O Dia da Mãe

Eu bebi do teu remédio para ficar doente em tua companhia. Parceiro da tua dor e agonia. Em paracetamol morfina. O acompanhante de quarto. Afinal, o que você tinha, porque não voltava do sono?. Em vão buscava respostas. No buscopan composto de nada. Paulatinamente ficávamos flácidos. Sem pernas para visitas. Sem forças para a canja das dezessete. Sem bocas para bolachas água e sal.

Agulhas invadiam nossas veias. Que insistiam em fugir do aço. Com líquidos verdes ineficazes. Unindo nosso sangue umbilical. Aliviei tua sede com gaze embebida. Beijei o teu olhar. vazio de febres. Na translúcida distância. Delirante de alegrias. Pleno de inseguranças.

Lá fora a vida abraçava o sol. Com o seu frêmito inexorável. No festival diário dos pássaros que amanheciam. No riso das buzinas que zombavam da minha cara. Cá dentro os corredores cheiravam a éter. Só rumor por ali no silêncio hospitalar. Um só gemido acolá no labirinto das dores eternas. Vozes que clamavam nas masmorras gélidas.

– Enfermeira! Um médico, por favor! E o pedido desaparecia inválido na prancheta do medíocre curandeiro.

O calor ficava por conta dos anjos de branco. Que transitavam urgentes, levitantes. Com a cruz vermelha carimbada nas asas. Um cheiro acre de urina, fezes, vômitos, sangue. Aguardando pela limpeza anti-séptica. Luvas elásticas, banho de bacias, madres, comadres.

E uma cruel pergunta que pairava.

– Moço o que ela tem?

Sei lá moça. Aqui nasce a vida. Aqui a morte morre. Pacto transcendental de infinitos mistérios. Aqui o tempo fica do tamanho de uma invenção qualquer. Cada um com a sua estória. Solitária e sem importância. Registro de um momento único. Marionete, inerte. E joguete nas mãos do destino. [tenho profundas mágoas desse jogo]. Fiz um carinho em sua face inerme. Ausente de sorrisos. Onde estará você agora? No leito do quarto ou em rios de infância. Minha maior ânsia é saber. Houve um tempo para a tua felicidade?

Canto solitário todas as suas canções. Caço pelas tuas fantasias de senhora. Choro com vontade de ser forte. E, no entanto impotente. Para entender a tua inércia. Perdoa-me, mãe! Fui em busca da tão sonhada força. Só para provar que sabia ser seu filho.

Cenas de cinema em conta gotas lento. Recortes de lembranças em batimento fraco. Durma, eu cuido da tua capelinha. Dorme, eu cuido da certidão de óbito. Tum…tum…tum…Parou?

Descanse em paz…Mãe.

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