Em nome da cura


© Francisco Emolo
“É muito triste quando você vê a questão das células-tronco reduzida a um STF, aos cientistas, a nós da universidade, sem a participação de teólogos, filósofos, sem acrescentar a ética na discussão. O valor moral da vida humana não pode ser definido só pela ciência ou pela lei.” Elma Zoboli

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

© Francisco Emolo
“Na primeira divisão celular já está definido o que você vai ser. Isso não é um conceito ultrapassado.” Alice Teixeira Ferreira

 

 

 


No Brasil, a questão foi parar na justiça. Isso porque, quando a Lei de Biossegurança foi aprovada em março de 2005, o então procurador-geral da República Cláudio Fonteles entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade no Supremo Tribunal Federal (STF), contestando-a. A lei autoriza, entre outras coisas, a pesquisa com células-tronco embrionárias obtidas de embriões humanos produzidos por fertilização in vitro, desde que esses embriões sejam inviáveis ou estejam congelados há mais de três anos e que haja consentimento dos genitores.

Fonteles baseou sua ação no artigo 5º da Constituição Federal, que garante o direito à vida. Para ele, a destruição de embriões viola esse direito. A fim de promover o esclarecimento geral e fundamentar melhor sua decisão, que deve ser tomada em breve, o STF realizou, no dia 20 de abril de 2007, a primeira audiência pública de sua história, levantando a seguinte questão: quando começa a vida? Participaram do debate cientistas pró e contra o uso de células tronco embrionárias.

Para Elma Zoboli, professora da Escola de Enfermagem da USP e 2ª vice-presidente da Sociedade Brasileira de Bioética, o evento foi insuficiente para auxiliar em qualquer decisão. “É muito triste quando você vê a questão das células-tronco reduzida a um STF, aos cientistas, a nós da Universidade, sem a participação de teólogos, filósofos, sem acrescentar a ética na discussão. O valor moral da vida humana não pode ser definido só pela ciência ou pela lei.”

Controvérsias

A geneticista Mayana Zatz, pró-reitora de Pesquisa da USP e diretora do Centro de Estudos do Genoma Humano, é uma das defensoras da utilização de células-tronco embrionárias para a pesquisa, como já ocorre em outros países. Segundo ela, o início da vida não é uma preocupação da ciência, porque a vida é um ciclo. “Trabalho com pacientes que têm doenças neuromusculares gravíssimas, muitas delas letais, que matam na juventude e na infância, ou deixam a pessoa numa cadeira de rodas. Então, o que eu mais quero na vida é achar um tratamento para essas doenças. Se a gente pode ter a esperança de um tratamento, eu tenho que abraçar essa causa com tudo”, defende.

Os chamados embriões inviáveis, bem como os congelados há mais de três anos, têm origem no processo de reprodução assistida, permitido pela legislação brasileira. Nesse procedimento, biólogos coletam os óvulos e espermatozóides dos genitores e fazem a fecundação in vitro, ou seja, num tubo de ensaio. De acordo com a necessidade, para aumentar as chances de sucesso, costuma-se gerar uma quantidade de embriões acima daquela que será de fato implantada. Por isso, os excedentes são armazenados nos bancos de embriões.

Mayana afirma que esses embriões não têm nenhuma perspectiva de ser implantados e que aqueles que apresentam alguma má-formação ou doença genética acabam sendo descartados: “Eu digo que são embriões inviáveis porque eles nunca serão implantados. E, às vezes, os embriões que são inviáveis para formar uma pessoa podem formar um tecido. Esse é um material para pesquisa fantástico”.

A pesquisadora e professora da Unifesp, Alice Teixeira Ferreira, discorda: “Esses embriões são inviáveis até para a pesquisa, porque estão em processo de morte”. Ela acredita que a utilização dos embriões armazenados – que são sadios e não estragam com o passar do tempo – para a obtenção de células-tronco é incorreta e desnecessária. “Há uma lista de 70 doenças degenerativas em que as células-tronco adultas estão sendo aplicadas. Além disso, já foi verificado que existe a possibilidade de as células voltarem para trás e assumirem características embrionárias.”

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