“É muito triste quando
você vê a questão das
células-tronco reduzida a um STF,
aos cientistas, a nós da universidade,
sem a participação de teólogos,
filósofos, sem acrescentar a ética
na discussão. O valor moral da vida
humana não pode ser definido só pela
ciência ou pela lei.” Elma Zoboli
“Na primeira divisão
celular já está definido
o que você vai ser. Isso não é um
conceito ultrapassado.” Alice Teixeira
Ferreira
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No Brasil, a questão foi parar
na justiça. Isso porque, quando
a Lei de Biossegurança foi aprovada
em março de 2005, o então
procurador-geral da República Cláudio
Fonteles entrou com uma ação
direta de inconstitucionalidade no Supremo
Tribunal Federal (STF), contestando-a.
A lei autoriza, entre outras coisas, a
pesquisa com células-tronco embrionárias
obtidas de embriões humanos produzidos
por fertilização in vitro,
desde que esses embriões sejam inviáveis
ou estejam congelados há mais de
três anos e que haja consentimento
dos genitores.
Fonteles baseou sua ação
no artigo 5º da Constituição
Federal, que garante o direito à vida.
Para ele, a destruição de
embriões viola esse direito. A fim
de promover o esclarecimento geral e fundamentar
melhor sua decisão, que deve ser
tomada em breve, o STF realizou, no dia
20 de abril de 2007, a primeira audiência
pública de sua história,
levantando a seguinte questão: quando
começa a vida? Participaram do debate
cientistas pró e contra o uso de
células tronco embrionárias.
Para Elma Zoboli, professora da Escola
de Enfermagem da USP e 2ª vice-presidente
da Sociedade Brasileira de Bioética,
o evento foi insuficiente para auxiliar
em qualquer decisão. “É muito
triste quando você vê a questão
das células-tronco reduzida a um
STF, aos cientistas, a nós da Universidade,
sem a participação de teólogos,
filósofos, sem acrescentar a ética
na discussão. O valor moral da vida
humana não pode ser definido só pela
ciência ou pela lei.”
Controvérsias
A geneticista Mayana Zatz, pró-reitora
de Pesquisa da USP e diretora do Centro
de Estudos do Genoma Humano, é uma
das defensoras da utilização
de células-tronco embrionárias
para a pesquisa, como já ocorre
em outros países. Segundo ela, o
início da vida não é uma
preocupação da ciência,
porque a vida é um ciclo. “Trabalho
com pacientes que têm doenças
neuromusculares gravíssimas, muitas
delas letais, que matam na juventude e
na infância, ou deixam a pessoa numa
cadeira de rodas. Então, o que eu
mais quero na vida é achar um tratamento
para essas doenças. Se a gente pode
ter a esperança de um tratamento,
eu tenho que abraçar essa causa
com tudo”, defende.
Os chamados embriões inviáveis,
bem como os congelados há mais de
três anos, têm origem no processo
de reprodução assistida,
permitido pela legislação
brasileira. Nesse procedimento, biólogos
coletam os óvulos e espermatozóides
dos genitores e fazem a fecundação in
vitro, ou seja, num tubo de ensaio.
De acordo com a necessidade, para aumentar
as chances de sucesso, costuma-se gerar
uma quantidade de embriões acima
daquela que será de fato implantada.
Por isso, os excedentes são armazenados
nos bancos de embriões.
Mayana afirma que esses embriões
não têm nenhuma perspectiva
de ser implantados e que aqueles que apresentam
alguma má-formação
ou doença genética acabam
sendo descartados: “Eu digo que são
embriões inviáveis porque
eles nunca serão implantados. E, às
vezes, os embriões que são
inviáveis para formar uma pessoa
podem formar um tecido. Esse é um
material para pesquisa fantástico”.
A pesquisadora e professora da Unifesp,
Alice Teixeira Ferreira, discorda: “Esses
embriões são inviáveis
até para a pesquisa, porque estão
em processo de morte”. Ela acredita que
a utilização dos embriões
armazenados – que são sadios e não
estragam com o passar do tempo – para a
obtenção de células-tronco é incorreta
e desnecessária. “Há uma
lista de 70 doenças degenerativas
em que as células-tronco adultas
estão sendo aplicadas. Além
disso, já foi verificado que existe
a possibilidade de as células voltarem
para trás e assumirem características
embrionárias.” |