No tempo móvel do contar, os protagonistas de “Grande sertão: veredas”, “Panamérica” e “Corra Lola, corra” desenham suas histórias em viagens virtuais que rompem com a linearidade do tempo do Cronos, no qual passado, presente e futuro se apresentam como momentos distintos e fatalmente encadeados. Ao fraturar a sequência cronológica, os protagonistas jogam com as múltiplas possibilidades de um tempo inapreensível, cujas reversões e cruzamentos inesperados fazem de suas travessias uma experiência errante do devir. Assim, o diálogo proposto entre obras tão distintas, como o filme de Tom Tykwer e os romances de João Guimarães Rosa e José Agrippino de Paula, tem como viés de leitura a tensão entre o ordenamento do tempo do Cronos e o jogo inacabado do tempo do devir.
Os protagonistas do conto "Partida do audaz navegante", extraído do livro Primeiras estórias de João Guimarães Rosa, do filme Corra Lola, corra, de Tom Tykwer, e do romance PanAmérica, de José Agrippino de Paula, são responsáveis por engendrar narrativas contemporâneas, já que, simultâneas ao ato de contar, constituem-se como narrativas em processo, marcadas pela deriva de um contar sempre inacabado, um contar móvel e de inesperadas conexões. Rompendo com a linearidade do tempo do Cronos, desenham suas errantes narrativas no inapreensível tempo do devir, marca de um tempo contemporâneo, que se constitui como limiar incessante de um "já" e um "ainda não", impossibilitando a fixação de temporalidades pontuais. O contar móvel e improvisado desses protagonistas é, portanto, a chave de leitura que nos permite colocar em diálogo essas obras tão distintas e suas configurações de tempo, espaço e identidade: um tempo do devir, um espaço modelável e de conexões inusitadas e uma identidade mutante.