Os percursos da fortuna crítica acerca da obra de João Guimarães Rosa abarcam temas dos mais variados, que vão da linguística à sociologia, da narratologia ao estudo dos símbolos. O presente artigo aborda a presença de referências budistas na obra do autor mineiro, uma questão ainda pouco trabalhada na literatura brasileira de modo geral. No caso de Guimarães Rosa especificamente, este texto trata especialmente de alguns poemas Magma (1936), de um dos quatro prefácios de Tutaméia (1967), “Aletria e Hermenêutica”, e da narrativa “Cipango”, de Ave, Palavra (1970). A investigação parte tanto de elementos orientais presentes na obra João Guimarães Rosa quanto de indicações sobre o tema na própria fortuna crítica do autor mineiro. O desenvolvimento desse tópico dá-se considerando o que Francis Utéza explicita sobre a elaboração de questões metafísicas-religiosas em textos rosianos, na forma como elas coexistem com componentes regionalistas. Por meio desses três textos citados acima, observa-se que, na literatura brasileira, figuram temas e personagens que podem estar deslocados de sua origem, mas que, na arte de Guimarães Rosa, fazem parte do Brasil.
Instituto de Biociências Letras e Ciências Exatas, São José do Rio Preto
A partir de um conceito que chamamos de etnografia literária, procuramos demonstrar como o sujeito-escritor Guimarães Rosa, voltado para a antropologia, em especial, a etnografia, constrói-se ao longo de materiais como notas de viagem, cartas, anotações de diário e reportagens poéticas; em seguida, demonstramos como essa construção contamina os narradores posteriores de sua literatura. Nesta etnografia literária, consideramos o narrador como um etnógrafo construído a partir da viagem, da observação que valoriza a sinestesia e da empatia para com os personagens, o outro. Esta empatia pode ser vista através da fala direta ou do discurso indireto livre, essenciais à etnografia literária, pois representam o acesso à alteridade. Demostramos como noções de etnografia estão presentes nas narrativas de Ave, Palavra, “Sanga Puytã”, “Cipango”, “Uns índios – sua fala”, “Ao Pantanal” e “Pé-duro, chapéu-de-couro” como também “Entremeio: com o vaqueiro Mariano”, de Estas Estórias e “O recado do morro” e “Uma estória de amor”, de Corpo de Baile. Recolhemos no diário de viagem do escritor, A Boiada, tal visão etnográfica que dialoga com os demais textos lidos na tese.
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DE LINGUAGENS / TEORIA LITERÁRIA E ESTUDOS COMPARADOS
Esta dissertação tem por finalidade analisar três narrativas curtas de Guimarães
Rosa que, por sua vez, tratam ou aludem à cultura sul-mato-grossense. Trata-se dos contos
“Sanga Puytã”, “Cipango” e “Entremeio com o vaqueiro Mariano” que, além de outros temas,
abordam o regionalismo literário enquanto ambiente, homem, linguagem e riqueza cultural da
região. Para tal análise, privilegiar-se-ão os postulados teóricos críticos dos Estudos Culturais,
especificamente os conceitos de cultura híbrida, fronteira, margem e transculturação. Nesse
sentido, o livro Culturas híbridas, de Nestor Canclini, será seminal, por contemplar o conceito
de hibridização cultural que norteará toda a proposta do referido projeto. Também o livro
Literatura e cultura na América Latina, de Ángel Rama, que procurou mostrar Guimarães
Rosa como transculturador narrativo e, ainda, a obra A mobilidade das fronteiras, de Cássio
Eduardo Viana Hissa, que mostrou como é intrincada a questão de fronteiras e limites e como
foi resolvida a questão de fronteira brasileira-paraguaia, mais especificamente.
O presente trabalho tem como objetivo investigar os rastros de budismo em produções de João Guimarães Rosa, como alguns poemas de Magma, o conto Minha gente, de Sagarana, o prefácio Aletria e Hermenêutica, de Tutaméia, e a narrativa Cipango, de Ave, Palavra, e, com base nelas, demonstrar a presença de um aspecto da filosofia budista a ideia de existência ilusória dos fenômenos em Grande sertão: veredas, condensado em um raciocínio de Riobaldo sobre a existência do diabo. Lidas através do conceito de paradigma indiciário de Carlo Ginzburg, em que informações marginais de uma obra podem revelar um dado maior, as referências ao Buda e ao budismo, apontadas nessa pesquisa, explicitarão que a presença budista não é meramente periférica na obra do autor, mas, inclusive, significativa para a construção de uma proposta de leitura de Grande sertão: veredas.
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