O levantamento das viagens, leituras e escritos de João Guimarães Rosa produzidos durante o processo de elaboração de Corpo de baile e Grande Sertão: Veredas constitui o ponto de partida desta tese. Através da análise conjunta dos documentos inéditos - diário, cadernetas de viagem, cadernos de estudos e textos inacabados - e publicações em periódicos que datam do período enfocado, identificando seus principais interlocutores e as relações que estabelecem entre si e com aqueles livros, demonstro que as cadernetas da viagem pelo sertão de Minas (1952) ocupam uma posição chave, porque articulam e atualizam suas reflexões sobre viagem e narrativa, os "povos boieiros" e a matéria épica da tradição oral. Veremos que tanto no processo de escrita das cadernetas quanto nos livros de 56, sobretudo no romance, rosa dialoga com os poemas homéricos (sobre a narrativa oral e o pensamento analógico), com Euclides da Cunha (sobre a cultura boieira e a visão de mundo dos vaqueiros), e com os viajantes naturalistas que descrevem o sertão do Brasil (sobre a viagem como procedimento narrativo e a descrição da natureza). Nesse contexto , proponho uma releitura de Ave, palavra - livro póstumo que reúne escritos de 1947 - 54, e defendo a hipótese de que os livros de 56 e a novela "Meu tio o Iauaretê" foram concebidos no bojo de um mesmo projeto de escrita que explora o pensamento analógico , a ambigüidade e o deslocamento de perspectiva para expressar aquilo que não tem voz nem contornos definidos, como o Sertão, Diadorim, a onça e a criança. Partindo de uma sólida base documental, é através de um intenso trabalho de linguagem que Rosa engendra um sertão pela via da metamorfose.
As tendências contemporâneas dos estudos Literários articulam alguns aspectos dos Estudos Culturais com a chamada Crítica Genética, que trabalha com os arquivos dos escritores. A análise de anotações, desenhos, esquemas, rascunhos busca reconstituir as etapas de escritura do texto, enquanto a pesquisa do cenário cultural revela o contexto da atividade de produção literária. Este ensaio concentra seu foco nos arquivos de Pedro Nava e Guimarães Rosa para distinguir a peculiaridade de seus diferentes processos de construção narrativa.
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