A obra de Guimarães Rosa é um vasto manancial de onde brotam em jorro questões e imagens belíssimas, é uma fonte que nunca se esgota, e que umedece o mundo de quem a lê. Pesar de passar a página, disse um poetamigo. Leitura densa, perigosa, lenta: leintura. O verter da linguagem rosiana leva-nos por uma corrente de pensamentos, ações, cenários, que passam como um riachinho raso, pelas canelas, pedrinhas ao fundo, no meio do sertão. Cada palavra, lisa ou pontiaguda, massageia um ponto da palma do pé. Você pode atravessar a vau ou seguir o curso daquele jorro, daquele fluir da linguagem que é a obra rosiana.
Este artigo constitui um esboço de um dos temas de minha pesquisa de doutorado sobre a memória e o esquecimento no Grande Sertão: veredas, e aqui pretendo abordar e recolocar algumas relações entre a narrativa e as formas de memória no romance de Rosa, a partir das concepções benjaminianas sobre o tempo, a memória e o narrador, bem como da crítica de Davi Arrigucci-Jr. e os estudos de Maurice Halbwachs sobre a memória coletiva.