Em nome da cura


© Jorge Maruta
Chao Yun Irene Yan ressalta que o processo de regressão da célula-tronco adulta para a embrionária é bastante complicado: “A repressão gênica é muito difícil de estudar, porque é a ausência de alguma coisa. É muito mais difícil entender o conceito de zero do que o de um e dois.”

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

arquivo pessoal
“Você tem que trabalhar com várias possibilidades, para depois ver qual a melhor alternativa.” Lígia da Veiga Pereira

 

 


De fato, artigos publicados pelas revistas científicas Nature e Cell Stem Cell em 7 de junho deste ano revelam que pesquisadores dos EUA e do Japão retiraram células comuns da pele de camundongos e conseguiram reprogramá-las para que elas se comportassem como células-tronco embrionárias.

No entanto, a embriologista e professora da USP Chao Yun Irene Yan ressalta que esse processo de regressão da célula-tronco adulta para a embrionária é bastante complicado. Ela explica que, como as células adultas se encontram num estágio mais avançado, alguns dos seus genes são silenciados, a fim de que outros se manifestem. Por isso, descobrir quais foram os genes reprimidos e retornar ao estágio de indiferenciação inicial não é uma tarefa simples. “A repressão gênica é muito difícil de estudar, porque é a ausência de alguma coisa. É muito mais difícil entender o conceito de zero do que o de um e dois”, esclarece.

Segundo Lígia da Veiga Pereira, professora do Departamento de Genética e Biologia Evolutiva do Instituto de Biociências da USP, o feito dos cientistas americanos e japoneses é uma prova da necessidade das células-tronco embrionárias. “Se eles não tivessem podido usar as embrionárias dos camundongos, não teriam conseguido descobrir como fazer a transformação”, afirma.

Apesar de considerar essa possibilidade de regressão uma boa alternativa à utilização de embriões, Lígia acha que a ciência não deve apostar todas as suas fichas apenas nisso. “Esse trabalho é fantástico, no sentido da plasticidade das células, e resolve o problema da incompatibilidade porque possibilita o uso de células-tronco do próprio indivíduo que vai recebê-las, eliminando o risco de rejeição. Mas você tem que trabalhar com várias possibilidades, para depois ver qual a melhor alternativa.”

Por outro lado, Alice Ferreira afirma que vida humana começa com a fecundação e deve ser respeitada. “Na primeira divisão celular já está definido o que você vai ser. Isso não é um conceito ultrapassado”, atesta. Irene Yan, por sua vez, embora ressalte que a determinação do início da vida não é uma preocupação da ciência, admite que quando acontece a fecundação, forma-se um ser singular: “Do nosso ponto de vista, quando não se implanta um embrião, perde-se um indivíduo único. Aquele embrião você nunca mais vai ter”.

Para a geneticista Mayana Zatz, a pesquisa é uma maneira de evitar que embriões congelados sejam simplesmente descartados, sem destino. “Esses bancos de embriões existem e vão continuar existindo. O que a gente tem que fazer, é respeitar a maioria. A academia de ciências de 66 países apóia essas pesquisas. Se eu sou contra, eu não vou doar meu embrião e não vou fazer a pesquisa. Mas eu não posso impedir que os outros façam.”

Lígia Pereira acredita que os embriões não devem ter o mesmo status e os mesmos direitos de uma pessoa que já nasceu. Por outro lado, ela assevera que eles não são um material trivial ou um simples conglomerado de células e devem ser tratados com respeito. Em sua opinião, uma forma de fazer isso é utilizá-los apenas em pesquisas realmente importantes, que tenham um grupo de cientistas extremamente qualificado.

A estudiosa de bioética, Elma Zoboli, é contrária a essa idéia: “A vida humana tem valor em si. Não se devem estabelecer escalas de valor. Ao destruir um embrião para poder pesquisar, você tem que pensar que está negando uma solidariedade ontológica às pessoas que são da comunidade humana”, justifica.

Aqueles que são estritamente contrários à utilização desses embriões vêem na adoção uma das soluções possíveis. Há, na Itália, na Espanha e nos Estados Unidos, por exemplo, casos em que um embrião foi adotado, implantado, nasceu e hoje está vivo. Mayana, por seu lado, refuta a idéia. “Eu acho uma aberração, num país como o nosso, com tantas crianças abandonadas, você adotar um embrião. De qualquer maneira, existem inúmeros casais que dizem. Eu não quero meu embrião implantado no útero de ninguém, mas permitiriam que eles fossem usados em pesquisas que salvassem vidas, como a gente imagina que vai acontecer no futuro”, argumenta.

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