O estudo pretende mostrar como os signos poéticos da canção de Siruiz, articulados aos contextos espaciotemporais de suas quatro versões na diegese, não só cartografam pontos-chave da travessia de Riobaldo pelo sertão como também espelham nesse mapa o desenho astronômico da constelação do Cão Maior, numa conjunção entre história e mito. Embora a versão original da canção seja oferecida ao interlocutor como um prenúncio cifrado do destino do herói, as demais composições erigem a dúvida como diapasão narrativo. Assim, o narrador-compositor enuncia um dilema entre a confirmação da mensagem no percurso do jagunço de ocasião e a ação voluntária nos rumos definidores da transformação do jovem errante em chefe e, por fim, em fazendeiro guarnecido por ex-jagunços.
O objetivo deste trabalho é a análise comparativa entre Primeiras Estórias, publicado por Guimarães Rosa em 1961, e o filme A terceira margem do rio, produzido em 1993 por Nelson Pereira dos Santos, com base em cinco contos do livro de Rosa. Pretende-se demonstrar alguns dos aspectos estético-semióticos que envolvem o processo de adaptação do texto literário para o texto fílmico, o que implica a definição do grau de aderência, de afastamento e de interferência resultantes desse processo. Em primeiro lugar, identificamos em Primeiras Estórias uma estrutura especular a partir de relações significativas entre os tecidos narrativos dos contos O espelho, As margens da alegria e Os cimos, em função de um jogo com a posição dos respectivos contos no livro. Em segundo lugar, feitas as interpretações sobre essa estrutura em relação aos demais contos, levantamos a hipótese de que o filme se compõe segundo uma transmutação da estrutura especular do livro de Rosa. Articulada à unidade narrativa que Nelson Pereira dos Santos deu às cinco narrativas em que se baseou, transformando seus núcleos de ação independentes numa única história no filme, essa transmutação confere ao filme sua autonomia criativa. Finalmente, aplicando os conceitos da sociologia estruturalista genética de Lucien Goldmann (1978, 1990), trabalhamos com a hipótese de que a diferença entre as formas das obras é decorrente de distintas consciências possíveis de grupos sociais.