Encante-se com a música de Cybelle Lopes

Cybelle Lopes em Piraju (Foto: Arquivo pessoal)

Maria Laura López*

Ouvido musical é uma expressão utilizada para designar a apuração ou a sensibilidade de uma pessoa para a música. Mas o que por um lado é visto como uma facilidade para aprender instrumentos ou acertar a afinação, também pode se tornar um problema quando não vem acompanhado de uma educação mais formal. Foi o que aconteceu no caso de Cybelle Lopes, artista pirajuense que recentemente se aposentou da Orquestra Sinfônica Municipal de Campinas.

Tendo iniciado sua vida na música aos nove anos de idade num projeto social em Piraju, a musicista conta como se deu seu processo de aprendizagem. “Depois de passar pela teoria musical a gente finalmente pegava algo para tocar. No meu caso, o maestro cantava a melodia, eu pegava de ouvido e repetia no instrumento, então eu não lia a partitura”, explica.

Embora a facilidade em reproduzir a melodia a partir do que ouvia tenha ajudado durante os primeiros anos, ao seguir carreira e se profissionalizar Lopes precisou reaprender a tocar, dessa vez tendo a partitura como base. “Depois que eu fui para Curitiba que tive alguma noção de como entender as notas escritas naquele papel. Para ser uma profissional eu dependia disso”, conta.

Seu primeiro instrumento, ainda em Piraju, foi o trompete. Com ele, a artista foi para Porangaba, onde passou algum tempo tocando em Big Band, grupo instrumental associado ao jazz, e só depois chegou em Curitiba, já aos 17 anos. Foram oito anos tocando por memória auditiva antes de aprender a ler partitura.

“Sabe aquelas imagens em que tá tudo bagunçado mas quando você fixa o olhar num ponto consegue ver uma imagem oculta? Foi mais ou menos assim depois que eu comecei a entender aquelas notas no papel, foi fantástico porque qualquer música que você colocasse na minha frente eu conseguia ler”, explica.

“O maestro cantava a melodia, eu pegava de ouvido e repetia no instrumento, então eu não lia a partitura”

Em Curitiba, Cybelle também passou por um projeto da prefeitura no Solar do Barão, Fundação Cultural da cidade, e depois por uma escola de música, graças a sua insistência. “Eu sempre ia conversar com o pessoal da Orquestra Sinfônica de Curitiba para saber quem dava aula e onde mais eu poderia estudar”, afirma.

“Eu ia meio que pedindo para as pessoas me darem aula porque se eu fosse depender de dinheiro para pagar eu não tinha. Aí de vez em quando aparecia alguém que topava me ensinar e eu ia atrás”, completa.

Depois de algum tempo nessa escola, a artista já não estava mais tão feliz na cidade, tanto que ao receber outra oferta em um novo lugar não hesitou. “Um dia o professor que dava aula para a gente faltou, e o substituto, que dava aulas em Tatuí, perguntou porque eu não ia para lá, eu teria opção de bolsa, pensionato… então eu fui”, relembra.

Conseguiu uma vaga na escola de música de Tatuí em 1986. Lá, também tocava na banda do conservatório e por isso ganhava uma bolsa com a qual se mantinha. O primeiro ano ela ainda passou com o trompete, só depois é que veio a trompa. “Eu gostei do som diferente que ela produz. A trompa é um instrumento meio erudito e eu vi que teria mais campo de trabalho também.”

Na época, os tocadores de trompa eram muito escassos e, ótima instrumentista como é, Cybelle Lopes não demorou para entrar no meio profissional. Quatro meses depois de trocar de instrumento, ela já estava tocando na Orquestra Sinfônica de Sorocaba. “Mesmo assim o número de trompistas era muito pequeno, por isso um pessoal de Campinas era contratado para ajudar de vez em quando”, conta ela sobre como suas portas se abriram para a Orquestra Sinfônica de Campinas ainda em 1989, e onde ficou até se aposentar.

Seu primeiro instrumento foi o trompete (Foto: Arquivo pessoal)

“Os meninos gostavam de me ver tocar por causa da questão da afinação, achavam interessante, aí quando abriu vaga para trompista lá em Campinas eles me convidaram para prestar concurso”, afirma.

De aluna para professora

Enquanto estudava em Tatuí e mesmo depois, quando já trabalhava na Orquestra Sinfônica de Sorocaba, Cybelle tentava oferecer um pouco das mesmas oportunidades que teve na vida. “A gente ia dar aula em alguns projetos da prefeitura, aproveitava para fazer uns bicos na banda ou orquestra da cidade, sempre assim”, relembra. Eram aulas de trompa que ela dava uma ou outra vez por semana em lugares como Botucatu e Rio Claro.

Mais tarde, em 2011, enquanto já tocava em Campinas, a musicista voltou a dar aulas, dessa vez em um projeto social em Amparo. “O interessante desse lugar é que o objetivo não era formar músicos, era ensinar sobre a cultura musical mesmo. E eu que nunca fui boa na teoria, porque pegava tudo de ouvido e achava que não precisava, fui dar aula justamente de teoria musical”, destaca.

No projeto o público era bem variado, desde crianças a idosos da cidade, e Cybelle aproveitou para explorar tudo que podia enquanto professora. Chegou a usar músicas de funk para explicar conceitos de ritmos e manter o interesse de todo mundo. “Eu achava que todo mundo ia achar um tédio as minhas aulas e, no fim, ninguém nunca faltava”, diz.

Cybelle Lopes e seus alunos em Amparo (Foto: Arquivo pessoal)

“Foi um ano muito bom, e só não durou mais porque o mandato da prefeitura mudou e o projeto terminou junto”, afirma. Mas a vontade de dar aulas continuou e hoje, aposentada da Orquestra Sinfônica de Campinas e de volta a Piraju, a artista pensa em criar algum projeto parecido com aquele de Amparo. “Queria fazer alguma coisa assim, mais voltada para teoria mesmo, sem muito foco em formar profissionais”, explica.

A ideia não é para agora, mas Cybelle diz que pós-pandemia este é um dos seus planos. Assim como voltar a tocar trompete, mais especificamente aprender o Flugelhorn, que produz um som diferente e que ela gostaria de experimentar. “Talvez até me juntar com um pessoal aqui da cidade, outros músicos, para fazer um som de vez em quando”, conclui.

*Maria Laura López é repórter e bolsista do projeto “Registro da Memória e do Turismo na Estância Turística de Piraju: desenvolvimento das habilidades comunicacionais no ensino fundamental I e II” do Programa USP MUNICÍPIOS

One thought on “Encante-se com a música de Cybelle Lopes

  • 15 de março de 2021 em 21:53
    Permalink

    Uma vez o professor perguntou :
    _O que você quer ser quando crescer?!
    Eu respondi médica , outro amigo bombeiro e minha amiga Cybelle disse música!!
    E assim nos tornamos os profissionais que queríamos ser!!
    Isto é uma grande lição !!
    Na vida temos que escolher a profissão que gostamos para sermos felizes!!!
    🙏🥰👏👍

    Resposta

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *