Este artigo reflete sobre um depoimento de Guimarães Rosa, no qual o escritor, contrariando a imagem típica do dicionário como testemunho de um sistema objetivo de representação, caracteriza-o, de forma alternativa e paradoxal, como a um só tempoantologia lírica, romance e autobiografia. Toma-se tal depoimento como metonímia de um pensamento sofisticado e relevante sobre a linguagem e discute-se a pertinência de lhe dar lugar em uma História das Ideias Linguísticas.
Este trabalho retorna à já muito analisada correspondência de Guimarães Rosa com seu tradutor italiano, Edoardo Bizzarri, buscando compreender como convivem ali dois imperativos aparentemente contraditórios, expressos nas seguintes duas passagens: (a) “a orientação válida é mesmo aquela – de só pensarmos nos eventuais leitores italianos. Não se prenda estreito ao original. Voe por cima, adapte quando e como bem lhe parecer” (p. 7); e (b) admirável é a tradução em que “nada do texto original se evaporou, nada foi omitido, tudo ficou preservado... e prestigiado!” (p.13). Uma forma comum de compreender a convivência desses dois pontos de vista no pensamento de Rosa sobre a tradução é vê-la como oscilação entre dois pólos irreconciliáveis. Exploramos neste trabalho a hipótese de que as reflexões do autor sobre a atividade tradutória possam ser tomadas de uma forma alternativa, em que o aparente paradoxo possa ser, se não resolvido, pelo menos dissolvido. Discute-se a relevância contemporân