De como o caso de um "Assombrado amor" se esvaece em uma enunciação dissipadora que retarda e obscurece o factual graças a uma complexa rede de imprecisões. De como as ações dos personagens tornam-se imprecisas, prevalecendo o jogo de relance dos nomes como movimentação de signos: de Ricarda Rolandina a Rudimira; de Reis augusto a Revigildo; do Padre Roque ao Padre Peralto. E o nome Cristeléison, personagem cuja mendicância funciona como a "casa vazia", na expressão de Deleuze, promovendo a circulação dos actantes. De como ao leitor resta apenas (e é tudo!) a busca do que se passa nos desvãos do enunciado, cuja desconstrução só permite a ancoragem num significado "excentrado em transparência". E de como o amor é sorvido pelo abismo do "nunca", que tem como metáfora a peça defeituosa do "Retábulo de São Nunca".
Neste texto empreendemos uma interpretação do conto “Retábulo de São Nunca” inserido
no livro póstumo Estas Estórias (1969 [1985]) de João Guimarães Rosa. Pretendemos discutir nesta
leitura crítica a experimentação com a escrita, pois neste conto há traços característicos do gênero
trágico, presença de elementos culto e popular e o diálogo com as narrativas primevas. Para isso, lanço
mão dos estudos de Sergio Vicente Motta, no livro, O engenho da narrativa e sua árvore
genealógica: das origens a Graciliano Ramos e Guimarães Rosa (2006), afiançado nos estudos de
Scholes e Kellogg, afirma que há na nossa literatura sombra da tradição. Para ele, houve
desdobramentos a partir da narrativa matricial designada como ramos e galhos. Neste conto Rosa
discute sobre o casamento, tema comum na literatura desde a antiguidade, mas o autor subverte a
tríade encontro, desencontro e reencontro das narrativas primevas e narra o desencontro amoroso de
um jovem casal que mesmo sentindo forte apelo emocional optam por não se casar depois de terem
visitado uma capela antiga onde fora encontrado um painel de um santo misterioso.
O presente trabalho se propõe a interpretar a estória “Se eu seria personagem”, parte
integrante de Tutameia. Terceiras estórias, último livro organizado e publicado por Guimarães
Rosa. A estória é bastante complexa, tanto do ponto de vista do expediente narrativo adotado
quanto da perspectiva da temática de que lança mão e se empenha em investigar. A interpretação
proposta procura não só extrair as implicações poético-filosóficas da estranha afirmação que
abre a estória (e dá título ao nosso ensaio), como também depreender a trama amorosa que nela
se arquiteta, na qual repercutem lances de várias outras estórias rosianas.
Este trabalho é uma proposta de análise, de um texto ainda pouco conhecido de Guimarães Rosa, o conto “Retábulo de São Nunca” inserido no livro póstumo intitulado Estas Histórias (2013). Nele observaremos o enredo e alguns detalhes de sua estrutura, lançando breves comentários sobre as referências intersemióticas e intertextuais que o texto apresenta particularmente, a saber: as que são feitas a pintura/escultura (políptico e retábulo) e ao teatro respectivamente, que tornam o conto uma obra bastante imagética. Concluídos esses sucintos exames, passaremos então a discutirmos a concepção de amor que o conto traz; para isso, apoiaremos nossas considerações nas de Denis de Rougemont (1988) acerca do amor que considera incompatíveis a paixão e o casamento, temas centrais da narração do conto analisado. A narrativa é um raconto da história de um casal de namorados filhos de ricos fazendeiros, moradores de uma cidade interiorana, que misteriosamente se separa e do casamento anunciado entre a
Atenção! Este site não hospeda os textos integrais dos registros bibliográficos aqui referenciados. Para alguns deles, no entanto, acrescentamos a opção "Visualizar/Download", que remete aos sites oficiais em que eles estão disponibilizados.