Dia do Pai

Os dias eram fatais. Amanheciam com um cheiro de morte. Mas e o estômago?

(Ah! O estômago aguenta).

Ainda bem que viajar na madrugada tem o carinho das estradas e o frescor dos eucaliptos. No mais, o chiado dos pneus no asfalto e o rádio da ecosport chorando baixinho um locutor qualquer com o seu lamento sertanejo.

O destino? Rubião Junior.

Nome abreviado, para uma fila imensa de humanos, exalando humores rumo ao guichê das senhas. As malditas senhas.

Depois, a espera na sala, até o chamado. E finalmente o líquido sagrado da oncologia escorrendo pelo cateter.

Salvou? Claro que não. A medicina luta contra seus limites.

Mas a volta sempre foi um caldo de cana bebericado à beira da estrada de ferro sorocabana. Vez em quando, atendendo ao seu pedido, um lambari frito na mesa de um pesqueiro solitário.

Foi assim, até perder o brilho do olhar. Névoa de cataratas, à espera da cirurgia que nunca se consumou.

Passou? Tudo passa.

Mas hoje, revendo a agenda, encontrei um poeminha perdido no livro dos contactos. Entre telefones de ambulâncias, oncólogos, banho para idosos e amigos do câncer.

COVARDIA
“sofro deste mal, querer a tua lamparina acesa no pavio, presa por um suspiro, até o último espasmo de frio”

Depois? Só um vazio.

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