: somente um romance - Mascaró, El cazador americano - foi traduzido ao português. Na tentativa de expandir as leituras da obra de Haroldo Conti, o objetivo desta dissertação é analisar comparativamente os contos do escritor argentino com contos brasileiros. Para tanto, privilegiou-se, além da cronologia - contos brasileiros pertencentes ao mesmo período em que Conti escreveu sua obra contística, entre os anos de 1960 e 1970 -, o aspecto geral da trama, comum a todas as narrativas analisadas: o amor dos protagonistas ou narradores por outrem - um pai, um tio ou um irmão - e o desejo de, na recordação, criar um vínculo com este outro e realizar a constituição de si enquanto sujeito. As narrativas brasileiras que compuseram a análise - "A terceira margem do rio" (Guimarães Rosa), "As voltas do filho pródigo" (Autran Dourado) e "Frio" (João Antônio) - permitiram uma maior compreensão daquilo que move as personagens contianas e como estas constroem o "esforço por existir". Para realizar esta "descoberta de si", elas precisam aprender a enxergar, a partir do outro, a presença de um mundo antes não sensível aos olhos. Através das "pequenas percepções" que se instalam gradualmente nestas personagens, elas tentam recuperar não apenas o espaço-tempo que ficou para trás, senão o encontro com o outro: um encontro que não se deu em vida e que tem, através da memória, a última chance de ocorrência.
O tema da donzela-guerreira engendra processo configural que retoma matizes de composição do tema na cultura popular. O que podemos perceber pelas variantes da produção oral é a manutenção do molde da donzela-guerreira européia que chega até nossos dias como herança do processo de colonização. O romance brasileiro, ao tratar desta donzela, fundamentalmente nos dois romances aqui analisados, Grande sertão: Veredas e Memorial de Maria Moura, insere-a em novo espaço, o sertão, permitindo, assim, uma reelaboração da performance e o aprofundamento de elementos configurais que apenas estavam apresentados na produção oral; a saber, a dinâmica da guerra, a composição do bando, a instituição da marginalidade.