Na presente tese, aborda-se a questão da linguagem no discurso de Riobaldo, narradorpersonagem de Grande Sertão: Veredas (2015), de Guimarães Rosa. O homem humano
rosiano é o ser encarnado merleau-pontyano que se elabora no ato da travessia existencial,
tendo por base os conceitos de linguagem trabalhada de Guimarães Rosa e de linguagem viva
em Merleau-Ponty, a partir do devir da linguagem como movimento criador. Nossa tese é que
esta linguagem produz a existência do ser. A partir disso, questiona-se: como entender a
dinâmica do discurso de Riobaldo enquanto travessia do sertão linguístico rosiano em
narrativa de sua experiência vivida a partir da fenomenologia existencial da linguagem de
Merleau-Ponty? Busca-se responder a essa problemática propondo como objetivo analisar o
discurso do narrador-personagem por meio de categorias escolhidas após as primeiras duas
leituras da obra: Mire e veja, Ser-tão e Travessia. Mire e veja, expressão recorrente na fala de
Riobaldo enquanto expõe ao interlocutor a sua saga sertaneja e corresponde à percepção em
Merleau-Ponty (contato originário com as coisas que se mostram enquanto fenômenos e
retorno ao pré-reflexivo do mundo pela consciência perceptiva); ser-tão diz respeito ao
mundo vivido (em que a existência humana se realiza como ser no mundo); e travessia, que
consiste no devir criador da linguagem (acontece na fala falada e na fala falante, numa
linguagem que se encontra produzindo sentidos, que vão além da palavra dita, e, por sua
essência, é viva, fomentando a existência do ser humano que se encontra em travessia
existencial). Utiliza-se como base a Fenomenologia da Percepção (2011) e a Prosa do Mundo
(2012). Nessa perspectiva, compreende-se o sertão rosiano em três dimensões: física,
metafísica e linguística. Com base nelas, serão analisados os aspectos do discurso de Riobaldo
que atravessam o sertão por sua concepção perceptiva do mundo vivido, através da linguagem
regionalista, universal e trabalhada, característica peculiar de Guimarães Rosa. Narradorpersonagem e autor fundem-se na permanente construção viva da narrativa, o que demonstra
uma riqueza poética pela elaboração do dizer como devir criador e pela musicalidade que a
língua propõe. Por metodologia, faz-se uso do método fenomenológico merleau-pontyano,
contemplado nos seguintes pontos: 1) fazer a descrição do mundo vivido pelo sujeito por sua
experiência perceptiva; 2) buscar as essências das coisas e repô-las na existência; e 3)
perceber o modo de ser e de se relacionar com o mundo pela experiência consciente e vivida a
partir do corpo-sujeito e sua capacidade de ação. Método que foi aplicado na leitura e análise
da obra rosiana. Como resultados, realizou-se um diálogo entre a literatura de Guimarães
Rosa e a fenomenologia de Merleau-Ponty, tendo a linguagem como elo dessa interface.
Assim, conclui-se que há confluências que aproximam os autores estudados na perspectiva de
uma linguagem viva, promovendo o homem humano no sertão-mundo. A aplicação desta
pesquisa no ensino e no desenvolvimento de estudos em literatura e filosofia promoverá o
passo seguinte deste trabalho.
Na contemporaneidade, o estudo do espaço tem despertado o interesse de pesquisadores de diferentes campos do saber. Nesse cenário, constata-se uma diversidade conceitual oriunda de variados campos epistemológicos. Na literatura, o espaço é utilizado para situar e caracterizar os personagens, para antecipar a história narrada, para propiciar a ação, dentre outras funções, conforme Borges Filho
(2007), por isso é uma categoria promissora para o estudo da obra literária. Todavia, verifica-se ainda uma carência de pesquisas sobre tal aspecto, sendo o trabalho de Osman Lins (1976), Lima Barreto e o espaço romanesco, uma das melhores incursões brasileiras no estudo do espaço ficcional. Na ficção de João Guimarães Rosa, o espaço é um procedimento temático e formal que suscita valiosos
questionamentos para a compreensão de sua poética. Em sua vasta fortuna crítica ainda se verifica uma certa preferência pela representação do sertão físico e/ou mítico. No entanto, instâncias simbólicas e metafóricas da natureza de outros lugares, dos não lugares e dos entrelugares, emblemáticos espaços no discurso romanesco rosiano, ainda não tiveram o reconhecimento merecido pela crítica especializada. Nessa perspectiva, objetivamos, nesta pesquisa, analisar contos
integrantes das obras Primeiras estórias (1962) e Tutaméia: terceiras estórias (1967), do referido escritor, dando destaque à análise do espaço e seus termos correlatos. Trata-se de uma leitura crítico-comparativa de quatro contos, sendo “A terceira margem do rio” e “Nenhum, Nenhuma”, de Primeiras estórias e “Lá, nas campinas” e “Faraó e a água do rio”, de Tutaméia: terceiras estórias. Para tal direcionamento, consideramos fundamentais os conceitos sobre o espaço de Brandão (2013), Lins (1976), Bachelard (2008), Foucault (2001), Bakhtin (1998), dentre outros teóricos. Também são oportunas as perspectivas de Augé (2012) sobre as noções de não-lugares, e as contribuições de Fantini (2003) sobre a dimensão de fronteiras na ficção rosiana, bem como outras referências norteadoras da Teoria da Literatura sobre questões relativas à narrativa de ficção. A partir do
enfoque comparativo, verificamos o espaço como categoria significativa para a compreensão da ficção de Guimarães Rosa, sobretudo as metáforas ligadas à noção de margens, fronteiras, entrelugar, entre outros.
O duplo enquanto representação da dualidade humana participa do imaginário popular desde épocas remotas. Esse conceito relacionado à fragmentação da identidade humana tem chamado cada vez mais a atenção da crítica literária, tema que se relaciona diretamente com as discussões cada vez mais atuais sobre o estudo de gêneros, com destaque para o Feminismo, já que as mulheres por muito
tempo foram vistas como sexo inferior, ficando à mercê de um tratamento diferenciado e relegadas a uma posição social de serventia e obediência aos homens. Nesse contexto, é comum a criação de uma dualidade no sujeito subtraído, gerando uma desordem íntima formada pelo conflito entre a posição que lhe era conferida historicamente e socialmente contra sua própria personalidade e
individualidade. Neste trabalho, buscamos analisar o duplo nas protagonistas femininas de contos brasileiros e estadunidenses tendo a morte como elemento de transformação. Como suporte teórico, nos embasamos nos trabalhos de Brandão (2006), Bravo (1997), Foucault (1995, 2004a, 2004b), Mello (2000), Zolin (2009), dentre outros. Para o tratamento analítico dos contos, utilizamos o método de estudo descritivo e o comparativo, isso porque, após a exposição dos contos, realizamos um cotejo entre os contos a serem estudados no sentido de encontrar afinidades e divergências entre eles com o intuito de verificarmos a forma como essas narrativas dialogam, especialmente no que se refere ao tratamento dos temas duplo, identidade, feminismo e morte. Os resultados mostram que todas as protagonistas analisadas fazem uso de uma máscara metafórica que é assumida perante a sociedade patriarcal na qual estão inseridas. A criação e o uso dessas máscaras, porém, divergem de acordo com a narrativa, pois, algumas das personagens femininas apresentam atitude ativa em relação ao masculino, agindo contra ele de modo a alcançarem o empoderamento, enquanto outras, devido à postura passiva que adotam, não alcançam o empoderamento e acabam por ser vítimas dessa inatividade.